A adoção de algumas medidas pode facilitar a relação de crianças autistas com a vacinação contra a Covid-19. Entre elas estão marcar os horários de atendimento previamente, a fim de evitar filas, e aplicar as doses em um ambiente com pouca luz e com sons tranquilos.
As sugestões são de professoras da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), que organizaram um dia de vacinação com espaço adaptado sensorialmente e com ações interdisciplinares para facilitar a relação dos pequenos com a imunização. "Nos unimos para preparar uma rotina de vacinação que seja mais respeitosa com os desafios que as pessoas com autismo têm", diz a professora do departamento de psicologia da UFMG Maria Luísa Nogueira, uma das organizadoras do projeto.
Batizada de Vacina Bem, a ação está marcada para ocorrer nesta quarta-feira (9) em Belo Horizonte - as inscrições para participar se encerraram no último dia 6. Segundo ela, que é coordenadora do Programa de Atenção Interdisciplinar ao Autismo (Praia), uma dica importante para melhorar a experiência dessas crianças é fazer uma preparação prévia adequada.
Dessa forma, é essencial utilizar de métodos lúdicos para explicar a importância da vacinação e o que irá acontecer naquele momento. O uso de materiais visuais é recomendado, pois auxilia na compreensão. Além disso, no dia da vacinação, o ideal é marcar os horários de atendimento previamente. "A espera também é um fator que causa ansiedade para muitos autistas. Alguns conseguem lidar bem com filas e com espera, mas nem todos", afirma a psicóloga.
Antes de as crianças serem vacinadas, técnicas de terapia ocupacional podem auxiliar a reduzir o estresse do momento. Segundo a professora, podem ser utilizados estímulos que acalmam e confortam as crianças, para que elas cheguem na sala de vacinação mais tranquilas. Na própria sala de vacinação é ideal que o ambiente tenha pouca luz e sons tranquilos, pois os autistas são mais sensíveis ao excesso de estímulos, como a iluminação forte e barulhos muito altos.
Para a professora do departamento de enfermagem materno infantil da UFMG Delma Simão, apesar de os postos de saúde terem uma demanda muito grande, algumas dessas ações podem ser aplicadas em larga escala. As salas de espera mais lúdicas podem ser reproduzidas, além do trabalho voltado para o entendimento da importância da vacina. Além disso, é ideal uma capacitação dos profissionais para lidar com crianças com autismo.
"No dia a dia, eles têm treinamento excelente para a vacinação. Porém, o fluxo de atendimentos é muito grande. Muitas vezes, seria necessário um outro profissional capacitado, além do vacinador propriamente dito. Esse apoio precisa ser algo pensado dentro das políticas públicas", diz ela.
A professora Delma orienta que é importante que as famílias, que conhecem mais a criança, conversem com os vacinadores, para que soluções conjuntas sejam pensadas. "Algumas atitudes particulares dos vacinadores são possíveis para estabelecer uma prática mais gentil. Por exemplo, pode dar prioridade no atendimento, vacinar em um local com menor número de pessoas, ou com um vacinador que a criança aceite que se aproxime dela", afirma Delma.
Para o psiquiatra Alexandre Hatem, uma vacinação inadequada dessas crianças pode ser traumática e piorar a relação dela com futuras vacinas ou tratamentos médicos. Estabelecer um espaço diferenciado para esse momento também ajudaria a evitar trauma. Segundo o médico, além da explicação para as crianças, é importante conscientizar as famílias sobre a importância e os benefícios da vacinação. Devido às condições da criança, uma possível internação por Covid poderia ser mais desafiadora.
Hatem explica ainda que a vacinação é essencial para que as crianças possam retornar de maneira mais segura para os atendimentos e terapias que são muito importantes na fase do desenvolvimento infantil.
A ação desenvolvida na UFMG foi inspirada em projetos parecidos realizados por institutos nos Estados Unidos. O projeto reúne equipes das áreas de psicologia, enfermagem, terapia ocupacional e educação física. Segundo a professora Maria Luísa Nogueira, é importante que ações desse tipo sejam reproduzidas e possam alcançar mais pessoas.
"Apesar de parecer uma coisa muito grande, uma estrutura grande, isso pode ser construído no microcosmo de cada município, em algumas unidades de saúde, em postos de referência. O importante é que a vacina chegue ao maior número de famílias que ainda não conseguiram vacinar", diz ela.
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