O primeiro indicado pelo presidente Jair Bolsonaro para o Supremo Tribunal Federal (STF) foi aprovado com folga pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, nesta quarta-feira (21). Após cerca de dez horas de uma sabatina morna, a indicação do desembargador federal Kassio Nunes Marques foi aprovada por 22 votos a favor e cinco contra.
Agora, a definição sobre a escolha do magistrado fica por conta do plenário do Senado. A tendência é a de que ele receba facilmente os 41 votos que necessita, entre os 81 senadores, e seja confirmado para a mais alta Corte de Justiça do País. A votação deve ocorrer ainda nesta quarta.
A sabatina transcorreu sem grandes embates ou polêmicas. As questões às quais seria submetido já eram amplamente conhecidas pelo desembargador, que dedicou as últimas semanas a percorrer gabinetes e jantares em Brasília para apresentar credenciais.
Entre as respostas que despertaram alguma surpresa, comentários sobre a conduta processual e eleitoral de magistrados. A uma pergunta do senador Renan Calheiros (MDB-AL) repleta de críticas ao "estado policialesco", disse não se opor à quarentena para juízes que pretendem disputar eleições.
"Não vejo nenhuma dificuldade, do ponto de vista jurídico, normativo. Não vejo também nenhuma dificuldade, do ponto de vista social e político, para o estabelecimento de quarentena de magistrado. Infelizmente, a edificação está sendo proposta e debatida em razão de um ou outro magistrado, por ter proferido uma ou outra decisão que viesse a reluzir personalíssimamente e criar um ambiente favorável a que o próprio magistrado venha, amanhã, se candidatar", disse.
Kassio foi além ao colocar que percebe "muita intervenção judicial próxima às eleições". No plenário, restou claro que a menção indireta era ao ex-juiz Sérgio Moro, que pode surgir em 2022 como candidato à presidência da República para rivalizar com seu ex-chefe, Jair Bolsonaro. Em 2018, decisões foram tomadas pelo então juiz da Lava Jato às vésperas do processo eleitoral.
Ao citar a operação, Marques a defendeu, mas ponderou que sempre "correções podem ser feitas".
"As operações vão continuar sempre que houver um fato em que incida uma norma sobre ele, se houver conduta que mereça apreciação. Não obrigatoriamente aquela, uma outra, sobre outra autoridade, sobre outro julgo. A continuidade ou não, não parte da vontade do Judiciário", afirmou.
Há projetos tramitando no Congresso sobre a quarentena para juízes, mas ainda não há clareza se Moro seria ou não afetado a partir da próxima eleição geral.
Ao sinalizar o que pode ser sua atuação processual no STF, Kassio Marques disse não ter por hábito tomar decisões monocráticas - isoladas - porque prefere privilegiar decisões colegiadas.
Logo no discurso inicial, pouco depois das 8 da manhã, Kassio levou ao debate o tema que mais lhe criou constrangimentos desde que teve o nome anunciado por Bolsonaro, o da sua formação acadêmica.
Acusado de turbinar o currículo com uma pós-graduação na Espanha e de cometer plágio na dissertação de mestrado, negou deslizes e normalizou "inconsistências".
Diante de questões para as quais havia grande expectativa sobre as posições pessoais e jurídicas que o acompanharão no STF, recorreu com frequência às "escusas" para evitar opiniões. Alegou risco de descumprimento de normas da magistratura, caso se manifestasse sobre temas que poderá julgar no futuro ou emitisse juízos fora dos processos.
Assim, apegou-se ao recurso para evitar discorrer sobre temas como a prisão após condenação em segunda instância e inquérito das fake news. Em uma antiga entrevista, Kassio Marques havia sinalizado ser favorável à prisão após segunda instância, mas ponderou que cada caso precisa ser analisado individualmente.
"Entendo que essa matéria já está devolvida ao Congresso Nacional, que tem toda competência e instrumentos para ouvir a sociedade e instituições. Pelo que vi, realmente não tenho conhecimento de todos os debates travados, temos projeto de emenda à Constituição tramitando na Casa", disse.
Kassio também evitou ênfase em outros temas que poderiam ser considerados polêmicos, como aborto e direitos de minorias. O senador Eduardo Girão (Pode-CE) entregou a representação de um feto com 11 semanas ao pedir para que o indicado se manifestasse sobre a interrupção de gravidez.
"Entendo que o Poder Judiciário já muito exauriu as hipóteses. Só se eventualmente vier a acontecer algo que hoje é inimaginável, alguma pandemia, algum problema como no caso de anencefalia provocado pelo mosquito da zika, algo nesse sentido que transformasse a sociedade, que provocasse o Congresso e a sociedade para promover modificações", afirmou.
Quando provocado sobre conquistas de homossexuais também foi comedido. O senador Fabiano Contarato (Rede-ES) perguntou como atuará quando se deparar com a judicialização de temas referentes aos direitos da população LGBT. "Esses limites foram atingidos, ou seja, há certa pacificação social no que diz respeito a isso. Agora, compete ao Congresso Nacional", comentou
Católico, o desembargador usou parte do início da sabatina para citar Deus e a Bíblia. Também buscou se dissociar das informações de lobbys que o teriam levado ao presidente da República, em razão de um suposto trânsito com o advogado investigado Frederick Wassef. "Assisti a uma tentativa de adivinhação."
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