Conteúdo investigado: Publicação em tom conspiratório afirma que 70 carretas que chegaram ao bairro Mathias Velho, em Canoas (RS), estavam vazias e sairiam de lá escondendo algo. Nos comentários, há insinuações de que os caminhões eram frigoríficos e sairiam do bairro com corpos de vítimas da enchente.
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Conclusão do Comprova: Postagem engana ao insinuar que 70 carretas entrariam no bairro Mathias Velho, em Canoas (RS), vazias. Os veículos realmente estiveram na região no dia 31 de maio, passando pela BR-448, mas para levar material de construção para obra do Dique Mathias Velho, conforme informou a Prefeitura de Canoas. Responsável pela obra, a Eurovia disse que toda movimentação de equipamentos e veículos da empresa no local é relacionada a este serviço contratado pela administração municipal.
O número de mortes divulgado pelo governo do Rio Grande do Sul reforça que as alegações feitas na postagem e nos comentários (de que as carretas transportavam corpos) são enganosas. Até 5 de junho, 31 óbitos haviam sido confirmados no município, um dos mais atingidos pelas chuvas no estado. A quantidade de mortes não justifica operação com dezenas de carretas para transporte de mortos.
Para o Comprova, enganoso é todo conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até 5 de junho de 2024, o post somava 417 mil visualizações, 3 mil curtidas, mil compartilhamentos e 318 comentários.
Fontes que consultamos: Para esta checagem, foram consultadas a Prefeitura de Canoas e a Eurovia, além da Polícia Rodoviária Federal (PRF), do Instituto-Geral de Perícias do Rio Grande do Sul (IGP) e do Governo do Rio Grande do Sul. A autora do post não permite o envio de mensagens no X e, por isso, não foi possível contatá-la.
A empresa responsável pelas 70 carretas que passaram pela BR-448, próximo ao acesso a Mathias Velho, no dia 31 de maio, é a Eurovia, contratada emergencialmente para reconstruir o dique do bairro. As obras de reconstrução deste dique e de outro próximo, o do Rio Branco, eram essenciais para retirar a água acumulada no lado oeste de Canoas, segundo informou, no dia 30, o jornal O Sul.
A primeira obra a ser finalizada foi a do dique Rio Branco, em 29 de maio, que também fica às margens da BR-448. A empresa responsável pelo reparo foi a Sultepa, que assinou um contrato de R$ 1.868.593,91 no dia 20 de maio, como mostra este documento disponível no Portal da Transparência da Prefeitura de Canoas.
Com a Eurovia, o município assinou outro contrato emergencial, no mesmo dia, no valor de R$ 7.761.903,03, especificamente para a reconstrução do Dique Mathias Velho. Segundo a prefeitura, as 70 carretas que passaram pela BR-448 no dia 31 levavam material para esta obra, já que a do Dique Rio Branco já estava concluída naquele momento.
Em nota, a Eurovia confirmou a informação. “O objeto de nosso contrato se refere exclusivamente à prestação de serviços para a reconstituição provisória do Dique do Pôlder Mathias Velho. Logo, toda a movimentação de caminhões e equipamentos de nossa empresa, na localidade de Canoas, é decorrente dos aludidos serviços”, diz.
A PRF foi procurada, mas disse não ter informações sobre o bloqueio no acesso ao bairro Mathias Velho para a chegada dos caminhões. Segundo a Prefeitura de Canoas, a operação foi acompanhada pela Guarda Municipal.
A insinuação de que os 70 caminhões estariam vazios porque transportariam corpos de vítimas da enchente também não se sustenta. No dia 31 de maio, quando os caminhões chegaram ao bairro Mathias Velho, o número de óbitos pela chuva no Rio Grande do Sul era de 169, mesmo número do início da semana, no dia 27. Ou seja, não houve variação no número de óbitos que justificasse uma grande operação para remoção de corpos.
O número e o nome dos mortos são divulgados diariamente pelo governo, separando os casos por cidade, como uma forma de transparência. Os dados podem ser acessados por qualquer pessoa.
Das 169 vítimas no Estado em 31 de maio, 24 eram de Canoas, e a cidade ainda tinha oito desaparecidos – o que também não justificaria 70 veículos, mesmo que fossem apropriados para o serviço, para remover as vítimas.
Além disso, corpos não são transportados em caminhões ou carretas, segundo informou ao Comprova o Instituto Geral de Perícias do Rio Grande do Sul, ligado à Secretaria da Segurança Pública do Estado. O órgão explicou que os caminhões na BR-448 não pertenciam ao IGP e que “em nenhum momento houve transporte de vítimas em caminhões pelo instituto”.
Em nota, o governo do Rio Grande do Sul informou que contabilizou o maior número de pessoas desabrigadas no dia 13 de maio, totalizando 21.294 em Canoas. O dado de desalojados, que são as pessoas que tiveram que sair de casa, mas não foram para abrigos, não entra nesta contagem. O Observatório Social da Secretaria de Desenvolvimento Social é responsável pelo levantamento diário da situação dos abrigos no Estado. Ainda segundo o governo, até as 9h do dia 5 de junho a confirmação era de 31 mortes no município.
O portal do governo do Rio Grande do Sul também já publicou matéria negando que exista 2 mil corpos congelados e armazenados em frigoríficos.
Por que o Comprova investigou essa publicação: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.
Outras checagens sobre o tema: O Comprova já desmentiu outros conteúdos sobre as chuvas no Rio Grande do Sul. Mostrou que governos atuam no resgate de vítimas desde o dia 30 de abril, diferentemente do que diz vídeo; que um deputado omitiu que o número de mortes citado pelo ministro Paulo Pimenta foi corrigido; e que um homem minimizou o volume de chuvas para alegar falsamente que abertura de comportas de barragens foram responsáveis por alagamentos.
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