A produtividade da Justiça do Trabalho despencou com a pandemia da Covid-19. O número de julgamentos - fase de solução do processo - caiu 60,1% no segundo trimestre de 2020 em relação ao mesmo período de 2019.
Ao mesmo tempo, a inconstância na realização de audiências na fase inicial - logo após ajuizada a ação - chama a atenção. A Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho cobra de três TRTs (Tribunais Regionais do Trabalho) mais atividades por vídeo.
De abril a junho, 237,5 mil processos receberam sentenças de juízes, segundo o TST (Tribunal Superior do Trabalho). Nos mesmos meses do ano passado, foram 595,2 mil.
O ritmo também desacelerou entre desembargadores. Na segunda instância, a queda foi de 22% de abril a junho de 2020 ante o mesmo período do ano passado. Em 2019, foram 298,2 mil decisões, e, agora, 232,6 mil.
A presidente da Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho), Noemia Porto, diz que os dados pedem cautela.
"O juiz não pode ser analisado na perspectiva de número nem a Justiça, porque não são máquinas. [O termo produtividade é usado] com muitas críticas nossas, a propósito", diz. O termo produtividade é usado pela própria Justiça.
Segundo Porto, a pandemia colocou magistrados diante de novos desafios. Ela afirma que neste momento processos coletivos têm prioridade de julgamento.
"Não são [ações] de simples solução. Uma coisa é produzir uma sentença trivial, do seu dia a dia. Esse tipo de processo da pandemia, com necessidade de resposta rápida, requer envolvimento do juiz de modo diferenciado", diz.
Em nota, a Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho, comandada pelo ministro Aloysio Corrêa da Veiga, afirma que a produtividade "foi bastante satisfatória no período de pandemia".
"A Justiça do Trabalho tem se destacado pela pronta atuação em situações de urgência envolvendo demandas relacionadas à Covid-19."
Os prazos de ações já em andamento - à espera de julgamento, por exemplo - foram suspensos no meio de março e retomados em 4 de maio. As atividades voltaram de modo gradual. O TST preparou um protocolo para as atividades presenciais, sem previsão de início.
Longe dos fóruns, magistrados discutem as demandas pela tela do computador, no conhecido home office.
Segundo a corregedoria, as audiências de instrução, para produção de provas que se dão no início da ação, foram retomadas em 25 de maio, "situação que tem direta relação com a prolação de sentença [quando a decisão é tomada]".
A pandemia fez outro indicador subir: o de ações pendentes de julgamento. O estoque de processos, que já chegou a 1,8 milhão em 2017, estava em queda.
Desde julho de 2019, o montante estava abaixo de 1 milhão. Agora, superou a marca. Um processo, do ajuizamento até a sentença, leva em média 240 dias, segundo o TST.
Mas, enquanto julgam menos, os magistrados também receberam menor volume de processos. No segundo trimestre, a redução foi de 30,6%.
De abril a junho deste ano, chegaram aos juízes de primeira instância 337,1 mil ações. No ano passado, no mesmo período, foram 485,8 mil.
"A queda se deu em virtude do próprio isolamento e restrições impostas pela pandemia", afirma a corregedoria do TST. "A conclusão de que a produtividade foi baixa no período é equivocada se não considerarmos essas circunstâncias."
Na contramão das instâncias inferiores, o TST apresentou maior produtividade. A corte julgou 3,4% mais processos no segundo trimestre deste ano em relação ao mesmo período de 2019. Foram 103,4 mil ante 100 mil.
Apesar de elogiar o desempenho dos colegas, Veiga já cobra resultados de juízes e desembargadores em teletrabalho. Até o momento, magistrados dos TRTs de Sergipe, Bahia e Rio de Janeiro entraram na mira do corregedor-geral.
As cortes são questionadas por haver registro da não realização de audiências por vídeo. Segundo a Corregedoria-Geral, Veiga encaminhou ofícios para que realizem "imediatamente audiências telepresenciais em fase de conhecimento, iniciais e instrução".
Quando uma reclamação é apresentada, essas audiências são a primeira etapa do processo. Na inicial, pode-se, por exemplo, fechar um acordo. Na instrução, são colhidas provas, como as testemunhais.
"Não há notícia de nenhum tribunal que não esteja realizando audiências telepresenciais. O que se apurou, tomando por exemplo o TRT-20 [Sergipe], o TRT-1 [Rio de Janeiro] e o TRT-5 [Bahia], foi que alguns juízes não estariam realizando audiências", diz o órgão.
A Corregedoria-Geral não informa o número de magistrados que não promovem as audiências. O órgão diz atuar com o apoio das corregedorias regionais.
No caso de Sergipe, Veiga deu prazo de 20 dias para que um plano seja apresentado. O descumprimento pode implicar advertência, censura e até aposentadoria compulsória.
Porto, da Anamatra, critica as medidas. "As pautas de audiência são de organização dos magistrados", afirma.
Segundo ela, as audiências de instrução, principalmente por envolver provas, enfrentam resistência de advogados. "Não existe resistência em audiência de conciliação, por exemplo", diz.
Fabio Gaspar, presidente do Sasp (Sindicato dos Advogados do Estado de São Paulo), discorda. "Não há resistência, mas posicionamento. Somos contra a audiência de instrução, de oitiva das partes e das testemunhas, por vídeo", diz.
A Corregedoria-Geral, por sua vez, afirma que a audiência telepresencial é regra. As exceções devem ser analisadas pontualmente, e o juiz pode, com decisão fundamentada, suspender a videoconferência.
Procurado, o TRT de Sergipe não quis se manifestar.
O TRT do Rio de Janeiro, em nota, afirma que tomou conhecimento do ofício do TST. A corte diz que "serão tomadas as providências necessárias" para garantir a continuidade das atividades.
"A corregedoria esclarece que, desde o início da suspensão das atividades presenciais em decorrência da pandemia, vem atuando para assegurar que a prestação jurisdicional ocorra de forma ininterrupta."
A Presidência do TRT da Bahia, também em nota, afirma que ainda não foi informada das medidas do TST. O tribunal diz adotar "todos os esforços para munir magistrados e servidores de equipamentos e capacitação necessários".
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