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Em vez de impeachment, oposição quer desgaste de Bolsonaro até 2022

Em vez de impeachment, oposição quer desgaste de Bolsonaro até 2022

O descrédito com o impeachment ganhou mais força com a folgada eleição de Arthur Lira para presidência da Câmara, amparado por um guarda-chuva de emendas e cargos oferecidos pelo governo Bolsonaro

Publicado em 16 de fevereiro de 2021 às 10:16- Atualizado há 4 anos

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Apesar dos tuitaços, panelaços e carreatas, congressistas da oposição admitem nos bastidores que interessa mais a manutenção de "clima de impeachment" e sangria de Jair Bolsonaro (sem partido) até as portas de 2022 do que a efetivação real de um processo para a saída do presidente do cargo. O cálculo se baseia na avaliação principal de que o presidente tem hoje amparo do bloco do centrão para derrotar qualquer pedido. Ou seja, na hipótese de ser deflagrado na Câmara, o impeachment seria derrotado por Bolsonaro, que sairia fortalecido politicamente.

Mesmo em um improvável cenário de sucesso, assumiria o governo o general Hamilton Mourão (PRTB), que, embora seja visto como mais sensato e eficiente em relação a Bolsonaro, está longe de ser do agrado da esquerda. O vice teria um tempo relativamente longo para arregimentar apoio e estrutura, podendo vir a se tornar, inclusive, um real adversário da oposição em 2022.

Presidente Jair Bolsonaro recebe orações de apoiadores em evento no Palácio do Planalto
Presidente Jair Bolsonaro recebe orações de apoiadores em evento no Palácio do Planalto. (Isac Nobrega/PR)

O descrédito com o impeachment ganhou mais força com a folgada eleição de Arthur Lira (PP-AL) para presidência da Câmara, amparado por um guarda-chuva de emendas e cargos oferecidos pelo governo Bolsonaro. Se sob o comando de Rodrigo Maia (DEM-RJ) já havia dificuldade — ele deixou o cargo com mais 60 pedidos de abertura de processo de impeachment sem análise, com o líder do centrão no comando as chances rareariam mais ainda.

"O Maia tinha motivos suficientes para iniciar o processo, mas não havia interesse de integrantes do centrão de dar esse passo", afirma a deputada Talíria Petrone (RJ), líder do PSOL na Câmara. "Agora, a correlação de forças é muito pior do que antes da eleição do Lira. Não vemos com otimismo os 68 pedidos [de impeachment] irem para frente."

Lira recebeu 302 votos e foi eleito em primeiro turno na disputa para o comando da Casa. Ele teve apoio da direita, do centro e até da oposição. Seu principal, adversário, Baleia Rossi (MDB-SP), teve 145.

Jair Bolsonaro publica foto ao lado de seu aliado, Arthur Lira
Jair Bolsonaro publica foto ao lado de seu aliado, Arthur Lira. ( Facebook | Jair Bolsonaro)

ENTENDA

Pela legislação, cabe ao presidente da Câmara decidir, de forma monocrática, se há elementos jurídicos para dar sequência à tramitação do pedido. Nesse caso, o impeachment só é autorizado a ser aberto com aval de pelo menos dois terços dos deputados (342 de 513), depois de votação em comissão especial. Formalmente, a esquerda conta com apenas 130 votos na Câmara.

Nesse contexto, uma ala da esquerda avalia que apresentar pedidos de impeachment com a certeza de que eles não serão aceitos tem um saldo positivo para os opositores de Bolsonaro: a cada nova controvérsia em que o mandatário se envolve, haveria uma nova chance de capitalizar em cima do episódio e "sangrar" o capital político do presidente.

O jogo de cena ajudaria ainda a manter os erros da gestão Bolsonaro em evidência até que a vacinação contra Covid-19 ganhe ritmo no país e possibilite o retorno de manifestações de rua, fundamental para qualquer processo de destituição. Esse é apontado como um dos motivos que resguardam o governo atualmente. Quando a economia está ruim ou há uma situação em que o presidente perde apoio político, o reflexo mais visível da perda de popularidade são os protestos.

Na avaliação de alguns membros da esquerda, uma parcela de insatisfeitos já estaria disposta a sair às ruas. Porém o risco da pandemia impediria uma adesão maior aos atos. Em janeiro, pesquisa Datafolha mostrou que 53% dos entrevistados avaliavam que a Câmara não deveria abrir um processo de impeachment contra Bolsonaro — 42% achavam que deveria.

Essa leitura "pragmática" de desgastar Bolsonaro, embora forte nos bastidores, não é consenso na oposição. Muitos defendem a tentativa constante e imediata de destituir Bolsonaro como uma forma de viabilizar um combate mais efetivo à crise sanitária e uma chance de impedir o avanço de pautas conservadoras defendidas pelos bolsonaristas. "Há aqueles que defendem o impeachment como meramente um discurso político, para esgarçar o presidente até as eleições. Esses estão preocupados exclusivamente com o processo eleitoral", afirma Júlio Delgado (PSB-MG).

"Mesmo não tendo clima nas ruas, acho que o impeachment é necessário porque o Brasil não suporta mais dois anos disso. Falo, em especial, dos aspectos sanitário, ambiental e diplomático", afirma o deputado.

Para Carlos Zarattini (PT-SP), a oposição também não pode arrefecer na defesa do impeachment por temer vitaminar Mourão. "O governo Mourão teria de fazer um acordo político para sobreviver. Ele não tem o mesmo respaldo das urnas que o Bolsonaro tem. Evidentemente que ele não vai levar à frente um programa radical como o Bolsonaro, ele vai ter de se moderar, e isso vai dar uma situação melhor para o Brasil. Cada dia a mais do Bolsonaro no governo é um dia a mais de desgraça para o povo brasileiro", diz.

Talíria tem opinião similar. "É óbvio que a gente entende que não é um cenário satisfatório para a vida do povo brasileiro ter Mourão presidente. Mas quem hoje, por incrível que pareça, tem posições que resguardam a democracia brasileira é o Mourão. Tem uma questão do que cabe em uma democracia e o que não cabe", afirma.

"A divergência cabe numa democracia. Estimular atos autoritários, negacionismo insano, não. Mourão, em alguma medida, tem sido um ponto de equilíbrio nesta chapa", afirma a líder do PSOL.

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