> >
MPF alerta para "retrocesso" e "quadro de violações" na política indigenista

MPF alerta para "retrocesso" e "quadro de violações" na política indigenista

A nota aponta medidas do governo Bolsonaro que resultaram na redução da força de trabalho da Funai e desvirtuamento da autarquia de sua missão institucional, de proteção dos povos

Publicado em 19 de abril de 2021 às 14:42

Ícone - Tempo de Leitura min de leitura
Presidente Jair Bolsonaro conversa com Indios Makuxi da Raposa Serra do Sol ao sair do Palácio da Alvorada
Presidente Jair Bolsonaro conversa com Indios Makuxi da Raposa Serra do Sol ao sair do Palácio da Alvorada. (Antonio Cruz/ Agência Brasil)

A Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do Ministério Público Federal divulgou nesta segunda-feira (19) , nota em que faz um alerta para 'cenário de retrocessos' na política indigenista do Estado brasileiro. "A omissão na concretização da demarcação de terras indígenas, a desestruturação da Fundação Nacional do Índio e a não adoção de políticas públicas em tempos de pandemia compõem um quadro de violações sem precedentes na atual ordem constitucional", diz a Procuradoria.

A nota pública aponta medidas do governo Jair Bolsonaro que resultaram na redução da força de trabalho da Funai e desvirtuamento da autarquia de sua missão institucional, de proteção dos povos originários.

Além disso, no bojo dos 'retrocessos', a Procuradoria cita ações do governo federal no combate à pandemia da covid-19, como o veto do presidente a projeto de lei que estabeleceu o Plano Emergencial para Enfrentamento à covid-19 nos territórios indígenas - caso que motivou notícia-crime em trâmite do Supremo Tribunal Federal.

"A 6ª Câmara de Coordenação e Revisão espera que os povos indígenas não mais experimentem qualquer supressão de direitos no ciclo vindouro, reafirmando sua vigilância em favor dos povos originários", registra o MPF ao fazer o balanço da política indigenista no País entre abril de 2020 e abril de 2021.

FUNAI 

A Procuradoria abre a nota relembrando a edição da Medida Provisória 870/2019, no primeiro dia do governo Bolsonaro, que 'procurava esvaziar as atribuições do órgão indigenista e submeter a temática a outros interesses, notadamente os da pasta da agricultura'. A proposta acabou sendo rejeitada Congresso Nacional, mas isso 'não impediu o enfraquecimento da autarquia e de suas atribuições, o que se dá de forma cotidiana e mediante alguns sucessivos atos', diz a Procuradoria.

O primeiro ato citado pelo MPF é a Instrução Normativa 09 da Funai, editada em abril de 2020, para determinar a exclusão da base de dados do Sistema de Gestão Fundiária nacional de todas as terras indígenas não regularizadas. Segundo a Procuradoria, na prática, a instrução permite o reconhecimento de propriedades privadas em áreas reivindicadas por indígenas ou em processo de demarcação. O Ministério Público Federal já propôs 26 ações judiciais contra tal medida, com 19 decisões favoráveis até o momento.

Outro exemplo de retrocesso, segundo a 6ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF, é a Resolução 04/21, publicada pela Funai em janeiro deste ano. A norma restringe a autodeclaração e estabelece novos critérios para a heteroidentificação de indígenas, limitando o acesso a políticas públicas específicas para esses povos, inclusive na área de saúde, diz a Procuradoria

A nota alerta ainda para a Instrução Normativa Conjunta 01/21, editada em fevereiro pela autarquia indígena e o Ibama. "Sob o pretexto de regulamentar o processo de licenciamento ambiental de empreendimentos ou atividades realizadas no interior de terras indígenas, 'o ato busca institucionalizar o arrendamento rural nos territórios indígenas'", ressalta o MPF.

PANDEMIA 

No âmbito da pandemia da covid-19, a Procuradoria chama atenção para o veto do presidente Jair Bolsonaro a dispositivos do Projeto de Lei 1.142/2020, que estabeleceu o Plano Emergencial para Enfrentamento à covid-19 nos territórios indígenas.

O governo barrou trechos que previam o acesso das aldeias a água potável, materiais de higiene, leitos hospitalares e respiradores mecânicos. Por outro lado, manteve o item que autoriza a permanência de missões religiosas nos territórios indígenas, inclusive naqueles em que há presença ou registro de povos de recente contato ou em isolamento voluntário.

A nota menciona ainda a 'resistência' do governo federal em implementar atendimento e vacinação prioritária aos indígenas que vivem em contexto urbano ou em territórios não formalmente demarcados.

"Neste Abril de 2021 completa-se um ciclo que já dura três anos sem que nenhuma terra indígena tenha sido delimitada, demarcada ou homologada no país, aprofundando o déficit demarcatório e agravando o quadro de invasões e explorações ilegais desses territórios", lembra ainda a Procuradoria.

CONGRESSO E STF

Em contraponto aos retrocessos do governo federal, a Procuradoria cita medidas do Congresso Nacional e o Poder Judiciário 'para evitar o agravamento do quadro de disruptura institucional da política indigenista'.

No caso do legislativo, a Procuradoria ressalta a derrubada do veto presidencial parcial ao Plano Emergencial para Enfrentamento à Covid-19 nos territórios indígenas e a não conversão em lei da Medida Provisória no 910/2019, que se propunha a anistiar a ocupação e o desmatamento de vastas extensões de terras públicas, inclusive em territórios indígenas não definitivamente demarcados.

No âmbito da Justiça, o documento lista decisões do Supremo Tribunal Federal: a paralisação dos processos que pleiteiam reintegração de posse em áreas indígenas; a determinação ao governo federal para adoção de medidas urgentes para conter a covid-19 em territórios indígenas; a suspensão dos efeitos da Resolução 04/21 da Funai; e a admissão da ação rescisória que busca anular a decisão que não reconheceu o direito territorial do povo Guarani Kaiowá à TI Guyraroká, com base na tese do marco temporal.

Este vídeo pode te interessar

Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem

Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta

A Gazeta integra o

The Trust Project
Saiba mais