Acostumado a um fluxo que pode chegar a 37 mil pessoas em dias de votação, o Congresso teve uma semana totalmente atípica. O novo cenário foi reflexo de uma rotina moldada pela crise do novo coronavírus.
Poucos passos eram ouvidos em corredores praticamente vazios. Raras comissões foram mantidas uma das exceções, na Câmara, foi justamente a que discute ações preventivas contra a pandemia.
Em vez de funcionários e assessores andando às pressas de um anexo para o outro muitos deles foram mandados para casa para fazer teletrabalho , poucos servidores e congressistas caminhavam, tranquilamente, por espaços vazios e silenciosos.
As práticas de higiene foram reforçadas. Funcionários eram vistos aplicando álcool em bancadas, relógios de ponto e quaisquer superfícies que pudessem abrigar o vírus da Covid-19.
Pressionar os dispensadores de álcool em gel espalhados pelo Congresso se tornou hábito comum.
Enquanto isso, novos casos de congressistas com a doença iam sendo confirmados.
Até sexta (20), três senadores haviam sido diagnosticados com o coronavírus, entre eles o presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP). Na Câmara, dois deputados tiveram resultado positivo.
A cada novo caso aumentava a apreensão de quem havia feito o teste, mas tinha a entrega dos resultados protelada por causa da sobrecarga dos laboratórios.
"Nem fale. Nada ainda", respondeu o senador Angelo Coronel (PSD-BA) no início da tarde de domingo (15), quando questionado se o resultado do exame dele e da mulher, esperado para a aquele dia, havia chegado.
"Status atualizado agora. PQP", mandou por mensagem no fim da tarde, quando verificou que seu resultado só sairia dois dias depois.
Mas, logo no início da manhã de terça (17), mandou outra mensagem em tom de alívio. "Graças a Deus acabei de receber o resultado: testei negativo e Eleusa [esposa] também."
Além das medidas de higienização, o Congresso adotou outras ações para minimizar a possibilidade de contágio. Os parlamentares foram instruídos a limitar drasticamente o número de assessores nos gabinetes. Deputados e senadores com mais de 65 anos foram dispensados de atividades presenciais.
O senador Alvaro Dias (Podemos-PR) tem 75 anos e integra o grupo de risco para a doença, mas até o final da semana relutava em fazer o teste.
"O pessoal fica insistindo, minha assessoria, mas eu não estou com sintoma nenhum. Estou tranquilo porque nem mesmo a alergia normal que tenho aqui em Brasília, que me faz espirrar, estou tendo. Nem espirrando estou", disse. "Só estou com um pouco de receio de ir para casa porque tenho lá netinhos pequenos."
Esvaziado também foi o gabinete em que o líder do DEM na Câmara, Efraim Filho (PB), comemorou seu aniversário de 41 anos na quarta-feira (18). Não houve abraços nem sopro na vela sobre o bolo, que dividia a mesa com um pote de álcool em gel.
Naquele mesmo dia, Câmara e Senado aprovaram mais uma característica dos novos tempos, a votação a distância. No Senado, a primeira experiência foi na sexta-feira.
Após a votação do decreto de calamidade pública nacional, houve entrevista coletiva. As perguntas, porém, deveriam ser encaminhadas por WhatsApp, nada de um amontoado de jornalistas ao redor do congressista.
Na Câmara, a distância também virou regra.
A deputada Carmen Zanotto (Cidadania-SC), relatora na comissão criada na Casa para o coronavírus, assumiu papel de fiscal de colegas, jornalistas e demais presentes à reunião do colegiado realizada nesta semana. A principal preocupação era manter em até dois metros o distanciamento entre cada um no local.
Alguns deputados adotaram máscaras, mas, na maioria dos casos, descumprindo recomendações de que apenas doentes e profissionais de saúde usem a proteção.
No entanto, a maioria preferiu se proteger -e proteger os outros- trabalhando de casa. Caso do deputado Fábio Trad (PSD-MS), que será responsável pelo relatório da proposta de emenda à Constituição) da prisão para condenados em segunda instância.
"Eu mesmo me encapsulei", brincou o irmão do senador Nelsinho Trad (PSD-MS), diagnosticado com coronavírus.
Para guardar a quarentena, o deputado federal organizou a biblioteca de sua casa, em Campo Grande (MS), para continuar trabalhando no relatório da PEC.
"Exerço daqui as atividades parlamentes, valendo-me dos recursos tecnológicos disponíveis. Redijo meus discursos, estudo as proposições, participo de videoconferências, atendo os cidadãos por WhatsApp, enfim, não me permito parar."
A nova rotina foi adotada também pela cúpula dos partidos. O líder da maioria na Câmara e relator da comissão mista da reforma tributária, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), começou na segunda-feira (16) a fazer por videoconferência reuniões que inicialmente seriam presenciais.
Dias depois, segundo relatos, o deputado chegou à reunião de líderes carregando uma caixa de máscaras. Por quem passava, ele perguntava: "Está servido?"
Na sala em que foi realizado o encontro, havia pelo menos três funcionários equipados com luvas e máscaras higienizando a mesa em que era servido o almoço aos congressistas.
O presidente da comissão da reforma tributária, senador Roberto Rocha (PSDB-MA), adaptou sua casa e sua rotina. Faz videoconferências e reuniões presenciais com, no máximo, quatro pessoas.
Ele também tem tentado orientar quem o procura. Pelo WhatsApp manda mensagens em que um personagem com sua feição dá dicas de saúde e ensina até a fazer álcool em gel caseiro -o que não é recomendado pelo Conselho Federal de Química.
O líder do PL, Wellington Roberto (PB), se virou como deu. Teve de fazer uma reunião embaixo de árvores no estacionamento da Câmara.
Os convidados com os quais ele iria se encontrar foram barrados na porta da Casa. O deputado também incluiu na sua rotina o uso de máscaras.
Depois que um exame deu resultado positivo para coronavírus em Alcolumbre, o deputado correu para marcar seu teste. Fez o exame na sexta, que deu negativo.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta