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Médica engana ao dizer que vacinas contra Covid são experimentais

Médica engana ao dizer que vacinas contra Covid são experimentais

São enganosas as declarações da médica Maria Emilia Gadelha Serra em vídeo no YouTube. Ao contrário do que ela diz, o Brasil não tem a maioria dos pacientes graves por covid vacinada, não há relação comprovada de alumínio com o desenvolvimento de demência, os imunizantes não são experimentais e os benefícios superam os riscos da vacinação

Publicado em 29 de agosto de 2021 às 22:00

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Passando a Limpo: Médica engana ao dizer que vacinas contra Covid são experimentais
Ao contrário do que diz médica no You Tube, o Brasil não tem a maioria dos pacientes graves por Covid vacinada. (Reprodução/Comprova)

Conteúdo verificado: Médica afirma em live que a maioria dos casos graves de covid ocorre em pessoas vacinadas no Brasil, na Inglaterra e em Israel; declara haver 23% de notificações de óbito pós-Coronavac, chamada por ela de produto experimental; sustenta que o Butantan utilizou vacina de hepatite e de meningite como placebo; e, por fim, sugere que haverá aumento de casos de demência e Alzheimer por conta da utilização de alumínio.

São enganosas as afirmações sobre vacinas feitas por uma médica durante live transmitida no YouTube. Em um trecho que viralizou no TikTok, Maria Emilia Gadelha Serra tira dados de infecções entre vacinados de contexto, cita informações de efeitos adversos pós-vacinação sem que tenham sido confirmados por técnicos e afirma que componentes das vacinas causariam demência, o que não possui embasamento científico, segundo autoridades no assunto.

Os imunizantes que estão sendo aplicados na população não são experimentais, ao contrário do que diz a médica. Todas as substâncias utilizadas no Brasil foram autorizadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) após terem eficácia e segurança comprovadas ao serem aplicadas em milhares de voluntários durante os testes.

Ela sustenta que a maioria dos casos graves atuais da doença no Brasil ocorre em pessoas já vacinadas, o que não é verdadeiro, segundo um estudo realizado por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Estadual Paulista (Unesp). Além disso, ela compara a realidade do Brasil com os dados da Inglaterra e de Israel. No entanto, é equivocado fazer esse tipo de comparação sem considerar muitas variáveis como momento epidemiológico, cobertura vacinal, características sociais e demográficas da população.

Ainda atacando as vacinas, a médica diz haver, no Brasil, 23% de notificações de óbitos pós-Coronavac, afirmando ter coletado os dados no Vigimed, o sistema disponibilizado pela Anvisa para cidadãos, profissionais de saúde, detentores de registro de medicamentos e patrocinadores de estudos relatarem suspeitas de eventos adversos aos medicamentos e às vacinas. No entanto, a plataforma contém um alerta de que aqueles dados são suspeitas e de que os eventos adversos só podem ser realmente associados às vacinas após análise técnica. A Anvisa informou ao Comprova que, até o momento, nenhum óbito foi identificado com relação à vacina.

Sobre a declaração de que o Butantan utilizou hidróxido de alumínio, vacina de hepatite e de meningite como placebo, o Comprova identificou que a primeira substância é utilizada em vacinas desde a década de 30 e que não há evidência científica que comprove a associação entre ela e o desenvolvimento de Alzheimer. As duas outras substâncias citadas pela médica não foram utilizadas pelo instituto durante os testes da Coronavac.

Maria Emilia Gadelha foi procurada pela reportagem, mas não respondeu até a publicação. Para o Comprova, é enganoso o conteúdo que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor.

COMO VERIFICAMOS?

Consultamos o painel de farmacovigilância da Anvisa, chamado VigiMed, para ver os dados de efeitos adversos relacionados a vacinas. Como esta ferramenta não traz a conclusão dos técnicos sobre a relação (ou não) dos eventos com os imunizantes, entramos em contato com o órgão por e-mail para obter essa informação.

Os especialistas procurados para comentar sobre a segurança das vacinas atualmente em uso no Brasil foram Renato Kfouri, diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações, e Denise Garrett, vice-presidente do Instituto Sabin de Vacinas. Eles deram informações sobre o uso de alumínio em imunizantes. Para este fim, também foram consultados os sites do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC), dos Estados Unidos, e da Alzheimer’s Society, do Reino Unido.

As informações sobre vacinados e infecções na Inglaterra foram obtidas por meio de consultas a reportagens da mídia local. As mesmas informações sobre Israel foram consultadas em duas checagens recentes do Comprova (esta e esta) que já haviam entrado em contato com o Ministério da Saúde de Israel. Foram verificados, ainda, dados oficiais de ambos os governos.

Solicitamos informações sobre vacinados e infectados ao Ministério da Saúde do Brasil e também acessamos publicações da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).

Entramos em contato com o Instituto Butantan, produtor no território nacional da Coronavac. Também consultamos o artigo do instituto com as informações sobre os estudos clínicos da vacina.

Por fim, a médica que fez as alegações foi procurada, mas não respondeu.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 24 de agosto de 2021.

VERIFICAÇÃO

Vacinas usadas no Brasil não são experimentais

Durante a live, a médica se refere às vacinas contra a covid-19 tratando-as como experimentais. Dois dos imunizantes atualmente em uso no Brasil, da Pfizer e de Oxford-Astrazeneca, produzido no país pela Fiocruz, já receberam o registro definitivo da Anvisa e podem, inclusive, ser comercializados. As outras duas, Coronavac e Janssen, receberam autorização de uso emergencial para serem aplicadas em virtude da pandemia.

A Anvisa explica em seu site que este tipo de autorização serve para facilitar a disponibilização e o uso das vacinas numa emergência de saúde pública. Ainda segundo o órgão, elas não representam risco para a saúde, tendo em vista que a aprovação exige requisitos de segurança, qualidade e eficácia.

“O caráter temporário é a principal diferença entre o ‘uso emergencial’ e o ‘registro sanitário’. Enquanto o uso emergencial é uma autorização excepcional, o registro representa uma aprovação sem prazo determinado”, diz a Anvisa.

As quatro vacinas utilizadas no país tiveram eficácia comprovada em fase 3, na qual elas foram aplicadas em milhares de voluntários. Com isso, pode-se observar, por amostragem, qual é o resultado esperado para quando o imunizante for aplicado em massa. Antes disso, já haviam passado por duas fases de testes clínicos, em um número menor de pessoas.

O trabalho dos laboratórios e da Anvisa não para após a aprovação de um imunizante. Depois disso, vem a fase 4: monitoramento da população para averiguar se os efeitos adversos são consistentes com o observado nos testes. Isso é feito por uma questão de segurança.

No primeiro ano da pandemia, a principal preocupação era saber se os imunizantes eram eficazes em desacelerar contágios e diminuir a probabilidade de quadros graves e hospitalização dos doentes. Com isso, seria possível que os governos fornecessem a estrutura necessária e os hospitais não entrassem em colapso. Foi com esse enfoque que os estudos foram desenhados inicialmente e mostraram que as vacinas eram eficazes.

Agora, os estudos continuam para levantar outras informações. Os cientistas buscam compreender, por exemplo, qual a eficácia das vacinas contra variantes do coronavírus e por quanto tempo dura a proteção conferida por elas.

Pesquisa mostra que maior parte dos mortos no Brasil não foi vacinada

No vídeo, a médica alega que “a maioria dos casos graves, hoje em dia, são de vacinados no Brasil”. Segundo ela, isso seria uma percepção sua diante de “comunicados de médicos nos grupos de WhatsApp”.

Na contramão do que ela afirma, a plataforma de monitoramento Info Tracker, mantida por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Estadual Paulista (Unesp), realizou a análise de todas as mortes causadas por coronavírus entre janeiro e julho deste ano, apontando que a maioria dos óbitos por covid no Brasil foram de pessoas que não haviam sido vacinadas.

O estudo, divulgado pela imprensa, utilizou dados do Ministério da Saúde e concluiu que 9.878 pessoas que faleceram pela doença no período analisado estavam imunizadas, o equivalente a 3,68% das mortes neste período.

No último dia 20, o Brasil chegou à marca de 120 milhões de brasileiros vacinados com a primeira dose, o que corresponde a 75% da população adulta, segundo o Ministério da Saúde. O país tem mais de 53,2 milhões de pessoas acima dos 18 anos completamente imunizadas com a segunda dose ou dose única do imunizante.

O Comprova questionou ao Ministério da Saúde se houve aumento ou diminuição de pacientes em estado grave e de óbitos dentre os vacinados. O órgão respondeu terem sido notificados, em 2021, 792.596 casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG), somando tanto os casos confirmados para covid-19 quanto os casos sem determinação da causa da doença. Destes casos, 156.825 (19,8%) haviam recebido a primeira dose da vacina 14 dias, ou mais, antes do início dos sintomas, e 59.514 (7,5%) haviam recebido a segunda dose da vacina 14 dias, ou mais, antes da data do início dos sintomas.

Desde 2019, a Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS) passou a monitorar a SRAG decorrente de Influenza e outros vírus respiratórios, sendo incluída em 2020 a vigilância da covid-19, a infecção humana causada pelo novo coronavírus.

“Importante ressaltar que tais dados são preliminares e, para análise, é necessário levar em consideração o número de indivíduos imunizados, o momento epidêmico da vacinação e do uso de cada vacina, o tempo de observação decorrido para cada imunizante, entre outras covariáveis. As interpretações sobre a efetividade ou impacto da vacina não podem ser desprendidas destes dados da maneira como estão apresentados”, destacou o Ministério da Saúde, acrescentando que as vacinas não impedem a ocorrência de formas graves, apenas as reduzem substancialmente.

“Outro ponto a ser considerado é que já foram alcançadas coberturas vacinais superiores a 90% nos idosos, o que resultou em uma queda substancial na ocorrência de casos graves e óbitos por Covid-19 nesse público”.

O Ministério da Saúde cita um estudo feito em parceria com a Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e com a Universidade Harvard (EUA), cujo resultado evidencia que cerca de 43 mil brasileiros acima de 70 anos foram salvos pelos imunizantes em um período de 90 dias, ao analisarem o cenário epidemiológico de mais de 230 mil óbitos causados pela doença no país, entre 3 de janeiro a 27 de maio deste ano.

“Os resultados corroboram a elevada efetividade das vacinas covid-19 em reduzir formas graves e óbitos pela doença, o que vem sendo observado em estudos de efetividade após a implantação da vacinação”.

A edição do dia 19 de agosto do Boletim do Observatório Covid-19 Fiocruz informa que pela oitava semana consecutiva foi observada redução do número de casos, internações e óbitos no país. No decorrer das semanas anteriores, destaca, houve um alívio relativo nos hospitais, com a redução das taxas de ocupação de leitos de UTI Covid-19 para adultos no Sistema Único de Saúde (SUS).

A exceção é o estado do Rio de Janeiro que apresenta aumento no indicador pela terceira semana consecutiva, voltando a atingir o patamar de 70%, o que não ocorria desde meados de junho, emitindo um alerta para a difusão da variante Delta, devido à alta transmissibilidade e à reduzida parcela da população com esquema de imunização completo.

Uma nota técnica do Observatório Covid-19 Fiocruz publicada em julho de 2021 mostra que, considerando as taxas de incidência das hospitalizações e mortes por covid-19 por faixas etárias e em cada região do país, é possível ver uma queda no número de casos a partir de março, principalmente nas faixas etárias 60-79 anos e 80+, ou seja, primeiros grupos a serem vacinados no país.

“Com os resultados de efetividade da vacinação aqui descritos e com a cobertura vacinal maior nestas faixas do que em outras no período, a vacinação foi um importante fator para redução do número de casos graves e óbitos”, diz o documento, que foi confeccionado utilizando as bases de dados do sistema do Programa Nacional de Imunizações (PNI) e do Sistema de Informação da Vigilância Epidemiológica da Gripe (SIVEP-Gripe) com dados reportados até 7 de junho.

Delta aumenta hospitalizações na Inglaterra e em Israel, que têm alta cobertura vacinal

Embora a médica diga que a maioria dos casos graves na Inglaterra e em Israel são entre os vacinados, é equivocado comparar dados de países distintos. Muitas variáveis impactam nos resultados, como número de indivíduos imunizados, momento epidêmico da vacinação e estratégia adotada para a imunização – como foi dito acima.

Comprova já publicou diversas verificações (12 e 3) informando que a vacinação protege contra casos graves de covid-19 e, consequentemente, óbitos, mas estudos sugerem menor eficácia quando o imunizado entra em contato com a variante delta e de acordo com o tempo passado após a segunda dose da vacina.

A circulação da cepa em países como Israel e Inglaterra tem aumentado o número de internações hospitalares, mas os dados devem ser contextualizados. Ambos os países, por exemplo, têm ampla cobertura vacinal, sendo normal, portanto, que os casos positivados estejam associados a pessoas vacinadas em algum grau.

O governo de Israel registra aumento nas infecções como resultado da circulação da variante, inclusive com a hospitalização de pacientes totalmente vacinados, principalmente entre os grupos de risco.

Na semana passada, ao ser procurado pelo Comprova, o Ministério de Saúde israelense informou que a mais recente onda de contaminações no país se dá, além da aparição da Delta, por causa da diminuição na proteção das pessoas vacinadas em janeiro e fevereiro. Com base nisso, o órgão passou a recomendar uma terceira dose para os idosos, que já está sendo aplicada.

A plataforma de dados relacionados aos casos de covid no país apresenta o número de pacientes ativos e considerados em estado grave, aqueles hospitalizados, contendo, inclusive, a comparação entre a incidência de pacientes para cada 100 mil residentes em cada etapa de imunização: totalmente vacinado; parcialmente vacinado; e não vacinado.

Apesar de a maioria dos pacientes ter sido totalmente vacinada, segundo os números absolutos verificados pelo Comprova em 20 de agosto de 2021, quando a análise é feita a partir dos números relativos (coletados na mesma data), conforme orientou o Ministério da Saúde de Israel à reportagem, e considerando a taxa de 100 mil habitantes, é possível perceber mais hospitalizados dentre as pessoas não vacinadas no país.

A faixa etária entre 60 e mais de 90 anos foi a primeira a ser imunizada e é a mais coberta até o momento com primeira, segunda e terceira dose, que já é aplicada no país.

Na quinta-feira (18), o Reino Unido tinha 89,6% da população adulta vacinada com a primeira dose e 77,5% com a segunda dose, conforme os dados oficiais do Serviço Nacional de Saúde (NHS). O órgão relatou também aumento em 7,6% de casos positivos e 7,9% de mortes entre 12 e 18 de agosto, em relação aos sete dias anteriores, além de um crescimento de 4,3% em hospitalizações entre 8 e 14 de agosto, comparado à semana anterior.

A plataforma de dados do país não traz a especificação de quantas dessas pessoas hospitalizadas e mortas estavam vacinadas, mas o Reino Unido também relata preocupação com a circulação da variante delta e estuda a possibilidade de aplicação de uma terceira dose de vacina.

Uma checagem publicada pela Reuters explicou terem sido descontextualizadas informações sobre mortes de covid em pessoas vacinadas a partir de um relatório da agência de Saúde Pública da Inglaterra (PHE), publicado em 25 de junho. O post verificado pela agência sugeria que as mortes por covid-19 naquele país são significativamente maiores em pessoas que receberam pelo menos uma dose da vacina, com o maior número de mortes ocorrendo em pessoas totalmente vacinadas, referindo-se à tabela 4 da página 13 do documento.

A tabela em questão mostra o número total de 117 mortes em pessoas com teste positivo para a variante delta, entre 1º de fevereiro e 21 de junho. Dessas, 20 ocorreram em indivíduos que receberam uma dose de vacina e 50 em pessoas que receberam duas. Outras 44 pessoas não foram vacinadas e o estado de vacinação de três delas era desconhecido. A Reuters destaca a importância da análise destes dados junto à contextualização do cenário, sendo enganoso sugerir que os números provam uma correlação entre vacinação e morte.

A Reuters explica ser importante levar em conta, por exemplo, a demografia de indivíduos vacinados e não vacinados, especialmente porque o programa de vacinação da Grã-Bretanha priorizou pessoas mais velhas ou clinicamente vulneráveis.

O especialista Muge Cevik, professor clínico de doenças infecciosas e virologia médica na Universidade de St. Andrews, afirmou à publicação ser esperado, quando a maioria das pessoas for vacinada, que a maior parte das infecções e mortes ocorram entre este público.

É importante destacar que mesmo com o registro de pessoas internadas em estado grave que já foram vacinadas, o número de hospitalizações despencou desde janeiro deste ano (confira o gráfico, disponível aqui), após o início da vacinação no Reino Unido.

Eventos pós-vacina

A médica afirma que houve quase 23% de notificações de óbito depois da aplicação da Coronavac no Brasil. Procurada pelo Comprova, a Anvisa declarou não existirem óbitos comprovadamente relacionados ao uso de qualquer vacina contra a covid-19. “O que existem são suspeitas notificadas, mas que quando investigadas não revelaram relação de causa”.

Até o momento, acrescenta, o caso com relação de causa mais forte aconteceu em maio de 2021. Conforme consta na recomendação sobre suspensão da vacinação de gestantes com a vacina Astrazeneca, no dia 7 daquele mês a Anvisa foi notificada pelo próprio fabricante, a Fiocruz, de uma suspeita de evento adverso grave de acidente vascular cerebral hemorrágico com plaquetopenia ocorrido em gestante que levou ao óbito do feto.

“A Anvisa iniciou imediatamente a avaliação do caso. O evento adverso grave de acidente vascular cerebral hemorrágico foi avaliado como possivelmente relacionado ao uso da vacina administrada na gestante. A análise levou em consideração diversos aspectos como dados sobre o(a) paciente, sua história clínica, dados de exames laboratoriais, bem como sinais e sintomas apresentados após a administração de um medicamento ou vacina”, explica.

A ocorrência de um tipo raro de trombose e queda no número de plaquetas foi determinada como um evento adverso raro que pode acometer entre 0,1% e 0,5% dos imunizados, informa a Anvisa. A probabilidade é tão baixa que o órgão decidiu manter a aplicação do imunizante na população em geral, tendo em vista que os benefícios com redução de casos graves e mortes superam o risco. A única exceção foram as grávidas, grupo no qual o uso das vacinas de vetor adenoviral – Oxford-Fiocruz e Janssen – deve ser evitado.

O órgão destaca, também, que casos de pessoas vacinadas sendo contaminadas por covid são esperados, considerando que nenhuma das vacinas em uso no mundo possui 100% de eficácia. “É justamente por esta razão que o objetivo é vacinar toda a população, o que efetivamente criará uma proteção coletiva”.

A médica que fez as declarações alvo desta checagem declara ter baseado as considerações em dados do sistema VigiMed, mas as informações que alimentam a plataforma são fornecidas por profissionais de saúde e fabricantes farmacêuticos mediante suspeitas de eventos adversos, conforme explica uma checagem do Estadão Verifica.

Na prática, a Anvisa utiliza esses dados para monitorar e avaliar o risco de uma substância, servindo apenas como sinalizadores. A própria plataforma mantém um comunicado alertando sobre os cuidados necessários na interpretação dos dados do sistema. De acordo com o texto, “embora os eventos tenham sido observados após a administração de determinado medicamento e vacina, não é possível ter certeza que relacionada ou resultado causado por estes”. Essa ligação só pode ser feita após a investigação por técnicos.

Alumínio é usado em vacinas há anos

O alumínio é um dos metais mais comuns na natureza e está presente no ar, na comida e na água. Ele é usado para incrementar a eficácia de algumas vacinas, explica Denise Garrett, vice-presidente do Instituto Sabin de Vacinas. “O alumínio é o adjuvante. Ele é usado nas vacinas de vírus atenuado porque sabemos que ela não produz resposta imunogênica muito grande. Eles colocam o alumínio para aumentar a resposta imunogênica.”

O elemento é atualmente utilizado nas vacinas Coronavac e Janssen.

O Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC), dos Estados Unidos, informa que os sais de alumínio são utilizados em algumas vacinas desde 1930 com segurança. “Pesquisas científicas comprovaram que a quantidade de alumínio a que as pessoas são expostas quando seguem o calendário recomendado de vacinação é baixa e não é absorvida de imediato pelo corpo”, informa o órgão.

Na live, a médica diz que os testes clínicos da Coronavac utilizaram “hidróxido de alumínio, vacina de meningite e de hepatite B” como placebo. Isso é falso, segundo o paper publicado pelo Instituto Butantan. Somente o hidróxido de alumínio foi realmente usado. Placebo é uma substância sem efeito no corpo, aplicada à metade dos voluntários de um teste clínico para se comparar com a outra metade que recebe o imunizante.

Pediatra com especialização em infectologia e diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações, Renato Kfouri explica que é comum utilizar componentes similares à vacina quando se deseja realizar um comparativo entre grupos. “Às vezes uma solução com hidróxido de alumínio serve para continuar escondendo se a pessoa está no grupo placebo. Então, substâncias inócuas são utilizadas sim”, disse.

Não há evidências sobre alumínio e Alzheimer

No vídeo, a médica alega que o uso de alumínio nas vacinas contra a covid-19 vai causar “aumento no número nos casos de demência”, incluindo de Alzheimer. No entanto, isso carece de embasamento científico. A Alzheimer’s Society, organização que atua em pesquisa e cuidado a pessoas com demência no Reino Unido, informa em seu site que “até o momento, nenhum estudo ou grupo de estudos confirmou que o alumínio esteja relacionado com o desenvolvimento da doença de Alzheimer”.

Também diz que o elemento está presente em um cérebro saudável e que, embora ele esteja nas placas amiloides (uma das principais características físicas deste tipo de demência), “ainda não foi estabelecida uma relação convincente entre a exposição a determinadas quantidades de alumínio no corpo e o desenvolvimento de Alzheimer”.

“O que é importante em todas as novas vacinas é o que a gente chama de farmacovigilância, que é continuar observando os efeitos”, diz Kfouri. Ele lembra que os casos adversos continuam sendo observados mesmo após a aplicação em massa, para identificar possíveis efeitos adversos muito raros. “Até o momento, a avaliação risco-benefício é boa. O número de vidas salvas com a prevenção de casos de covid-19 é considerado um benefício maior do que o risco de ter algum evento adverso raro.”

Quem é a médica cuja fala foi verificada?

Maria Emilia Gadelha Serra é médica otorrinolaringologista, com registro nº 63.451 no Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp). Em seu perfil no Instagram, ela se apresenta como presidente da Sociedade Brasileira de Ozonioterapia Médica. A prática é contestada pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), que em Resolução de 2018 a definiu como “procedimento de caráter experimental, cuja aplicação clínica não está liberada, devendo ocorrer apenas no ambiente de estudos científicos”.

Em seu Instagram, Serra tira de contexto dados sobre efeitos adversos de vacinas e faz postagens contrárias a uma eventual obrigatoriedade dos imunizantes. Também compartilha teoria da conspiração contra órgãos sanitários regulatórios dos Estados Unidos e contra a Organização Mundial da Saúde (OMS).

Procurada pelo Comprova, ela não se manifestou até a publicação desta reportagem.

POR QUE INVESTIGAMOS?

Em sua quarta fase, o Projeto Comprova checa conteúdos de redes sociais sobre políticas públicas do governo federal e sobre a pandemia que alcancem uma grande quantidade de visualizações, reações e compartilhamentos. A live completa já foi vista mais de 24 mil vezes no YouTube. O seu trecho recortado e compartilhado no TikTok – alvo dessa checagem – havia sido visualizado ao menos 135 mil vezes antes de ser deletado pela própria rede social.

Conteúdos imprecisos sobre vacinas diminuem a confiança da população nas autoridades sanitárias e enfraquecem os esforços de imunização que são a principal estratégia para controlar a pandemia e salvar vidas. O Projeto Comprova já mostrou que casos de celebridades vacinadas que se contaminaram – como Silvio Santos e Rodrigo Faro – não provam que os imunizantes seriam ineficazes. Também já comprovamos ser falso que as vacinas agravam a covid-19.

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Enganoso, para o Comprova, conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

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