Fios de cabelo encontrados nos dentes dos fósseis dos dois leões Tsavo passaram por análises genômicas que revelaram novas informações sobre os hábitos dois animais. Tal metodologia, que envolveu diferentes técnicas para analisar amostras tão frágeis e antigas, pode ajudar no entendimento da relação cultivada entre essa espécie e os humanos.
Os dois leões Tsavo também ficaram conhecidos popularmente como "comedores de homens" por terem sido responsáveis por ataques e mortes em meados dos anos 1890 no Quênia. Os autores do novo estudo, publicado nesta sexta (11) na revista científica Current Biology, identificaram cabelos nos fósseis preservados dos animais e realizaram testes genéticos nessas amostras, área de estudo chamada paleogenética.
Um marco nesse tipo de investigação foi em 2010, quando o genoma completo de um indivíduo que viveu na Groenlândia há 4.000 anos foi sequenciado, explica Ripan Malhi, um dos autores do artigo e professor do Instituto Carl R. Woese de Biologia Genômica e do Departamento de Antropologia, ambos da Universidade de Illinois.
No entanto, pesquisas de paleogenética não são fáceis. "Análises de DNAs antigos apresentam desafios porque as amostras, neste caso, fragmentos muito pequenos de cabelo, normalmente contêm apenas vestígios de DNA, frequentemente degradados ou fragmentados. Essa escassez dificulta a extração de material genético", afirma Alida de Flamingh, pesquisadora de pós-doutorado também do Instituto Carl R. Woese e outra autora do artigo.
Os cientistas adotaram algumas estratégias para contornar essas barreiras. Técnicas mais recentes de sequenciamento foram integradas no estudo, o que permitiu extrair mais moléculas da amostra dos cabelos. Além disso, o time de pesquisadores se concentrou no DNA mitocondrial. Encontrado especialmente nas mitocôndrias, esse DNA é mais abundante em fios de cabelo e unicamente herdado do lado materno.
As análises do DNA feitas no estudo também foram comparadas com um banco que contêm dados de sequências genéticas de diferentes seres vivos, como o GenBank. Ao fim, os pesquisadores inferiram que os leões Tsavo eram irmãos e que aqueles fios eram de girafas, zebras e humanos, indicando atividade predadora dos animais em relação a essas espécies.
Entre as amostras analisadas, pelos de outros leões também foram identificados, o que levantou a suspeita de atividade canibal. No entanto, a pesquisa observou que esses cabelos apresentavam a mesma sequência do DNA mitocondrial dos leões Tsavo, ou seja, isso indica que os fios encontrados no dente de um dos animais ou era dele mesmo ou do outro leão Tsavo. Nesse caso, é mais provável que o cabelo foi parar na boca do leão por atividade de limpeza, não por canibalismo.
As descobertas, e especialmente o avanço que a metodologia proporcionou para análise genômica de amostras frágeis como cabelos antigos, são motivações para a realização de novas pesquisas na área. Flamingh afirma que existe o interesse de analisar amostras de cabelo em outras camadas de dentes de fósseis. Ela traça um paralelo com o solo.
"As camadas mais profundas representam tempos históricos e as camadas na superfície são da deposição atual do solo. Da mesma forma, as camadas mais baixas da cavidade dentária representam presas comidas no início da vida e as camadas no topo da cavidade são de presas comidas recentemente", exemplifica.
Estudos como esses podem ajudar a entender melhor o comportamento alimentar dos leões e como isso impacta a vida humana. Por exemplo, é possível que, por meio da análise temporal das atividades de caças dos leões, seja identificado que eles passam a se alimentar de humanos somente depois de atacarem animais domésticos.
Em casos assim, "podemos desenvolver estratégias e recomendações para reduzir esses riscos", conclui Flamingh.
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