Alvo de críticas de parlamentares e procuradores por conta de sua atuação em casos que miram o Palácio do Planalto, o procurador-geral da República, Augusto Aras, disse nesta terça-feira (15) que o presidente Jair Bolsonaro não pode ser tratado de forma "grosseira". No Supremo Tribunal Federal (STF), pelo menos três inquéritos já fecharam o cerco sobre o governo e aliados de Bolsonaro: o das fake news, o dos atos antidemocráticos e a investigação que apura se o chefe do Executivo tentou interferir na Polícia Federal. Para Aras, não cabe ao Ministério Público Federal (MPF) fazer oposição ao governo, nem ser submisso ao presidente.
"Não se trata de fazer oposição ao governo, se trata de cumprir a lei. Não se trata de submissão ao presidente. É preciso uma lembrança: nós não podemos estar tratando o presidente da República - qualquer que seja - de uma forma grosseira, porque a Constituição dá um tratamento peculiar ao presidente", observou Aras. O chefe do MPF destacou que Bolsonaro não pode, por exemplo, ser responsabilizado por atos anteriores ao mandato.
Conforme informou o Estadão no último sábado, o inquérito dos atos antidemocráticos foi deixado de lado pela Procuradoria-Geral da República (PGR). Apesar de ter solicitado ao Supremo a abertura da apuração em abril, no auge das manifestações contra a democracia, a Procuradoria tem aguardado passivamente o trabalho da Polícia Federal, segundo o Estadão apurou com fontes que acompanham o caso.
Investigadores e advogados familiarizados com o processo sigiloso dizem reservadamente até que a PGR "abandonou" o inquérito sobre a organização e o financiamento dos atos que pediam intervenção militar e atacavam o Supremo e o Congresso Nacional. Desde julho, a PGR não solicita providências na investigação, que já fechou o cerco sobre o "gabinete do ódio" e uma série de canais bolsonaristas que chegam a faturar, por mês, mais de R$ 100 mil, conforme revelou o Estadão.
"Os atos processuais mais importantes, como ocorreu na suposta interferência do presidente na PF, como ocorreu inicialmente nesse inquérito 4828 (dos atos antidemocráticos), nesses nós estamos presentes. Podemos escolher quais atos que vamos participar. Não temos condições materiais para participar de 18 mil investigações em curso só contra corrupção", disse Aras, rechaçando as críticas de que teria abandonado o caso.
Bolsonaro não é formalmente investigado no inquérito, o que gerou desgaste interno a Aras dentro da PGR. "Nós não podemos começar uma investigação pelo chefe de poder, chefe de estado, quando Sua Excelência aparentemente compareceu a um ato que outras autoridades compareceram", afirmou, em referência a manifestações antidemocráticas com mensagens a favor de intervenção militar e contra o STF e o Congresso, que também contou com o apoio de parlamentares.
A abertura de investigação criminal com base na Lei de Segurança Nacional foi solicitada pela PGR logo após o Dia do Exército, quando o presidente fez um discurso diante de um público que pedia intervenção militar, em frente ao Quartel General do Exército, em abril. "Acabou a época da patifaria. Agora é o povo no poder. Vocês têm a obrigação de lutar pelo País de vocês", disse Bolsonaro. "Nós não queremos negociar nada. Queremos é ação pelo Brasil", prosseguiu o presidente, aplaudido por centenas de manifestantes.
Para Aras, o "homem público pode estar em determinado ambiente não somente hostil do ponto de vista pessoal mas que o até o coloquem em situação de dificuldade".
Questionado pela reportagem, o procurador concordou que o inquérito teve um "efeito pedagógico", ajudando a baixar a temperatura e a frear os protestos.
"Esse inquérito deu uma certa estabilidade ao País num momento relevante em que havia movimentos extremistas. Esse inquérito tem um relevo especial para estabilidade do Estado brasileiro. Graças a esse inquérito, nós fizemos um procedimento investigativo para compreender qual a dinâmica e qual o propósito de grupos e de pessoas ou mesmo de parlamentares no sentido da crescente atividade extremistas e, como resultado, houve arrefecimento daquela vontade, não é de exercer atos (antidemocráticos)", afirmou Aras.
Aras também rebateu as críticas sobre a sua atuação no inquérito que apura a interferência indevida de Bolsonaro na PF. A pedido do procurador-geral da República, tanto Bolsonaro quanto o ex-ministro da Justiça Sérgio Moro - responsável pelas acusações contra o presidente - são investigados no caso.
"Foi uma solução técnica em que, os dois protagonistas do fato, passaram a ter as suas condutas apuradas. Ou seja, o que vale para um, vale para o outro. Agora, é importante que isso fique claro. Haveria privilégio e discriminação se fosse só ministro Moro, não foi e nem poderia ser. A investigação é para apurar a conduta de ambos, de quem denuncia e de quem é denunciado. Vocês não vão encontrar aqui, nos meus 15 meses de atuação, nenhum ato nosso que importe em privilégio, discriminação e preferência", disse Aras.
O inquérito aguarda uma definição do plenário do Supremo sobre o depoimento de Bolsonaro, o que deve ocorrer apenas no ano que vem.
Ao fazer um balanço de sua gestão, Aras também destacou que, a pedido da PGR, foram abertos 148 novos inquéritos neste ano, que envolvem cerca de 200 autoridades com prerrogativa de foro privilegiado. Um total de 20 acordos de colaboração premiada foram fechados neste ano, com multas acertadas que ultrapassam R$ 4 bilhões. "Façam uma pesquisa, obtivemos mais resultados que as últimas administrações, sem o estrépito da mídia", afirmou.
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