O Brasil registrou 648 casos de feminicídio no primeiro semestre de 2020, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública. O índice representa aumento de 1,9% em relação aos seis primeiros meses de 2019. O comportamento de outros indicadores de violência contra as mulheres aponta, ainda, que a quarentena e a falta de políticas públicas podem ter dificultado que as vítimas buscassem socorro.
Segundo o relatório, as chamadas por violência doméstica para o 190, número que aciona a Polícia Militar, subiram 3,8% no período. Em contrapartida, exceto pelos homicídios, todos os crimes motivados por questão de gênero sofreram queda de registro nas delegacias - o que leva pesquisadores a crer que, em vez de representar uma melhora do cenário, na verdade a pandemia de coronavírus teria dificultado ainda mais o combate a esse tipo de crime no país.
Entre janeiro e junho, o Fórum identificou recuo nas notificações de lesão corporal dolosa (de 122,9 mil para 110,8 mil), ameaças (de 282,9 mil para 238,1 mil), estupros (de 9,6 mil para 7,4 mil) e estupros de vulneráveis (de 18,9 mil para 14,7 mil). De acordo com o Anuário, são casos em que o registro da ocorrência depende de a mulher ir até a delegacia, ao contrário do que ocorre quando há um assassinato.
"Como a maior parte dos crimes cometidos contra as mulheres no âmbito doméstico exige a presença da vítima para a instauração de um inquérito, as denúncias começaram a cair na quarentena, em função das medidas que exigem o distanciamento social e da maior permanência em casa", diz o texto de Amanda Pimentel e Juliana Martins, pesquisadoras do Fórum. "Além disso, a presença mais intensa do agressor nos lares constrange a mulher a realizar uma ligação telefônica ou mesmo de dirigir-se às autoridades competentes para comunicar o ocorrido."
O estudo indica, ainda, que o Brasil deixou de seguir exemplos internacionais na criação de alternativas mais eficazes para acolher as vítimas. Enquanto o governo esteve focado na expansão de canais de denúncias, campanhas e recomendações gerais, países como França, Espanha, Itália, por exemplo, transformaram quartos de hotéis em abrigos temporários para mulheres em situação de violência.
Já os dados consolidados de 2019 apontam que os feminicídios registraram alta de 7,1% no Brasil, com um total de 1.326 ocorrências, o equivalente a mais de três casos por dia. Os pesquisadores alertam que a escalada de casos vista a partir de 2015 pode estar relacionada tanto com melhorias na forma como os Estados notificam o crime, quanto ao aumento, de fato, do fenômeno.
Das vítimas, 66,6% eram negras e 56,2% tinham entre 20 e 39 anos (ou seja, mulheres em idade reprodutiva), ao contrário dos homicídios comuns. Outro elemento que destoa é o objeto usado no crime. Enquanto nos assassinatos em geral há prevalência de arma de fogo, 53,6% dos feminicídios foram cometidos com armas brancas. Em 90% dos casos, o autor é um companheiro ou ex-companheiro da vítima.
No ano passado, o país registrou ainda um total de 66.123 boletins de ocorrência de estupro, ou 1% a menos do que em 2018. Na prática, o indicador representa um caso a cada oito minutos. Segundo o relatório, a maioria das vítimas é do sexo feminino (85,7%) e tem no máximo 13 anos (57,9%). Em três a cada dez casos no país, a criança não chegou a completar 10 anos.
Em números absolutos, a maior parte das ocorrência de estupro foi notificada em São Paulo, com 12,3 mil registros feitos. Já proporcionalmente Mato Grosso do Sul continua com o pior resultado do país, apresentando taxa de 83,1 casos por 100 mil habitantes. Em relação à autoria, o Fórum verificou que em 84% das vezes o autor era conhecido da vítima.
Como o Estadão mostrou ontem, após o Brasil ter registrado em 2019 a menor taxa de homicídios da década, o número de assassinatos voltou a subir neste primeiro semestre. Entre janeiro e junho, o país relatou 25.712 mortes violentas, ou 7,1% a mais.
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