Depois de ganhar apoios junto a artistas e intelectuais historicamente ligados ao PT, a chapa Guilherme Boulos/Luiza Erundina, do PSOL, avança sobre a base petista na periferia de São Paulo. Lideranças comunitárias que há décadas apoiavam o PT ouvidas pelo Estadão disseram que agora estão com Boulos. Algumas delas vão fazer campanha para candidatos petistas a vereador.
Assessor de movimentos populares e pastorais sociais da Igreja Católica em Ermelino Matarazzo (zona leste), Waldir Aparecido Augusti, o professor Waldir, se orgulha em dizer que votou pela primeira vez na vida em 1982, no PT, e desde então ele e a mulher se mantiveram fiéis ao partido em todos os pleitos.
Neste ano, porém, vai ser diferente. Professor Waldir, que é filiado ao PT, decidiu apoiar a chapa do PSOL. "Há tempos a gente defende que o PT retorne às suas origens, retome sua relação com as bases e dê formação e espaço para novos dirigentes. Infelizmente, de um tempo para cá o partido tem um comando que encaminha as questões sem a participação da base."
Segundo ele, um dos reflexos disso é a falta de nomes competitivos para disputar a Prefeitura na cidade que já foi governada três vezes pelo PT e que levou à escolha de Jilmar Tatto, um quadro forte na política interna do partido mas desconhecido do eleitorado, como candidato. "Boulos é uma nova liderança e a união com Erundina foi uma surpresa agradável", disse ele.
Apesar de se aliar ao PSOL na disputa majoritária, o professor vai apoiar a petista Juliana Cardoso para a Câmara Municipal. "Se o candidato do PT fosse o (Fernando) Haddad ou o (Alexandre) Padilha au teria apoiado." Waldir é próximo do bispo emérito dom Angélico Sândalo Bernardino, amigo há décadas do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e do Padre Ticão, líder comunitário na zona leste. Ticão já recebeu dez candidatos no salão da paróquia de São Francisco, entre eles Boulos. "Jilmar (Tatto) ainda não veio e nem marcou visita." Ticão ainda não decidiu quem vai apoiar.
A resistência de Dom Angélico e Padre Ticão em embarcarem na campanha de Tatto foi usada como exemplo da perda de apoio nas franjas da capital em reunião entre dirigentes petistas e Lula na segunda-feira, na qual lideranças defenderam a troca de Tatto por Padilha ou até a desistência da candidatura. Lula ficou preocupado, cobrou correções, mas bancou Tatto.
A estrutura partidária criada ao longo de três décadas na periferia paulistana é um dos trunfos do PT para fazer Tatto decolar junto com o tempo de TV, maior do que o dos adversários da esquerda. A prioridade à periferia está no centro do discurso de Tatto. Mas essa estrutura já deu sinais de fraqueza em 2016, quando Haddad perdeu em todos os distritos eleitorais.
"Sou filiado ao PT, tenho um compromisso de apoiar o (vereador) Antonio Donato mas para prefeito vou votar no Boulos", disse João Cardoso, da Associação Beneficente, Solidária e Cultural da Vila Ré, também na zona leste. Cardoso diz que apoiaria o candidato do PSOL mesmo que o PT tivesse escolhido um nome mais palatável. E reclamou da forma da escolha, em um colégio limitado a 604 pessoas por causa das restrições impostas pela Covid-19, e não por voto direto.
Cardoso disse não se preocupar com retaliações no partido. A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, ameaçou usar o estatuto do partido contra que filiados que apoiarem outros candidatos. "A presidente é pessoa democrática e se ouvir a minha explicação vai entender os motivos que me levaram a isso."
Depois de 35 anos ao lado do PT, Adailton Costa de Miranda, o Alemão, liderança comunitária e ex-diretor do Clube Desportivo Bento Bicudo, na Lapa de Baixo, Zona Oeste, também vai apoiar Boulos. Para vereador ele cogita apoiar Alfredinho, do PT. "Quero fechar a comunidade com o Boulos. São 6 mil votos."
Em nota, a campanha de Tatto minimizou a perda de apoios. "O PT-SP possui 178 mil filiados e os referidos casos, que não possuem cargo na estrutura partidária, não chegaram oficialmente ao conhecimento da direção."
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