Investigação sobre ataques de 8 de janeiro avança, mas poupa militares
Um mês após atos golpistas em Brasília, vândalos, PMs e políticos são investigados, porém integrantes das Forças Armadas não foram alvos da PF, PGR e AGU
BRASÍLIA, DF - Um mês após os ataques golpistas às sedes dos três Poderes, os órgãos de investigação civis avançaram sobre parte dos vândalos envolvidos nas depredações, políticos apontados como omissos e membros da Polícia Militar do Distrito Federal, mas nada até o momento respingou em integrantes das Forças Armadas.
Desde 8 de janeiro, ao menos 1.420 pessoas foram presas em flagrante ou durante operações deflagradas pela Polícia Federal.
Bolsonaristas invadem sedes dos Três Poderes em Brasília . (Marcelo Camargo/Agência Brasil)
A ausência de militares entre os alvos de denúncias realizadas pelo Ministério Público ou mesmo de operações deflagradas pela PF se dá em meio a repetidas promessas de que não haverá impunidade e que responsáveis pagarão por omissões.
Parte das investigações em andamento vê a manutenção do acampamento golpista em frente ao quartel-general do Exército de Brasília como um dos pontos que facilitaram os ataques do dia 8 de janeiro.
Em dezembro, o Exército suspendeu ao menos duas operações conjuntas com o governo do Distrito Federal para retirar tendas e instalações do acampamento bolsonarista.
A tensão entre militares e governo causada pela falta de confiança do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na forma de atuação das Forças Armadas durante os ataques resultaram na queda, em 21 de janeiro, do comandante do Exército, general Júlio Cesar de Arruda.
Um relatório em posse do Ministério da Justiça identificou ao menos oito militares da ativa lotados na Presidência da República durante o governo Jair Bolsonaro (PL) que compareceram no ano passado a atos no acampamento golpista.
Mesmo com essas situações sendo de conhecimento público, nenhum militar, até o momento, está entre os 653 denunciados pela Procuradoria-Geral da República ou na lista dos 20 presos e alvos dos 37 mandados de busca e apreensão cumpridos nas cinco fases da operação Lesa Pátria, criada pela Polícia Federal para investigar todos os envolvidos nos ataques antidemocráticos.
Três investigações apuram possíveis ações de oficiais-generais com relação aos atos, a possível omissão das Forças Armadas quanto às invasões e, segundo o MPM (Ministério Público Militar), o "suposto auxílio de militares do Exército na fuga de manifestantes após participação em atos antidemocráticos".
Uma delas mira o ex-comandante do Batalhão de Guarda Presidencial Jorge Paulo Fernandes da Hora e policiais militares durante a invasão ao Palácio do Planalto.
O Comando do Exército, por sua vez, abriu três inquéritos policiais militares para apurar possíveis crimes relacionados à invasão dos vândalos. Não há, porém, denúncia ou medida cautelar tomada contra investigados, como prisão, busca ou outras diligências.
A PGR (Procuradoria-Geral da República), nesse primeiro mês, informou o envio ao Supremo de denúncias contra 653 pessoas até essa terça-feira (7). Nenhum militar está entre os acusados.
O volume mais expressivo de acusações formalizadas até o momento mirou pessoas presas pela polícia no acampamento em frente ao quartel-general do Exército na manhã seguinte aos ataques às sedes dos três Poderes.
O grupo foi enquadrado nos crimes de associação criminosa e incitação ao crime, por instigar as Forças Armadas contra os Poderes.
No âmbito da AGU, foi apresentada uma série de ações com o objetivo de buscar ressarcimento aos cofres públicos pelos danos causados nos ataques.
A AGU tem informado que, até agora, esse prejuízo é estimado pelos três Poderes em R$ 20,7 milhões, mas esse valor ainda pode ser excedido. As pessoas e empresas processadas pelo órgão são suspeitas de financiar o fretamento de ônibus para os atos golpistas e por participar da depredação dos prédios públicos.
Os pedidos da AGU têm sido acatados pela Justiça Federal. Ao menos R$ 4,3 milhões só em veículos já estão bloqueados. O advogado-geral da União, Jorge Messias, tem afirmado que o órgão poderá ajuizar ações por dano moral coletivo contra os golpistas.
Na PF, as cinco fases da operação Lesa Pátria já avançaram sobre envolvidos na depredação, nas autoridades omissas e contra policiais militares responsáveis pela segurança da Esplanada.
Tramitam ainda na PF, as apurações sobre os autores intelectuais dos ataques e possíveis financiadores dos golpistas.
Veja a cronologia dos pedidos de investigação, denúncias e prisões desde o 8 de janeiro:
Anderson Torres, ex-ministro da Justiça do governo Bolsonaro e ex-secretário de Segurança do DF. (Isac Nóbrega/PR)
8 DE JANEIRO
PRIMEIROS PEDIDOS DE PRISÃO: A AGU pede ao Supremo a prisão do ex-secretário de Segurança Pública Anderson Torres e a dissolução de acampamentos de apoiadores de Jair Bolsonaro nas imediações de unidades militares.
GOVERNADOR DO DF AFASTADO: STF afasta Ibaneis Rocha do cargo de governador do Distrito Federal
9 DE JANEIRO
APURAÇÃO SOBRE CONDUTA PM: A Procuradoria da República no Distrito Federal abre apuração sobre eventual conduta omissiva por parte do comando da Polícia Militar do DF.
10 DE JANEIRO
PEDIDO DE INQUÉRITO CONTRA GOVERNO DO DF: A PGR pede ao STF a abertura de inquérito para apurar as condutas do governador afastado do DF, Ibaneis Rocha (MDB), do ex-secretário de Segurança Pública Anderson Torres, do ex-número 2 da pasta Fernando Oliveira e do ex-comandante-geral da PM Fábio Vieira.
ORDEM DE PRISÃO CONTRA TORRES: STF, a pedido da PF, ordena prisão de Anderson Torres e do coronel Fábio Vieira, ex-comandante da Polícia Militar do DF.
MINUTA DO GOLPE: PF faz busca em casa de Torres e encontra minuta do golpe.
APURAÇÃO SOBRE MILITARES NO MPM: O Ministério Público Militar abre a primeira apuração preliminar sobre a participação de militares nos atos golpistas. Outras seriam instauradas nos dias seguintes, chegando a um total de oito.
11 DE JANEIRO
PEDIDOS DE INQUÉRITO CONTRA DEPUTADOS: A Procuradoria envia ao Supremo pedidos de abertura de inquérito contra os deputados bolsonaristas diplomados André Fernandes (PL-CE), Clarissa Tércio (PP-PE) e Silvia Waiãpi (PL-AP) por incitação aos atos.
COMEÇA RECUPERAÇÃO DO STF: Corte inicia os trabalhos de recuperação do plenário e dependências do tribunal depredados por vândalos golpistas.
PLENÁRIO MANTÉM DECISÕES DE MORAES: Plenário do STF referenda decisões do ministro Alexandre de Moraes que determinaram o afastamento de Ibaneis Rocha do governo do DF e a prisão preventiva de Anderson Torres, ex-ministro da Justiça de Jair Bolsonaro, e do ex-comandante-geral da PM do DF, o coronel Fábio Vieira.
DANOS AO STF: PF conclui a perícia no prédio do Supremo.
12 DE JANEIRO
PEDIDOS DE NOVOS INQUÉRITOS: A PGR requisita ao STF três novos inquéritos com o objetivo de identificar executores, financiadores, autores intelectuais e autoridades públicas envolvidas nos atos. Na seara civil, instaura procedimento para apurar a responsabilidade dos envolvidos
PRIMEIRO PEDIDO DE BLOQUEIO DE BENS: A AGU pede à Justiça o bloqueio de R$ 6,5 milhões em bens de 52 pessoas, cinco empresas e duas entidades apontadas como patrocinadores do fretamento de ônibus para transportar apoiadores de Bolsonaro a Brasília. A 8ª Vara Federal de Brasília acata o pedido
ABERTURA DE INVESTIGAÇÕES: STF instaura quatro inquéritos contra vândalos, autoridades omissas, financiadores e autores intelectuais dos ataques golpistas
13 DE JANEIRO
BOLSONARO INVESTIGADO: A PGR pede e STF aceita inclusão do ex-presidente Jair Bolsonaro no inquérito que apura a instigação e autoria intelectual dos atos antidemocráticos que resultaram nos episódios de vandalismo
DANOS: Réplica da Constituição Federal que havia sido roubada do STF é devolvida após ação da PF
14 DE JANEIRO
PRISÃO DE TORRES: PF prende Anderson Torres, ex-ministro da Justiça de Bolsonaro e ex-secretário da Segurança do DF
16 DE JANEIRO
INÍCIO DAS DENÚNCIAS: A PGR apresenta as primeiras denúncias contra os responsáveis pelos atos golpistas. O pacote inicial inclui 39 pessoas, acusadas entre outros crimes de golpe de Estado e abolição violenta do Estado democrático de Direito
19 DE JANEIRO
PEDIDO DE BLOQUEIO DE BENS SOBE PARA R$ 18,5 MI: A AGU pede que o bloqueio de bens de pessoas físicas e empresas envolvidas nos atos seja ampliado para R$ 18,5 milhões. O pedido é atendido três dias depois
20 DE JANEIRO
OPERAÇÃO DA PF: Polícia Federal deflagra 1ª fase da operação Lesa Pátria contra bolsonaristas suspeitos de participarem das depredações dos três Poderes
TOTAL DE PREJUÍZOS: TCU promove levantamento de informações junto à PF e outros órgãos para dimensionar os prejuízos à União e identificar agentes públicos que foram omissos
Imagens mostram destruição no Palácio do Planalto
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Imagens inéditas das câmares de segurança do Palácio do Planalto mostram a destruição promovida por extremistas bolsonaristas(Reprodução/TV Globo )
23 DE JANEIRO
RELÓGIO DE DOM JOÃO: PF deflagra 2ª fase da operação Lesa Pátria e prende golpista que quebrou relógio de dom João no Palácio do Planalto
INQUÉRITO CONTRA DEPUTADOS É ABERTO: STF instaura inquéritos para apurar as condutas dos parlamentares André Fernandes, Sílvia Waiãpi e Clarissa Tércio
24 DE JANEIRO
PEDIDO DE BLOQUEIO DE BENS CHEGA A 92 PESSOAS: A AGU apresenta a terceira ação pela indisponibilidade de bens e direitos de envolvidos nos atos. São mais 40 pessoas, totalizando 92 pessoas, cinco empresas e duas entidades
27 DE JANEIRO
NOVAS DENÚNCIAS: A PGR amplia para 254 o total de pessoas denunciadas. Do grupo fazem parte tanto pessoas presas nas sedes dos três Poderes no dia dos atos de vandalismo quanto aquelas detidas na manhã seguinte no acampamento em frente ao QG do Exército
PEDIDO DE BLOQUEIO DE BENS CHEGA A 134 PESSOAS: A AGU amplia para 134 pessoas, cinco empresas e duas entidades o número de responsabilizados pelos atos golpistas, seja por participar da depredação aos prédios (82) ou por financiar o fretamento de ônibus (52 pessoas, cinco empresas e duas entidades)
FÁTIMA TUBARÃO É PRESA: PF deflagra 3ª fase da operação Lesa Pátria e mira vândalos envolvidos nos atos. Em Santa Catarina, foi presa Maria de Fátima Mendonça Jacinto Souza, 67, conhecida nas redes como Fátima de Tubarão
3 DE FEVEREIRO
MÁRIO FURAÇÃO É PRESO: PF deflagra 4ª fase da operação Lesa Pátria contra vândalos envolvidos nas depredações dos Três Poderes. Um dos alvos é Lucimário Benedito Camargo, presidente da Câmara dos Dirigentes Lojistas de Rio Verde (GO), conhecido como Mário Furacão e que gravou um vídeo durante a invasão do Palácio do Planalto
4 DE FEVEREIRO
DENÚNCIAS MIRAM 653 PESSOAS: A PGR envia ao Supremo uma nova leva de pedido de ação penal e contabiliza 653 denunciados pelos atos golpistas do dia 8 de janeiro
7 DE FEVEREIRO
PRISÃO DE POLICIAIS MILITARES: PF deflagra 5ª fase da operação Lesa Pátria e mira autoridades omissas no dia dos ataques. Um dos presos é o coronel Jorge Eduardo Naime Barreto, então chefe do Departamento Operacional da Polícia Militar do DF, estrutura responsável pelo plano de segurança na Esplanada
PEDIDO DE BLOQUEIO DE BENS SOBE PARA R$ 20,7 MI: A AGU pede à Justiça Federal que o bloqueio de bens dos acusados pela depredação aos prédios dos três Poderes seja elevado de R$ 18,5 milhões para R$ 20,7 milhões, para contemplar novo cálculo da Câmara de prejuízos sofridos, que elevou de R$ 1,1 milhão para R$ 3,3 milhões