Pelo menos quatro municípios do interior do Amazonas já estão sofrendo com a falta de oxigênio nos hospitais, que levou a rede pública de saúde de Manaus ao colapso na última quinta (14).
Em três deles -Manacapuru, Itacoatiara e Iranduba- o estoque de oxigênio nos hospitais é crítico e chegou a ficar zerado por algumas horas, ao longo dos últimos quatro dias, informou o presidente do Conselho de Secretários Municipais de Saúde do Amazonas (Cosems-AM), Fran Martoni.
Só nessas quatro cidades, pelo menos 20 pacientes morreram em decorrência da falta de oxigênio desde a última quinta (14). As prefeituras ainda estão investigando quantas dessas mortes tiveram relação direta com o desabastecimento de oxigênio.
Em Manacapuru, o hospital ficou sem oxigênio no dia 14 de janeiro, batendo o recorde de mortes em um único dia desde o início da pandemia: foram 11 ao todo.
A situação não melhorou desde então e há chance de um novo desabastecimento do insumo nos próximos dias. "Eu tenho oxigênio garantido até a meia noite no máximo", disse o secretário de Saúde de Manacapuru, Rodrigo Balbi, por volta das 18h desta segunda (18).
Ele afirma que, há dez dias, não consegue abastecer o estoque do hospital municipal. "Estamos fazendo manobras com cilindros. A cada meia hora sai um carro daqui com cilindros vazios para encher nas empresas de Manaus", contou o secretário de Manacapuru, que fica a 98 km de capital.
A situação também preocupa em Parintins, segunda cidade mais populosa do Amazonas, que recebe pacientes de outros municípios do baixo rio Amazonas.
Lá, só não faltou oxigênio porque o município possui uma pequena usina e deve colocar uma segunda em operação ainda esta semana, contou Martoni.
Juntos, os quatro municípios têm pouco mais de 365 mil habitantes, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Nos últimos dias, o Ministério Público do Estado do Amazonas ingressou com ações civis públicas contra o governo do estado para garantir o fornecimento ininterrupto de oxigênio a seis municípios do interior: Parintins, Itacoatiara, Manacapuru, Tefé, Nova Olinda do Norte e Autazes.
Em todos os casos foram concedidas liminares favoráveis, mas em Autazes a decisão foi suspensa pelo Tribunal de Justiça do Amazonas, informou a promotora de justiça Karla Cristina Sousa.
"Estamos com atenção concentrada nos municípios que estão enfrentando uma demanda crescente. No interior, [a pandemia] vai avançando em ondas. A qualquer momento eles podem ficar sem oxigênio", alertou a promotora.
Ela ainda disse estar preocupada com a situação de Presidente Figueiredo - uma das cidades mais visitadas pelos manauaras nos finais de semana (parte deles fugindo das restrições em Manaus).
Além desses, Tefé, Nova Olinda do Norte e Autazes também já relataram à Promotoria que estão com estoques baixos de oxigênio, que devem ser suficientes para mais alguns dias. No município de Barcelos, o hospital tem oxigênio garantido para as próximas 48 horas.
Ainda segundo à Promotoria, os estoques também já preocupam os gestores dos municípios de Barcelos, Santa Isabel do Rio Negro e Novo Airão.
O presidente do Cosems-AM, Fran Martoni, disse que pelo menos sete municípios do interior do estado já fretaram aeronaves para buscar oxigênio em outros estados, caso por exemplo de Caapiranga, Barreirinha e Ucurará. "Até municípios menores fizeram isso."
Ele alerta que a falta de oxigênio pode atingir pelo menos 30 dos 61 municípios do interior do Amazonas, caso a demanda continue crescendo no ritmo atual e o estado não consiga regularizar o fornecimento de oxigênio em todo o interior.
Para agravar a situação, os municípios do interior do Amazonas não contam com nenhum leito de UTI - todos os 376 ficam na capital. De acordo com a SES-AM (Secretaria de Saúde do Amazonas), 56 pacientes de cidades do interior aguardam transferência para hospitais de referência para a Covid-19 em Manaus - 28 deles à espera de um leito de UTI.
Uma delas é a aposentada Rosineide Farias, 70, que está há três dias internada no Hospital Jofre Cohen, em Parintins, na fila por transferência para um leito de UTI, conta a filha dela, a cabeleireira Kelle Pestana.
Ao todo, cinco pessoas da família dela tiveram diagnóstico confirmado de Covid-19. A outra filha de Rosineide foi transferida para um leito de UTI em Manaus no último domingo (17). "É angustiante essa espera", desabafou Kelle.
No último domingo (17), a taxa de ocupação dos leitos de UTI para Covid-19 nos hospitais da rede pública de Manaus era de 94%. Já entre os leitos clínicos ela chegou a 105%, ou seja, os hospitais operaram acima da capacidade.
O Amazonas registrou 47 óbitos por Covid-19 nas últimas 24 horas, seis deles no interior. O estado chegou a 230.644 casos e 6.191 óbitos no domingo (17), sendo que 4.072 mortes ocorreram no interior e 2.119 na capital, que concentra pouco mais da metade da população do estado.
A SES-AM informou que, nos últimos dois dias, foram enviados cilindros de oxigênio a mais de 35 municípios do interior, entre eles Tefé, Parintins, Manacapuru e Itacoatiara.
Ainda segundo a SES-AM, o governo do Amazonas está recebendo, em média, 20 mil m³ de oxigênio em quatro voos diários da FAB, além de carregamentos em balsas que partem do Pará com capacidade para transportar de 9 a 25 mil metros cúbicos de oxigênio. A pasta não informou quanto já chegou nas balsas. Além disso, alguns municípios receberão "miniusinas" de oxigênio, mas não há data para começarem a operar.
A pasta também informou que carretas transportando 107 mil metros cúbicos de oxigênio doados pelo governo do estado venezuelano de Bolívar também estavam previstas para chegar a Manaus na noite desta segunda (18). Além da doação venezuelana, o Amazonas recebeu, até domingo (17), 22 mil metros cúbicos de oxigênio doado por empresas e pessoas físicas.
A SES-AM também aponta a transferência de 235 pacientes internados para outros estados como uma estratégia para reduzir a demanda por oxigênio nos hospitais do estado. As transferências começaram na última sexta e, até esta segunda (18) foram realizadas mais 90, segundo a pasta.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta