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Exame sorológico não prova que vacinas deixam de proteger

Exame sorológico não prova que vacinas deixam de proteger

É enganoso vídeo no qual um médico afirma que o diagnóstico negativo de um exame sorológico que fez provaria que a Coronavac não gera imunidade contra a Covid-19. Especialistas ouvidos pelo Comprova explicam que o exame não é capaz de medir o nível de proteção garantida por vacinas

Publicado em 23 de julho de 2021 às 13:30

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Passando a Limpo: Exame sorológico não prova que vacinas deixam de proteger
O exame sorológico mede apenas a quantidade de anticorpos neutralizantes, que representam só parte do sistema imunológico humano. (Reprodução/Comprova)

Conteúdo verificado: Em um vídeo publicado nas redes sociais, o médico Delano Santiago Pacheco diz que foi imunizado com duas doses da Coronavac. Porém, ao fazer dois testes sorológicos não teria apresentado anticorpos neutralizantes suficientes contra o Sars-CoV-2. Ele conclui que a vacina não serviu para ele.

Médico engana ao associar o resultado de um teste de anticorpos neutralizantes à eficácia da vacina Coronavac. Os anticorpos só são uma das defesas ativadas após uma imunização e também não se sabe qual a quantidade necessária deles para garantir uma proteção.

Tanto a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) quanto a Sociedade Brasileira de Imunização (SBIm) não aconselham a realização desse tipo de exame após a vacinação por esses dois motivos.

Conforme explicado pela imunologista do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB-USP), Anna Castelo Branco, esse tipo de teste só serve para saber se a pessoa teve contato com o vírus, o que não assegura que ela tenha ou não imunidade contra a doença.

O vídeo foi removido das redes sociais dele, mas circula em outros perfis, como o da ex-deputada federal pelo PTB do Rio de Janeiro Cristiane Brasil. Em outra publicação, do mesmo médico, ele admite que os anticorpos não são a única forma de defesa contra o vírus produzida após a vacinação.

COMO VERIFICAMOS?

O primeiro passo feito pelo Comprova foi procurar saber quem era o médico que falava no vídeo. Com isso, fomos tentar entender que teste ele tinha feito, o que esse exame mede e se ele serve para apontar a eficácia de uma vacina. Para isso, além das notas técnicas divulgadas pela Anvisa e pela SBIm, consultamos a imunologista do ICB-USP Anna Castelo Branco.

Também tentamos entrar em contato com Delano, responsável pelo vídeo, pelo e-mail disponível no site da Câmara Municipal de Divinópolis (MG), onde ele é suplente, e pelo número de WhastApp divulgado em sua página do Facebook, mas até o fechamento dessa checagem, não obtivemos retorno. Além disso, tentamos falar com a ex-deputada federal pelo PTB do Rio de Janeiro Cristiane Brasil pelo Facebook.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 22 de julho de 2021.

VERIFICAÇÃO

Testes sorológicos não são capazes de medir eficácia de uma vacina

Existem dois tipos de testes sorológicos para a covid-19 disponíveis no mercado. Esses exames servem para medir se a pessoa tem anticorpos contra o vírus. O mais simples deles mede se a pessoa tem anticorpos de memória, o IgG – nesse caso só se sabe se a pessoa teve contato com o vírus. O segundo tipo de teste é um pouco mais detalhista. Ele mede se a pessoa tem os chamados anticorpos neutralizantes, que servem para impedir a entrada do vírus na célula. Não fica claro no vídeo exatamente qual o teste que o médico fez, mas ao que parece ele fez um exame de anticorpos neutralizantes.

O problema desse exame é que ainda não há estudos que demonstrem qual a quantidade de anticorpos neutralizantes necessária para impedir uma infecção. De acordo com explicação do site do Laboratório Exame, a única indicação do teste é para quem deseja saber se já teve contato com o vírus da covid-19.

Segundo a imunologista Anna Castelo Branco, nenhum teste sorológico disponível no mercado tem a capacidade de medir a eficácia de uma vacina. “Ainda não foi estabelecida qual é exatamente a necessidade de anticorpos que são necessários para bloquear a entrada do vírus na célula”, destaca Anna.

Além disso, ela lembra que os anticorpos neutralizantes são só uma das defesas ativadas pela vacina. Para as outras não há testes capazes de fazer a medição. “O segundo ponto é que o sistema imunológico é treinado em várias frentes diferentes, como se fosse um exército composto por vários batalhões. O anticorpo é só um desses batalhões, mas a gente tem a imunidade inata, que é primeira linha de defesa, e a adaptativa”, ressalta.

O próprio médico, autor do vídeo, fez essa explicação em outra postagem após a repercussão da primeira. No novo vídeo, ele adota um tom diferente e, apesar de não desmentir o primeiro, diz que o teste sozinho não é capaz de determinar que uma pessoa não está imune. Ele afirma que, além dos anticorpos, existem outras defesas que são ativadas com a vacina, mas que não há como medi-las.

Anna Castelo Branco explica que o médico usa conceitos corretos, mas ele erra ao dizer que a vacina não foi capaz de protegê-lo, já que a defesa não é feita somente pelos anticorpos. “Ele é muito enfático em dizer que não está protegido e isso não é verdade. Ele pega uma única informação e tira uma conclusão clínica. Esse dado isolado de uma única pessoa não representa nada quando a gente fala de eficácia de uma vacina. O que é mais real são os ensaios clínicos que são feitos em várias pessoas. E a Coronavac tem alta efetividade, principalmente no que é prioridade, que são os casos graves e mortes”, destaca.

Uma análise da resposta imunológica provocada pelas diferentes vacinas em uso, publicada na revista científica Nature em julho, apontou que as respostas apresentadas têm sido diferentes e que ainda não há como saber qual dessas defesas é mais eficaz contra a covid-19. Os autores concluem que estudos futuros devem ser feitos analisando as pessoas que se infectaram mesmo estando vacinadas. “Análises abrangentes e cuidadosas de todos os dados imunológicos, comparando as respostas pós-vacina iniciais em indivíduos que foram infectados após a vacinação com aqueles que não foram, acabarão por fornecer uma resposta.”

Com a repercussão do vídeo, a Secretaria de Saúde de Divinópolis (Semusa) emitiu uma nota pública em que contesta a fala do médico. Na publicação, o órgão apresenta orientações da Anvisa e da SBIm que desaconselham o uso de testes sorológicos após a vacinação.

Segundo a SBIm, em nota técnica de março deste ano, testes sorológicos não são recomendados após a vacinação por não terem a capacidade de medir de forma correta se a pessoa está imunizada. “A complexidade da imunidade pós-vacinal ou mesmo após doença natural, no entanto, não corrobora a realização dos testes, pois os resultados não traduzem a situação individual de proteção”, afirma.

A instituição lembra ainda a fragilidade do método, já que a imunização não é formada apenas por anticorpos. “A complexidade que envolve a proteção contra a doença torna desaconselhável a dosagem de anticorpos neutralizantes com o intuito de se estabelecer um correlato de proteção clínica, pois certamente não se avalia a proteção desenvolvida após vacinação apenas por testes laboratoriais ‘in vitro’ através da dosagem de anticorpos neutralizantes”, destaca.

Em nota técnica, a Anvisa também se manifestou contra a realização dos exames. A agência destaca que, para que esses testes pudessem ser de alguma forma utilizados, seria indispensável saber a quantidade de anticorpos que são necessários para neutralizar o vírus. “Assegurar a proteção ao vírus, seja pela imunidade adquirida após uma infecção ou desenvolvida após a vacinação, requer estudos que verifiquem a quantidade de anticorpos necessária para a efetividade da proteção. A avaliação por quanto tempo estes anticorpos ficam viáveis no organismo e que seja verificado também a sua funcionalidade, isto é, a sua capacidade de neutralização. As informações quanto à proteção ao Sars-CoV-2 ainda não foram estabelecidas pela ciência”, diz. “Independentemente do resultado de um ensaio sorológico, devem ser seguidas as orientações e cuidados quanto ao distanciamento social, uso de máscaras e higienização das mãos”, completa.

O mesmo entendimento foi destacado pelo Instituto Butantan, fabricante da Coronavac no Brasil. “Testes sorológicos não servem para avaliar se alguém está protegido ou não contra a covid-19. Os testes de anticorpos detectam a presença de anticorpos em determinado momento, sendo úteis apenas para identificar pessoas que foram expostas ao vírus, não para garantir se alguém está protegido ou não contra a doença. Mesmo a Anvisa recomenda não utilizar estes testes para avaliar a proteção”, explicou em post no Instagram.

O que se sabe sobre a eficácia da Coronavac

A Coronavac foi aprovada para uso emergencial no Brasil pela Anvisa em janeiro de 2021 e pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em junho. A vacina teve uma eficácia global de 50,38% na fase três dos testes clínicos no Brasil.

Além dos testes clínicos, um estudo feito pelo Instituto Butantan na cidade de Serrana, no interior de São Paulo, vacinou cerca de 75% da população adulta e constatou queda de 80% nos casos sintomáticos de covid e de 86% nas internações, além da redução de mortes em 95%.

Outra pesquisa, feita no Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo, apontou queda de 80% nos casos de covid-19 entre os 22 mil funcionários vacinados com a Coronavac.

Quem é Delano Santiago Pacheco?

O médico se formou em medicina pela Unigranrio, no Rio de Janeiro, e é pós-graduado em dermatologia pelo Centro de Medicina Especializada, Pesquisa e Ensino (Cemepe). Ele foi eleito vereador de Divinópolis em 2012, pelo PRTB, e reeleito em 2016, pelo MDB. Também foi candidato em 2020, mas ficou como suplente. Delano é clínico geral e dermatologista. Ele atende em uma clínica própria em Divinópolis e no Hospital Bom Pastor.

POR QUE INVESTIGAMOS?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre a pandemia e sobre políticas públicas do governo federal. Em julho de 2021, os participantes decidiram também iniciar a verificação da desinformação envolvendo possíveis candidatos à presidência da República. Desde então, o projeto tem monitorado nomes que vêm sendo incluídos em pesquisas dos principais institutos.

Conteúdos sobre vacinas ou tratamentos contra a covid-19 são ainda mais necessários, já que podem induzir a população a recusar medidas de prevenção, como as vacinas, e se expor a riscos durante a pandemia. O conteúdo verificado aqui teve 8,2 mil visualizações e mil interações no Facebook. Já no Twitter, foram mais de 3,1 mil visualizações e 300 curtidas.

O Comprova já mostrou que o diagnóstico positivo de Doria não indica ineficácia da Coronavac, que a infecção de Rodrigo Faro não prova ineficácia da vacina contra a covid-19, que as vacinas usadas no Brasil passaram por testes de segurança e eficácia; que são enganosas as postagens afirmando que quem tomou CoronaVac se protegeu pela metade; que um imunizante não precisa ser estudado por dez anos para ser seguro; e que a OMS não recomendou a aplicação de uma terceira dose da CoronaVac.

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Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; ou ainda aquele que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

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