Marielle Franco vive. Pelo menos na entomologia, que é o estudo dos insetos. A vereadora, socióloga, ativista dos direitos LGBTQIA+ e das comunidades carentes, morta em 2018, acaba de ser homenageada com uma nova espécie de formiga brasileira.
Além de Franco, outras dez mulheres, dois pesquisadores e o povo da etnia indígena wachiperi emprestam seu nome a formigas do gênero Hylomyrma.
O artigo descrevendo as 14 novas espécies foi publicado em outubro na revista especializada Zootaxa. A autora é Mônica Ulysséa, entomóloga e pesquisadora do Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo. O trabalho, fruto da sua tese de doutorado, foi feito em conjunto com o seu orientador, Carlos Roberto Brandão, professor do mesmo instituto.
Para a homenagem, Ulysséa pensou em mulheres que "cada uma em sua área de atuação, lutaram para ocupar um lugar historicamente considerado como não seu". "Escolhi homenagear mulheres que inclusive não são cientistas, para chamar atenção para todos os vieses de gênero na nossa sociedade", explica.
Entre os nomes, se destacam Clarice Lispector, Dandara dos Palmares e a jogadora de futebol Formiga.
O gênero Hylomyrma, antes conhecido para 16 espécies, agora possui 30, com distribuição desde o sul do México até o norte da Argentina.
No estudo, a pesquisadora mapeou características morfológicas dos bichos, como pelos e espinhos na cabeça, abdômen e tórax, as três partes do corpo de um inseto. Para conseguir separar e identificar cada espécie, ela avaliou 3.260 indivíduos.
A área da biologia que identifica e classifica as espécies que compõem nossa biodiversidade é conhecida como taxonomia. Apesar da importância desses especialistas, o taxonomista é um profissional que está "sob risco de extinção", afirma a bióloga.
"O baixo investimento de agências do governo ou de universidades, por ser considerada uma ciência de base, acaba dificultando o trabalho", diz. Ela lembra que, diferente de outras áreas científicas consideradas mais "duras", a taxonomia apresenta maior representatividade feminina no Brasil, pelo menos em alunas de graduação e pós-graduação da área de ciências biológicas.
Apesar de ter uma distribuição ampla, o gênero Hylomyrma era considerado raro, de difícil observação no campo. Por essa razão, se conhecia muito pouco da sua biologia.
Ulysséa, em seu trabalho, identificou uma característica que chama atenção nesse grupo de formigas: a presença de uma casta intermediária entre as operárias -estéreis, responsáveis por buscar comida e construir os formigueiros- e as rainhas -reprodutoras que passam a vida toda no ninho.
A pesquisa encontrou fêmeas que não são nem operárias, nem rainhas em pelo menos onze espécies, indicando que essa descoberta não é tão incomum assim. Essas formigas unem traços tanto da operária quanto da rainha na morfologia. É algo que, agora, poderá ser melhor compreendido em campo, diz Ulysséa.
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