WASHINGTON, EUA - Na primeira reunião entre Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Joe Biden como presidentes do Brasil e dos EUA, realizada na Casa Branca, em Washington, nesta sexta-feira (10), o petista convidou o líder americano para discutir um mecanismo de governança global que force os países a acatar decisões na área climática.
"É preciso que a gente estabeleça uma nova conversa para construir uma governança mundial mais forte", afirmou o petista ao democrata. "A questão climática, se não tiver uma governança global forte e que tome decisões que todos os países sejam obrigados a cumprir, não vai dar certo", acrescentou.
"Não sei qual é o fórum, não sei se na ONU, não sei se é no G20, não sei se é no G8, mas alguma coisa temos que fazer para obrigar os países, o nosso Congresso, os nossos empresários a acatar decisões que tomamos em nível global. Se não acontecer, nossa discussão na questão climática ficará prejudicada."
Lula chegou à Casa Branca, às 17h50, no horário de Brasília, e cumprimentou Joe Biden com um aperto de mãos que simbolizou a reaproximação entre Brasil e EUA após dois anos de relações dormentes.
Ele chegou acompanhado da primeira-dama, Janja Lula da Silva, e foi recebido pelo presidente americano no jardim dos fundos da Casa Branca. Eles seguiram para o Salão Oval, onde se reuniram a sós antes de um encontro maior com os ministros Fernando Haddad (Fazenda), Mauro Vieira (Relações Exteriores), Marina Silva (Meio Ambiente) e o assessor especial Celso Amorim, junto a ministros do governo Biden.
A primeira-dama Jill Biden tomaria um chá com Janja, mas a agenda foi cancelada porque a americana, segundo o governo americano, não estava se sentindo bem - ela fez um teste para Covid, e o resultado foi negativo. Janja então fez um tour pela Casa Branca enquanto os presidentes se reuniam. Dos jardins da Casa Branca era possível ouvir apoiadores do petista com caixa de som, megafone e gritos de "Lula".
Os dois presidentes tiveram no Salão Oval uma breve conversa, de 13 minutos, na presença da imprensa. Biden disse "bem-vindo de volta" a Lula e destacou que era uma "honra recebê-lo de volta na Casa Branca".
O democrata reforçou ainda ver o Brasil como "parceiro natural para enfrentar os desafios atuais, globais e especialmente a mudança climática" e fez com que a defesa da democracia fosse o principal assunto da conversa. "Nossas duas nações são democracias fortes que foram duramente testadas e prevaleceram", disse, referindo-se aos ataques de 6 de janeiro de 2021 em Washington e de 8 de janeiro de 2023 em Brasília. "Em ambos os casos a democracia prevaleceu", disse o líder americano numa rápida introdução.
Lula, por sua vez, fez uma série de referências ao governo Bolsonaro e disse que queria "recolocar o Brasil na nova geopolítica mundial, porque o Brasil se enrolou durante quatro anos". Lula ainda agradeceu Biden pela "solidariedade no reconhecimento" da vitória do petista e pela defesa da democracia.
"O senhor sabe que o Brasil ficou quatro anos se automarginalizando. Um presidente que não gostava de ter relações com nenhum país", disse ele, afirmando, sem citar o nome de Bolsonaro, que "seu mundo começava e terminava com fake news" e que o ex-presidente "menosprezava as relações internacionais".
Nesse momento, Biden brincou: "Soa famíliar", para risadas do público presente.
A visita de Lula a Washington é cercada de expectativas, depois das relações tensas da Casa Branca com Brasília no período em que Biden conviveu com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no comando do país.
Biden foi um dos primeiros líderes a parabenizar Lula após a vitória na eleição de outubro. A Casa Branca disparou um comunicado à imprensa pouco mais de meia hora após a confirmação oficial. Quando o democrata foi eleito presidente dos EUA, em 2020, Bolsonaro demorou 38 dias para parabenizá-lo.
Apoiador de primeira hora do ex-presidente Donald Trump, o ex-presidente ainda ecoou alegações de fraude na eleição americana. Biden e Bolsonaro nunca se falaram por telefone e só se reuniram uma vez.
O convite para a visita foi feito pouco após a eleição do petista e reforçado quando os dois presidentes se falaram no dia seguinte aos ataques aos Três Poderes, em Brasília, em 8 de janeiro. Os atos golpistas contrários à vitória do brasileiro repetiram com dois anos de diferença a invasão do Capitólio em 6 de janeiro de 2021, quando apoiadores de Trump tentaram impedir a confirmação da vitória de Biden.
Assim, a defesa da democracia é um dos elementos mais fortes de conexão entre Lula e Biden e um dos tópicos centrais da reunião desta tarde. O outro assunto é a importância dada ao ambiente e o reconhecimento da urgência da crise do clima. Com a posse de Lula e o descongelamento do Fundo Amazônia, iniciativa bancada por Noruega e Alemanha para preservar a maior floresta do Brasil, os EUA reverteram um posicionamento dos últimos anos e aceitaram colocar dinheiro no fundo.
O anúncio deve ser feito após o encontro entre os dois presidentes.
Lula e Biden se conheceram em 2009, quando o hoje presidente americano era vice de Barack Obama e o petista estava em seu segundo mandato. A nova embaixadora americana no Brasil, Elizabeth Bagley, viajou a Washington para acompanhar a visita. Ao se encontrar com Lula na última semana, em Brasília, afirmou que estava "muito confiante de que eles serão melhores amigos", pois ambos têm "personalidades envolventes". Disse ainda que Biden vê Lula "não apenas como líder de seu país, mas regional e global".
A presença de Bagley na Casa Branca contrasta com a situação do Brasil. A visita de Lula à capital dos EUA aconteceu em um momento de troca no comando da embaixada brasileira em Washington.
O novo governo indicou Maria Luiza Viotti como nova representante do governo no país, mas o nome dela ainda precisa ser aprovado pelo Senado. O embaixador atual, Nestor Forster, muito identificado com o bolsonarismo, ainda não deixou o posto, mas tirou férias durante a visita para evitar uma saia justa. No período, a embaixada é comandada por Bernardo Paranhos Velloso, hoje número dois na instituição.
Uma visita presidencial com uma embaixada "acéfala" fez com que a viagem fosse toda organizada diretamente por Brasília, com pouca participação da representação brasileira no exterior.
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