RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) - O poeta e escritor carioca Antonio Cícero morreu nesta quarta-feira (23), em Zurique, na Suíça, aos 79 anos. Após ser diagnosticado com Alzheimer anos atrás, ele viajou à Europa com o companheiro, o figurinista Marcelo Fies, com a intenção de realizar a morte assistida, permitida no país europeu.
A morte assistida, também chamada de suicídio assistido, é o procedimento em que a própria pessoa realiza o processo que terminará em morte, diferentemente da eutanásia, quando o paciente é apenas agente passivo que recebe um medicamento letal, por exemplo. No Brasil, ambos procedimentos são proibidos.
Antonio Cicero, eleito para a Academia Brasileira de Letras (ABL) em 2017 — quando tomou posse da cadeira número 27 em 2018 — escreveu uma carta de despedida que, a seu pedido, foi distribuída a amigos por Marcelo Fies. Antes de enviá-la, ele mandou outra mensagem, em que anunciava as circunstâncias da morte do companheiro:
"Queridos amigos, venho com muita tristeza avisar que nosso amado Cicero acaba de falecer, hoje 23 de outubro de 2024, aos 79 anos. Estamos em Zurich na Suíça e viemos à associação Dignitas para o procedimento de eutanásia/suicídio assistido. Já faz um tempo que ele vinha planejando isso junto a eles, mandando documentos, etc. Ele insistiu muito que ninguém soubesse. Também fez questão de ser cremado. Fomos a Paris por uns dias nos despedir da cidade que ele tanto admirava".
Fies, criador do fardão trajado por Antonio Cicero em sua posse na Academia Brasileira de Letras, em 2017 (ele também assina os de Fernanda Montenegro e Gilberto Gil), repassou a carta em que o poeta se despede dos amigos. Leia a íntegra:
"Queridos amigos, Encontro-me na Suíça, prestes a praticar eutanásia. O que ocorre é que minha vida se tornou insuportável. Estou sofrendo de Alzheimer. Assim, não me lembro sequer de algumas coisas que ocorreram não apenas no passado remoto, mas mesmo de coisas que ocorreram ontem. Exceto os amigos mais íntimos, como vocês, não mais reconheço muitas pessoas que encontro na rua e com as quais já convivi. Não consigo mais escrever bons poemas nem bons ensaios de filosofia. Não consigo me concentrar nem mesmo para ler, que era a coisa de que eu mais gostava no mundo. Apesar de tudo isso, ainda estou lúcido bastante para reconhecer minha terrível situação. A convivência com vocês, meus amigos, era uma das coisas — senão a coisa — mais importante da minha vida. Hoje, do jeito em que me encontro, fico até com vergonha de reencontrá-los. Pois bem, como sou ateu desde a adolescência, tenho consciência de que quem decide se minha vida vale a pena ou não sou eu mesmo. Espero ter vivido com dignidade e espero morrer com dignidade. Eu os amo muito e lhes envio muitos beijos e abraços!"
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