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Entidade gaúcha associa trabalho escravo a programas assistenciais

Entidade gaúcha associa trabalho escravo a programas assistenciais

Centro da Indústria de Bento Gonçalves afirma que população em "condições produtivas" vive inativa sob "sistema assistencialista"

Publicado em 28 de fevereiro de 2023 às 17:46

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SÃO PAULO - Em nota que pretendia "resguardar a idoneidade do setor vinícola", a Câmara da Indústria, Comércio e Serviços de Bento Gonçalves (RS) afirmou que os casos de trabalho escravo no setor estão relacionados à falta de mão de obra. Na mesma nota, a entidade afirma que programas de assistência social tiram pessoas produtivas do mercado de trabalho.

 Alojamento de trabalhadores de colheita de uva era apertado, sem higiene e sem segurança, segundo o Ministério do Trabalho e Emprego
Alojamento onde ficavam os trabalhadores de colheita de uva resgatados em situação análoga à escravidão. (Divulgação)

Na semana passada, dezenas de trabalhadores foram resgatados em uma pousada que servia de alojamento em Bento Gonçalves (RS). Eles vivam em situação análoga à de trabalho escravo. A maioria veio da Bahia, contratada por empresas que prestavam serviços às vinícolas Aurora, Cooperativa Garibaldi e Salton, importantes produtoras da região, que dizem não ter conhecimento da situação.

"Há uma larga parcela da população com plenas condições produtivas e que, mesmo assim, encontra-se inativa, sobrevivendo através de um sistema assistencialista que nada tem de salutar para a sociedade", afirma a Câmara da Indústria.

Publicada pela entidade no sábado (25), a nota viralizou no Twitter nesta terça-feira (28), levando o nome da cidade aos trending topics, a lista de assuntos mais comentados, no Brasil.

A entidade foi procurada nesta terça (28) por telefone e por email, mas não respondeu até a publicação deste texto.

A Câmara da Indústria de Bento Gonçalves diz na publicação que acompanha com atenção o andamento das investigações "acerca de denúncias de práticas análogas à escravidão no município" e que cabe às autoridades competentes cumprir seu papel "fiscalizador e punitivo".

A entidade destaca, no posicionamento, que as vinícolas envolvidas no caso não sabiam da situação e que jamais seriam coniventes com as práticas.

Segundo a Inspeção do Trabalho e o Ministério Público do Trabalho, os trabalhadores resgatados trabalhavam nos parreirais por até 15 horas por dia. No alojamento em que viviam, recebiam choques e ameaças e ficavam sob vigilância armada.

Eles relataram ter chegado à Bento Gonçalves já com uma dívida referente ao transporte e à alimentação. As refeições, segundo disseram aos procuradores e auditores do trabalho, com frequência chegavam já estragadas.

No fim de semana, os trabalhadores começaram a voltar para casa, depois que o MPT negociou um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) emergencial com o dono da empresa que os contratou, garantindo que cada um recebesse R$ 500 em dinheiro. O restante das verbas rescisórias deve ser quitado até esta terça.

Na segunda-feira (27), a Câmara da Indústria de Bento Gonçalves divulgou novo posicionamento sobre o assunto, em nota assinada com outras entidades do setor viticultor, como a Uvibra (União Brasileira de Vitinicultura) e a Fecovinho (Federação das Cooperativas Vinícolas do Rio Grande do Sul), e também Comissão Interestadual da Uva e Conselho Municipal de Turismo.

Na "manifestação coletiva sobre medidas em defesa do trabalho digno e dos nossos valores", o grupo diz que o caso é um "episódio pontual" e que "jamais silenciaríamos nem deixaríamos de adotar medidas concretas para enfrentar o fato ocorrido em nossa região".

Em nove tópicos, as entidades dizem que o "fato ocorrido merece total repúdio de todos que prezam pela dignidade humana" e que a "ocorrência não representa as práticas do setor, as vinícolas, as mais de 20 mil famílias de produtores, o segmento produtivo da cidade e, tampouco, a história da nossa comunidade."

A manifestação coletiva não cita "trabalho escravo" ou "trabalho em condições análogas à escravidão". As entidades dizem ter definido parâmetros para intensificar a fiscalização de fornecedores e prestadores de serviços e que iniciará, em algumas semanas, um programa de comunicação, conscientização e qualificação de toda a cadeia vitivinícola.

"Precisamos, todos, seguir vigilantes e ainda mais ativos no enfrentamento de um problema que, infelizmente, ainda é realidade Brasil afora." A Prefeitura de Bento Gonçalves também assinou o manifesto.

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