A decisão do Comitê de Contingência da Covid-19 do governo paulista de recomendar o uso de máscaras em locais fechados foi uma medida correta, segundo infectologistas. Porém, para eles, as autoridades deveriam não apenas sugerir, mas obrigar o uso do item a fim de evitar a propagação do Sars-Cov-2.
Nas últimas semanas, foi observada uma tendência de crescimento de casos. Dados da plataforma SP Covid-19 Info Tracker, criada por pesquisadores da USP e da Unesp com apoio da Fapesp para acompanhar a evolução da pandemia, mostram que a média móvel de novas internações (UTI e enfermaria) aumentou 74% no estado de São Paulo em três semanas. Foram comparados os dias 6 e 27 de maio, quando as médias alcançaram 176 e 306, respectivamente.
O fim da obrigatoriedade do uso de máscaras em locais fechados foi anunciado pelo ex-governador João Doria (PSDB) em 17 de março. O item, no entanto, ainda é obrigatório no transporte público e em unidades de saúde.
O anúncio da volta da recomendação ocorreu nesta terça-feira (31). Em nota, o governo disse que a decisão ocorre após ter se "verificado um crescimento no número de casos e hospitalizações, sem crescimento de óbitos proporcional graças à ampla cobertura vacinal do Estado de São Paulo referência e líder mundial em vacinação".
Nesta quarta (1º), a Prefeitura de São Paulo seguiu as orientações do governo e também anunciou apenas a recomendação do uso do equipamento.
Diretora da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações), Monica Levi diz que a nova recomendação confunde as pessoas. "Infelizmente, temos um país dividido em como entender e enfrentar uma pandemia. Porém, o interesse coletivo tem que prevalecer em relação a opiniões individuais", afirma.
Para ela, é impossível realizar o controle de doenças infecto-contagiosas com base no bom senso. "É preciso que tenhamos diretrizes conforme os momentos da pandemia. É possível flexibilizar conforme as taxas baixas em lugares aberto, mas em fechados tem que ser obrigatório", disse Levi, que avalia que novas variantes têm elevado o número de casos e é preciso que "apertar medidas até que a Covid-19 se torne endêmica".
A médica cita ainda que, além da Covid, nesta época do ano em que são registradas baixas temperaturas e tempo seco é comum que seja registrado o aumento de síndromes respiratórias. Assim, a máscara teria a capacidade de evitar não apenas a propagação da Covid, como de gripe e outras doenças sazonais.
Médico e consultor da SBI (Sociedade Brasileira de Infectologia), Renato Grinbaum afirma que a decisão sobre a retirada de máscaras em locais fechadas foi prematura e "com embasamento científico precário". "Retornamos porque a pandemia não acabou", diz ele.
Grinbaum apoia o uso obrigatório das máscaras em locais fechados. "As autoridades não querem mais ser incisivas na pandemia e estão transferindo para os indivíduos decisões referentes à saúde pública."
Ele analisa que, apesar do aumento de número de casos, a situação epidemiológica não é tão grave quanto no ano passado. Porém, é necessário cuidado. "Falta também uma discussão do que fazer quando a pandemia acabar, como quais normas seguir e qual será o novo normal. Precisamos de uma transição não radical."
André Ricardo Ribas Freitas, professor de epidemiologia da Faculdade de Medicina São Leopoldo Mandic, concorda que o uso do equipamento de proteção em ambientes internos nunca deveria ter deixado de ser obrigatório.
"Ainda que essas medidas sejam tomadas agora, não me parece que serão impactantes porque não se trata de uma obrigatoriedade. As pessoas foram estimuladas a acreditar que a pandemia acabou, em decorrência da postura do estado, do governo federal e da falta da coordenação dessas ações", afirma ele.
Para Freitas, deve acontecer um aumento de casos de influenza. "A gente vai enfrentar nas próximas semanas um aumento dos casos de influenza e vírus sincicial, o que pode causar um estrangulamento no sistema."
"Por mais que não sejam casos muito graves, ainda temos uma quantidade de óbitos acima de média. Nós nos acostumamos a falar em centenas de mortes por Covid, mas isso não é normal", diz ele, que cita que há uma clara falta de coordenação unificada de estados.
O professor também analisa que a atual situação não chega aos níveis já vistos, como em momentos em que faltaram leitos de UTI e oxigênio. "Porém, temos sim uma sobrecarga nos prontos-socorros para doenças respiratórias e não estou vendo uma construção de uma rede capilar que consiga aumentar leitos como aconteceu em outros momentos."
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