Conteúdo investigado: Vídeo de três minutos alegando que integrantes do Exército brasileiro, alertados por hackers russos, teriam entrado na sala de totalização dos votos no TSE, durante a apuração do primeiro turno das eleições, no domingo (2), e impedido uma suposta fraude. O esquema envolveria descontar gradativamente um ponto percentual dos votos conferidos ao presidente Jair Bolsonaro (PL) e acrescentar meio ponto para o ex-presidente Lula (PT), a partir do momento em que 12% das urnas já tivessem sido apuradas.
Onde foi publicado: TikTok e Instagram.
Conclusão do Comprova: É falso que integrantes do Exército, alertados por hackers russos, teriam entrado na sala de totalização dos votos no TSE, durante a apuração do primeiro turno das eleições e impedido uma suposta fraude. O conteúdo foi fabricado, ou seja, não se baseia em nenhuma evidência.
A assessoria de imprensa do tribunal desmentiu a peça de desinformação ao garantir que o Exército não esteve na sede do tribunal no dia do primeiro turno. O Ministério da Defesa, órgão ao qual estão vinculadas as Forças Armadas, e a Embaixada da Rússia no Brasil também negaram a história aqui verificada. A plataforma TikTok retirou o vídeo do ar por conter “desinformação danosa”.
A chamada “sala secreta”, onde ocorre a totalização dos votos, na verdade, não é a mesma onde servidores do TSE monitoram a contagem, tendo, inclusive, a participação de entidades fiscalizadoras. O processo de totalização ocorre automaticamente, sem interferência de nenhum dos presentes, por um supercomputador.
Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.
Alcance da publicação: Até o final desta terça-feira (4), a publicação no TikTok contava com 227,1 mil curtidas, 10,3 mil comentários e 144 mil compartilhamentos. O vídeo passou a ficar indisponível entre a noite de terça e o início da tarde desta quarta-feira (5).
O que diz o autor da publicação: Conseguimos contactar o autor da publicação, Sérgio Tavares, pelo Whatsapp. Ele confirmou a autoria da publicação e disse que sua fonte é “fidedigna”, e nos informou que lhe pediria permissão para revelá-la; depois, optou por “não prestar mais detalhes”.
Como verificamos: Buscamos no Google por artigos que contivessem, ao mesmo tempo, as expressões-chave “fraude”, “primeiro turno”, “hackers russos” e “forças armadas”, ou “exército” ou “militares”. Também fizemos uma pesquisa à parte por “sala secreta” e “TSE” para apurar especificamente sobre o local onde os votos são totalizados, na sede do tribunal. Obtivemos, como resposta, um artigo da agência de checagem de fatos Boatos.org desmentindo a peça de desinformação, assim como matérias de veículos de imprensa, como CNN Brasil e UOL, usados nesta verificação.
Ainda consultamos, na internet, sobre a apuração realizada no dia da eleição para averiguar a dinâmica da contagem de votos. A pesquisa retornou reportagens do G1 e do Valor que, entre outras informações, indicavam o motivo para a mudança de posição dos candidatos durante a apuração, conforme o avanço da contagem em diferentes regiões do país.
Entramos em contato com o TSE, o Ministério da Defesa, o Exército e a Embaixada da Rússia no Brasil, as partes citadas pelo conteúdo, e com o TikTok, rede social onde o conteúdo verificado foi publicado.
Os órgãos citados no vídeo negam a história alegada. Em nota enviada ao Comprova, a assessoria de imprensa do TSE desmentiu a peça de desinformação e assegurou que o Exército não esteve na sede do tribunal em 2 de outubro, dia do primeiro turno.
O Exército informou que o pedido deveria ser direcionado ao Ministério da Defesa. Em contato com o Comprova, por telefone, a assessoria do Ministério da Defesa afirmou que o conteúdo é falso. A Embaixada da Rússia no Brasil disse, apenas, que “não comenta informações fictícias e falsificações (fakes)”.
A apuração dos votos no domingo, 2 de outubro, foi transmitida em tempo real por diversos veículos, na televisão e internet, e os primeiros dados divulgados apontavam para uma vantagem de Lula, logo superada por Bolsonaro. O presidente ficou à frente da apuração por mais de duas horas, enquanto a contagem dos votos avançava nas regiões Sul e Centro-Oeste, onde Bolsonaro tem a preferência do eleitorado.
À medida que a contagem avançava em outros pontos do país, a diferença de Lula para Bolsonaro foi diminuindo até que, por volta de 20 horas, com 70% das urnas apuradas, o ex-presidente virou e não deixou mais a liderança até a conclusão da apuração. O mapa de votação demonstra, portanto, que as variações nos índices dos candidatos têm relação com as regiões em que se concentraram a apuração dos votos, e não com a suposta fraude falsamente alegada no vídeo aqui investigado.
O conteúdo também alega que existe uma “sala secreta”, onde ocorreria a totalização dos votos, dentro da sede do TSE, em Brasília. A expressão, que sugere falta de transparência no processo eleitoral, é comumente usada entre aqueles que atacam a credibilidade da Justiça Eleitoral, dentre eles o próprio presidente da República, Jair Bolsonaro (PL). Entretanto, é incorreto afirmar que a existência ou a localidade dessa sala não seja oficialmente revelada.
O que existe são duas “salas-cofres” no TSE. Em uma, há um supercomputador que totaliza os votos das eleições automaticamente – ou seja, sem interferência de nenhuma pessoa presente – e a partir dos dados coletados nas próprias urnas eletrônicas e impressos nos boletins de urna. Na outra, fica o código-fonte das urnas, que é a linguagem de programação do software delas, após ser lacrado.
Ambas as salas têm acesso restrito, sendo monitoradas 24 horas e protegidas por cinco portas codificadas, como reportou a CNN Brasil. A existência e a localidade delas são de conhecimento público: elas ficam nas dependências da Secretaria de Tecnologia da Informação do TSE, na sede do tribunal, em Brasília.
A equipe de servidores do TSE que acompanha a totalização dos votos, composta por técnicos da própria Justiça Eleitoral, não fica em nenhuma dessas salas. Eles trabalham em um espaço que é aberto, até mesmo no dia da eleição, a agentes fiscalizadores, como o Ministério Público e representantes dos partidos políticos.
Em visita no dia 28 de setembro guiada pelo presidente do tribunal, ministro Alexandre de Moraes, e acompanhada pela imprensa, o próprio Valdemar Costa Neto, que preside o PL, sigla de Bolsonaro, disse que a sala “é aberta”.
O TikTok tornou o vídeo indisponível entre terça e quarta-feira (5). O Comprova não conseguiu determinar o momento exato da suspensão. Procurada, a assessoria de imprensa do TikTok no Brasil informou que a plataforma de vídeos “trabalha com uma combinação de tecnologia e de pessoas para identificar e remover conteúdos que violam nossas Diretrizes da Comunidade”. Sobre o conteúdo verificado, o TikTok disse que o vídeo “foi removido por desinformação danosa”.
Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizaram nas redes sociais sobre a pandemia de covid-19, políticas públicas do governo federal e eleições presidenciais. O vídeo aqui investigado cita os dois presidenciáveis que estão na disputa do segundo turno, tentando induzir as pessoas a acreditar em uma suposta fraude para favorecer um candidato em detrimento de outro. A desinformação, como a deste vídeo, tenta tirar a credibilidade do processo eleitoral, o que é uma afronta à democracia porque retira o direito das pessoas de fazerem as suas escolhas baseadas em conteúdos verdadeiros.
Outras checagens sobre o tema: O Fato ou Fake, do G1, e a agência de checagem Boatos.org também desmentiram o conteúdo aqui verificado. O período de campanha para o segundo turno das eleições já começou com desinformação. O Comprova mostrou, por exemplo, que é mentira que Barreiras, na Bahia, registrou número de votos em Lula superior à população da cidade e que é falso que boletim de urna encontrado em Curitiba não tenha sido computado no resultado da eleição.
No fim de semana da votação, também circularam muitas peças de desinformação. O Comprova revelou ser falso que Ciro Gomes declarou apoio a Bolsonaro, que site noticiou aumento do patrocínio de Neymar após o jogador manifestar apoio ao presidente e, ainda, que eleitores de Lula teriam dia diferente para votação.
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