Em seu discurso de despedida do cargo de ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta foi enfático na defesa da ciência, do SUS e de sua equipe.
Demonstrando estar emocionado, o ministro fez uma fala com recados indiretos ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido), por quem foi demitido no fim da tarde desta quinta-feira (16).
"Esse problema [demissão] é insignificante. Nada tem significado que não seja uma defesa da vida, do SUS e da ciência. Fiquem nesses três pilares que deles vocês conquistarão tudo. A ciência é a luz, é o iluminismo. Apostem todas as suas energias através da ciência. Não tenham uma visão única e pensem dentro de uma caixinha", afirmou a servidores da pasta.
Mandetta pontuou ainda que o pior da crise do novo coronavírus está por vir.
"Não pensem que estamos livres de um pico dessa doença. O sistema de saúde ainda não está preparado para uma marcha acelerada."
De acordo com dados do Ministério da Saúde, o número de mortos pela Covid-19 chegou a 1.924 nesta quinta-feira (16) e os casos confirmados ultrapassam 30 mil.
O ministro deixa a pasta com aprovação de 76% da população, de acordo com última pesquisa Datafolha, mais que o dobro do que tem Bolsonaro, 33%.
Para Mandetta, o modo de viver será diferente após o coronavírus e no próximo século.
"O relacionamento será diferente e as videoconferências serão a tônica."
"Muitas verdades que eram absolutas virarão pó", afirma.
Durante o período de desgaste com Bolsonaro, o agora ex-ministro da Saúde se manteve firme na defesa do isolamento social para todos como medida de evitar um colapso do sistema de saúde no país em meio à pandemia.
Em suas palavras finais, ele fez questão de pontuar sua defesa a medidas restritivas adotadas por prefeitos e governadores e criticadas por Bolsonaro.
"Sigam as orientações das pessoas mais próximas que estão em contato com o sistema de saúde, como prefeitos e governadores. O momento é de darmos as mãos e vamos juntos porque vai ser dura a tomada de decisão que vamos ter que tomar nos próximos meses", disse.
O futuro de Mandetta é incerto, mas ele já recebeu convites informais para trabalhar nos governos dos Estados de São Paulo e Goiás e o seu partido, o DEM, disse que espera que ele tenha um papel nacional dentro da legenda.
Ao chegar ao ministério, após ter sua demissão confirmada, Mandetta foi aplaudido por parte da equipe do ministério que esperava sua chegada.
"Sei que deixo a melhor equipe. Trabalhem para o próximo ministro. Ajudem, não meçam esforços."
"Ministros passam, o que fica é o trabalho do servidor do Ministério da Saúde."
Ele concedeu a entrevista ao lado do secretário-executivo, João Gabbardo, do secretário de atenção especializada em saúde, Francisco Figueiredo, do secretário de ciência e tecnologia, Denizar Vianna, de vigilância em saúde, Wanderson Oliveira, e do secretário especial de saúde indígena, Robson da Silva.
Ele lembrou de quando estudava com Denizar Vianna na faculdade.
"Metade [da turma] queria lutar por um hospital aberto e outra por outro hospital. É muito fácil vocês saberem de que lado que eu estava. Fomos do grupo da resistência para manter o Hospital da Piedade aberto. E ele está lá com as portas abertas até hoje", afirma.
Ao cumprimentar membros da equipe que vieram do Congresso, disse que "sem política não se faz a condução de um ministério de tamanha complexidade."
Ele pediu que a imprensa não fizesse perguntas. "É muito difícil falar a responder num momento desses."
Em seguida, disse que continuará lutar no campo da "saúde pública mundial" e fez uma defesa do SUS.
Depois de ficar no cargo por quase uma semana mesmo sabendo de sua demissão dada como certa, Mandetta disse ter tido uma conversa "amistosa" e "agradável" com o presidente, mas ressaltou diferenças.
"É melhor que ele organize uma equipe que pode assumir um outro olhar", disse.
Em um aceno a Bolsonaro, com quem antagonizou no último mês, o ex-ministro disse saber do peso da responsabilidade dele em ter de cuidar também da condução da economia em meio à pandemia.
"Sei do peso da responsabilidade dele, do momento em que a economia deve retomar a normalidade, do impacto na economia. O presidente é humanista, ele pensa nas pessoas nesse momento pós corona e tenho certeza que vai tomar as melhores decisões."
Em tom político e de distanciamento de Bolsonaro, o ministro enfatizou a defesa das vidas dos brasileiros e falou que ninguém pode ser deixado para trás durante a crise e defendeu cuidados dos moradores de rua.
"A gente vê que não pode deixar ninguém para trás mesmo. A vida de uma pessoa na cracolândia tem o mesmo significado de quando ela competir por um leito de CTI do homem mais rico do país."
Mandetta contou ter se reunido com um grupo de parlamentares na véspera, quando sua saída já era tida como certa, e fez menções elogiosas a políticos de oposição como o ex-ministro da Saúde petista Alexandre Padilha e a deputada federal Jandira Feghali (PC do B-RJ).
"A maturidade de entender esse momento foi suprapartidária", afirmou, em crítica implícita a Bolsonaro, que se mantém distante do campo oposicionista.
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