Pacientes com Covid-19 tiveram maior risco de desenvolver diabetes e doenças cardiovasculares mesmo depois de meses do diagnóstico da infecção, sugere estudo publicado nesta terça-feira (19). Para algumas complicações, o aparecimento foi 11 vezes maior entre pessoas que tiveram Covid em comparação com aquelas que não foram infectadas pelo coronavírus.
A relação da Covid com essas complicações de saúde já tinha sido observada em outras pesquisas. Evidências indicam que o Sars-CoV-2 ocasiona quadros mais graves em quem não tem o diabetes controlado, exemplifica Domingos Malerbi, presidente do departamento de diabetes mellitus da Sbem (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia) e que não participou do estudo.
Na nova pesquisa, que foi publicada na revista Plos Medicine e é assinada por pesquisadores da Inglaterra, dados do país europeu foram utilizados para comparar pacientes com testes com resultado positivo para Covid com outros que não contraíram a doença. Os dois grupos - cada um contava com cerca de 428 mil participantes - foram acompanhados até janeiro deste ano.
O estudo mensurou a incidência das complicações em três fases conforme o diagnóstico de Covid: aguda (até quatro semanas do registro da infecção viral), pós-aguda (de 5 a 12 semanas) e longa (de 13 a 52 semanas). Então, os pesquisadores observaram o aparecimento de diabetes ou doenças cardiovasculares nesses três momentos.
No caso do diabetes, um aumento de 81% da condição na fase aguda da Covid foi registrado em pacientes que tiveram a infecção em comparação àqueles que não contraíram o Sars-CoV-2.
No período da Covid pós-aguda, a maior incidência foi de 27% nos pacientes diagnosticados com a infecção. Já no período mais longo, não foi registrado aumento ao comparar os grupos.
Malerbi diz que existem algumas razões para entender os efeitos do Sars-CoV-2 no aparecimento da diabetes. Uma delas é que o vírus afeta a ilhota pancreática, que é onde se produz a insulina. Esse cenário acarreta o descontrole do nível de glicemia no organismo e pode ocasionar a doença.
Outra explicação é quando o vírus não age diretamente na ilhota, mas causa uma resposta do sistema imunológico que afeta o pâncreas. "Existe toda uma modificação imunológica e isso pode desencadear um processo autoimune que o indivíduo produz anticorpos contra a ilhota. Ele se agride", afirma Malerbi.
Uma terceira hipótese é relacionada aos corticoides, medicamentos usados para controlar processos inflamatórios. Malerbi diz que eles "são um fator que pode desencadear uma doença ou até exacerbar uma condição preexistente". Na Covid, esses remédios são indicados para quadros graves e, por isso, podem estar associados ao aparecimento do diabetes nestes pacientes.
A pesquisa seguiu a mesma metodologia para entender a incidência de complicações cardiovasculares a partir da Covid: monitorar por longo prazo o aparecimento das condições em pacientes com e sem o diagnóstico para a infecção viral.
No final, as complicações foram observadas seis vezes mais nos pacientes que tiveram Covid. Para algumas condições, no entanto, o índice foi até maior. Por exemplo, a embolia pulmonar -onde artérias pulmonares são bloqueadas- foi presente cerca de 11 vezes mais naqueles que testaram positivo para o Sars-CoV-2.
"Nos primeiros casos, a pessoa recebia alta da Covid e depois internava de embolia pulmonar", relembra Maria Cristina Izar, diretora da Socesp (Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo), sobre quadros clínicos que ela observou de Covid e que logo após desenvolveu a complicação cardiovascular.
Izar, que não participou da pesquisa, aponta que uma possível explicação para esse fenômeno é a tempestade de citocina -uma resposta imunológica que procura combater a infecção da Covid, mas acarreta problemas ao organismo.
Um desses danos é nas células endoteliais. Elas produzem substâncias que agem para o pleno funcionamento dos vasos sanguíneos. A tempestade de citocina prejudica essas células, podendo ocasionar problemas como a embolia pulmonar.
As complicações cardiovasculares foram vistas principalmente no período da Covid aguda. Após a quarta semana, os riscos caíam e retornavam ao nível normal na fase da Covid longa -a partir da 12º semana.
Esse resultado é próximo com aquele visto no caso da diabetes. Com isso, os pesquisadores concluíram que, caso não haja fatores de riscos pré-existentes, a Covid não impacta o aparecimento das condições a longo prazo.
As descobertas do estudo fazem com que os autores defendam uma orientação por parte dos médicos para pacientes que tiverem Covid. Ou seja, é importante orientar as pessoas a estarem atentas ao aparecimento de outras complicações em médio prazo.
Malerbi afirma que a vigilância é necessária. Segundo ele, é recomendável fazer exames entre 60 a 90 dias após o fim dos sintomas da Covid, mesmo que tenha sido um quadro leve.
Izar também ressalta que é aconselhável a adoção de alguns hábitos que possam evitar as complicações de saúde após a Covid. Entre elas, as principais seriam uma alimentação saudável, evitar o cigarro e a prática de atividades físicas.
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