BRASÍLIA, DF, E SÃO PAULO, SP - Numa tentativa de diminuir a resistência do setor agropecuário a Luiz Inácio Lula da Silva (PT), lideranças ruralistas que aderiram à campanha do petista vão se reunir com aliados do ex-presidente e debater pontos que podem ser incorporados ao plano de governo da chapa.
O senador licenciado Carlos Fávaro (PSD-MT), o deputado federal e ex-ministro de Dilma Rousseff (PT) Neri Geller (PP-MT) e o empresário Carlos Augustin devem se encontrar nesta sexta-feira (22), em São Paulo, com integrantes da campanha de Lula.
Estarão na mesa o ex-ministro Aloizio Mercadante, coordenador do programa de governo e presidente da Fundação Perseu Abramo, e o ex-governador Geraldo Alckmin (PSB), candidato à vice e designado pela campanha para articular a aproximação com o agro.
As lideranças ruralistas querem propor a Mercadante e a Alckmin, por exemplo, um programa para recuperação de pastos degradados, um mecanismo de incentivo ao chamado crédito verde e redução de juros para plantio e compra de maquinários.
Também está na mesa a articulação política para tentar alcançar um segmento que, até agora, tem mostrado apoio ao presidente Jair Bolsonaro (PL) e resiste a Lula.
Reservadamente, políticos envolvidos nas conversas afirmam que a tentativa principal é a de "neutralizar" o setor, garantindo que os empresários ao menos não façam campanha contra o petista.
"Já estivemos com o Campo Unitário, que agrega todas as entidades da agricultura familiar e camponesa. Agora, faremos com lideranças do agro, avaliando as políticas dos governos do PT e os grandes desafios, especialmente uma agricultura de baixo carbono e preservação dos recursos naturais, o combate à violência no campo e a regulação no uso de defensivos agrícolas", afirma Mercadante.
Ele diz ainda que o partido já "fez acordos importantes" com o setor antes e que "essa parceria pode ser renovada e fortalecida".
Augustin é produtor de soja e algodão e é irmão do economista Arno Augustin, ex-secretário do Tesouro Nacional de Dilma.
Ele afirma que é preciso garantir juros diferentes para cada cultivo, além de oferecer crédito mais barato para produtores que dão preferência aos defensivos biológicos --uma alternativa aos agrotóxicos.
"É uma primeira conversa. Não vamos desenhar o plano de governo em duas horas, mas precisamos pôr de volta as questões ambientais na mesa de negociação. Não privando o agricultor de nada, mas sim incentivando e dando melhores condições de juros e taxas para ele colaborar com essa pauta [ambiental], que é mundial."
O senador licenciado Carlos Fávaro afirma que pretende levar propostas de "investimentos com vocação ambiental". Fávaro foi diretor e presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja-MT), que hoje é dominada por apoiadores de Bolsonaro em todo o país.
"Se tiver um programa de investimento para você melhorar pastos degradados, trazendo fertilidade, calcário, adubo, e produzindo grãos intercalados com pecuária, você coíbe o desmatamento de novas áreas."
"Nós temos 11 milhões de hectares (em Mato Grosso( que são pastagens, que já foram antropizadas e podem ser convertidas em lavoura e pecuária. É muito melhor investir nessas (terras) do que continuar o que está acontecendo na Amazônia."
Em jogo não estão apenas pautas agrárias, mas também a articulação política entre PP e PT.
O apoio de setores do agro de Mato Grosso a Lula foi selado durante a visita do ex-presidente a Brasília, na última semana, quando ele se encontrou com Fávaro e Geller, além de outras figuras da política do estado, como a primeira-dama de Cuiabá, Márcia Pinheiro.
Daí em diante, construiu-se o arranjo para que Geller busque um lugar no Senado e tenha Márcia Pinheiro como suplente --seu marido, o prefeito da capital, Emanuel Pinheiro, é figura presente nas reuniões que debatem o tema no estado.
Fávaro, que está na metade do mandato no Senado, também avalia disputar o governo caso o atual governador Mauro Mendes (União Brasil) confirme a aliança com Bolsonaro.
O acordo entre PP e PT no estado significa que Lula receberá o apoio de Blairo Maggi, um dos maiores produtores de soja do Brasil, cacique político de Mato Grosso (hoje no Progressistas) e ex-ministro da Agricultura do Michel Temer.
O irmão de Maggi, inclusive, já criticou publicamente Bolsonaro, a quem chamou de "ruim de serviço".
A aproximação de Geller com Lula não teve resistência do atual ministro de Bolsonaro, Ciro Nogueira (Casa Civil), um dos líderes do partido junto com Arthur Lira (PP-AL).
Pessoas envolvidas nas conversas dizem que, por enquanto, ainda não se debate a composição de um possível ministério da Agricultura, mas já admitem que o ex-ministro de Dilma é um candidato ao cargo.
A avaliação é a de que políticas implementadas durante o governo da petista foram bem sucedidas, pauta que deve ser usada para tentar atrair o apoio de outros integrantes do setor ruralista, que costuma ter mais afinidade com Bolsonaro.
A estratégia da campanha petista é explorar a ligação de Lula com Blairo Maggi e, em outra frente, usar a relação de Alckmin com o ex-deputado Nilson Leitão, presidente do Instituto Pensar Agropecuária e consultor da CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil).
A investida pró-PT, até o momento, vem sendo considerada tímida por interlocutores dos ruralistas, e membros da bancada lembram que o governo Bolsonaro implementou medidas que ampliaram a avaliação positiva da atual gestão no campo.
O Sindicato Rural de Lucas do Rio Verde, por exemplo, usou um dos bordões de Bolsonaro - "Deus, pátria e família"- para repudiar apoio ao petista.
"Comungando com a opinião dos demais Sindicatos Rurais do Estado de Mato Grosso e sobretudo com a opinião da maioria dos produtores rurais presentes na reunião, o Sindicato Rural de Lucas do Rio Verde vem a público manifestar o descontentamento com o posicionamento político dos parlamentares Carlos Fávaro e Neri Geller", publicou o grupo.
A aproximação de Lula com os ruralistas também vem causando reações de ambientalistas. Na terça, a ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva (Rede Sustentabilidade) afirmou que as alianças criam "amarras com atraso" e mantêm "o país na condição de pária ambiental".
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