BRASÍLIA, DF - Ministros do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tomaram posse nesta segunda-feira (2) e, assim como o petista fez na véspera, repetiram em seus discursos duras críticas à herança deixada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
No total, 16 ministros realizaram solenidades de transmissão de cargo nesta segunda. Os demais devem organizar cerimônias nos próximos dias. "Caos", "paralisia" e "desmonte" foram algumas das expressões usadas por parte dos novos ministros para se referir à gestão bolsonarista.
Logo pela manhã, o ministro da Casa Civil, Rui Costa (PT), afirmou não haver um diagnóstico certo de obras paradas no Brasil. Ele disse que isso reflete o caos deixado pelo governo Bolsonaro e que pretende tirar o país da "paralisia".
"As prioridades iniciais, evidente, serão de retomada do Brasil, sair deste momento de paralisia completa. Nem mesmo sabemos quantas obras no Brasil estão paralisadas. Cada um vem com um número, nem os ministérios [conseguem] contabilizar quantas obras temos paralisadas hoje. Isso é demonstração do caos que estamos recebendo", afirmou.
"O problema é nosso e vamos resolver logo no início as creches, escolas e postos de saúde porque o povo está precisando."
Alexandre Padilha (PT), que assumiu a Secretaria de Relações Institucionais, foi na mesma linha. Ele se referiu a Bolsonaro como o "presidente que fugiu" —o ex-mandatário se recusou a passar a faixa presidencial para Lula e passou a virada do ano nos Estados Unidos.
"Não existe alguém aqui que vai falar de metralhada contra a oposição. Essa época acabou. Nós queremos diálogo com partidos que compõem a base de governo e teremos diálogo e respeito com partidos que estão na oposição", disse Padilha, referindo-se ao episódio de 2018 em que Bolsonaro falou em "fuzilar a petralhada".
Padilha afirmou ainda que sua pasta terá a missão de "reabilitar o respeito institucional do país que foi desmontado" por Bolsonaro e disse que, no Palácio do Planalto, funcionava uma "máquina de fabricar guerras e conflitos todos os dias".
Flávio Dino (PSB), novo ministro da Justiça, fez um discurso com vários recados a bolsonaristas e manifestantes que atuam em atos antidemocráticos. Desde a derrota eleitoral de Bolsonaro para Lula, apoiadores do ex-presidente se concentraram em frente a quartéis para pedir um golpe militar.
Além disso, parte das pessoas acampadas em frente ao quartel-general do Exército em Brasília se envolveu em atos de violência, como o vandalismo registrado em Brasília em 12 de dezembro e a tentativa de explosão de um caminhão nas imediações do aeroporto internacional da capital.
Dino citou em seu pronunciamento os atos antidemocráticos de bolsonaristas, defendeu ponderação na atuação, mas sem "fechar os olhos em relação ao que aconteceu".
Nesse momento, o ministro da Justiça afirmou que atos terroristas e crimes contra o Estado democrático de Direito são "crimes políticos gravíssimos".
O titular da Justiça mencionou ainda a possibilidade de o caso de Marielle Franco, vereadora do PSOL assassinada no Rio de Janeiro em março de 2018, ser federalizado —algo, porém, que não depende só da vontade do novo governo.
A federalização dependeria de pedido da Procuradoria-Geral da República para o STJ (Superior Tribunal de Justiça).
"A Polícia Federal atuará para que esse crime seja desvendado definitivamente para saber quem matou Marielle e quem mandou matar Marielle Franco naquele dia no Rio de Janeiro", disse Dino.
À reportagem a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, irmã de Marielle, afirmou que, agora, avalia que a federalização do caso é uma boa ideia —a família da ex-vereadora vinha se posicionando contra a possibilidade.
Responsável pelo diálogo com movimentos sociais, o ministro da Secretaria-Geral, Márcio Macêdo (PT), criticou a falta de participação popular no governo Bolsonaro e afirmou que seu principal objetivo é "colocar a impressão digital do povo nas políticas públicas do governo".
Macêdo declarou que a gestão de Bolsonaro "destruiu conselhos e acabou com as conferências" e que "chegou a hora de deixar para trás o passado recente de ódio e intolerância que não faz bem a nenhuma democracia".
"Nosso primeiro grande desafio será recuperar os instrumentos e espaços públicos de participação popular no nosso governo. O último governo fechou a porta do palácio para o povo", disse.
Entre os ministros mais políticos, quem destoou e não usou a transmissão de cargo para criticar a gestão Bolsonaro foi José Múcio Monteiro (Defesa).
Ex-presidente do TCU (Tribunal de Contas da União), Múcio foi escolhido por Lula para, entre outros pontos, reduzir a resistência ao PT no meio militar, contornar o risco de insubordinação dos comandantes escolhidos por Bolsonaro e desarmar a situação nos acampamentos antidemocráticos.
Ele disse em seu pronunciamento que as Forças Armadas estão a serviço da democracia e evitou comentar assuntos sensíveis aos militares.
Depois, numa entrevista a jornalistas presentes, afirmou que as manifestações antidemocráticas em frente aos quartéis são "da democracia" e devem perder apoio aos poucos, sem repressão.
A rejeição de políticas de Bolsonaro foi uma das principais marcas dos discursos de Lula na cerimônia de posse, no domingo (1º). De um lado, o petista fez a promessa de governar para todos os brasileiros, não só para seus eleitores, e descartou revanchismo.
De outro, fez duras críticas à gestão Bolsonaro (usou palavras como "devastação", "desmonte" e "destruição") e atacou "a minoria violenta e antidemocrática" que "tentava censurar nossas cores e se apropriar do verde-amarelo".
Lula também disse que não abrirá mão de responsabilizações: "Não carregamos nenhum ânimo de revanche contra os que tentaram subjugar a nação a seus desígnios pessoais e ideológicos, mas vamos garantir o primado da lei. Quem errou responderá por seus erros, com direito amplo de defesa, dentro do devido processo legal".
Em seu segundo discurso, no parlatório, apoiadores do petista gritaram "sem anistia" após Lula ler trecho de um relatório produzido pela equipe de transição com um diagnóstico do país sob Bolsonaro.
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