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Na Flip, Clóvis Rossi relembrou cinco décadas de jornalismo

Na Flip, Clóvis Rossi relembrou cinco décadas de jornalismo

Clovis Rossi morreu na madrugada desta sexta-feira (14) aos 76 anos, em São Paulo

Publicado em 14 de junho de 2019 às 14:24

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Morre aos 76 anos o jornalista Clóvis Rossi. (Reprodução/TV Globo)

O jornalista Clovis Rossi, que morreu na madrugada desta sexta-feira (14) aos 76 anos em São Paulo, relembrou os fatos mais relevantes de sua carreira em uma mesa da Flip (Feira Literária Internacional de Paraty) em 2014.

Na ocasião, ele conversou com os participantes da feira na Casa Folha, com mediação do atual diretor de Redação da Folha de S.Paulo, Sérgio Dávila.

Rossi morreu em casa, onde se recuperava de infarto tido na semana passada. Deixa mulher, com quem estava havia mais de meio século, três filhos e três netos.

Clóvis Rossi queria ser diplomata, mas tinha que esperar os 21 anos de idade para entrar na carreira. Para matar o tempo e esticar a mesada do pai por mais uns anos, prestou jornalismo, o "curso mais fácil de entrar". Começou a trabalhar, foi ficando, ficando, e ficou por 51 anos -34 deles na Folha de S.Paulo.

Na última conversa realizada na Casa Folha na 12ª edição da Flip, mediada pelo editor-executivo da Folha de S.Paulo, Sérgio Dávila, neste sábado (2), Rossi relembrou suas mais de cinco décadas no jornalismo, comentando algumas de suas coberturas mais importantes, recheadas de casos saborosos.

Por coincidência, sua primeira reportagem publicada no jornal "Correio da Manhã" era sobre a pintora Djanira, de Paraty, citada em reportagem de capa da edição deste sábado da "Ilustrada". "Como não sou místico, não sei que sinal é esse", brincou antes de contar os bastidores do texto, escrito pouco mais de um mês após o Golpe de 1964.

Para a reportagem, Rossi foi a Paraty entrevistar Djanira, que havia sido presa um mês após o Golpe e libertada em seguida. Escrito o texto, Rossi precisou ditá-lo por telefone a um datilógrafo na Redação do jornal.

Havia, contudo, um detalhe: a casa em que estava não tinha luz. O jornalista se aproximou de uma janela para tentar ler seus "garranchos", atraindo uma multidão na rua, que o ouvia recitar palavras polêmicas como tortura e ditadura. Até dois policiais militares passaram por lá, mas Rossi continuou ditando.

Gastar a sola do sapato indo à rua lhe parece melhor do que ocupar postos de chefia na Redação. "A graça verdadeira da profissão é estar na rua. O que me atrai mais no jornalismo é a possibilidade de ser testemunha ocular da história."

Nesses 51 anos, Rossi acumulou grandes coberturas, dividindo com o público os bastidores de algumas delas. No Oriente Médio, em 1994, por exemplo, conheceu Yasser Arafat, líder da Autoridade Palestina, acompanhado pelo rabino Henry Sobel.

"O pessoal da comitiva palestina nos recebeu em Gaza e disseram para o Sobel manter o quipá. Estávamos nós com um rabino em plena Gaza usando um quipá. Visto o que está acontecendo parece que estou mentindo", contou. "No final da conversa, o maluco do Sobel sugeriu que o Arafat rezasse um salmo com ele. Foi uma coisa de cinema, inimaginável hoje em dia."

Com a cobertura da Revolução dos Cravos, em Portugal, em 1974, disse ter aprendido a ser mais responsável. "Viajei para cobrir uma revolução com um buraco de 150 anos no meu conhecimento sobre Portugal. Cheguei completamente despreparado." Por sorte, estava hospedado em frente a um jornal. Bateu à porta e pediu para lhe darem uma aula de história. Deu certo.

Os textos sobre o fim do franquismo espanhol, por outro lado, o orgulham. "Raramente gosto do que faço. Sempre acho que a próxima reportagem vai ser melhor. Exceto nessa cobertura", falou. O resultado foi fruto de seis meses de preparo e entrevistas.

Rossi também comentou a política atual. Questionado sobre o que achava de o Brasil ter sido chamado de "anão diplomático" pelo governo israelense, respondeu: "Não acho que isso seja verdade por causa desse episódio. Mas o país está ausente da cena internacional".

"A gestão Lula colocou o Brasil no mundo e a Dilma o tirou de novo. O país se absteve da situação da Ucrânia, por exemplo. Não ter posição é a pior coisa que pode acontecer", afirmou.

Contou também que Dilma, apesar de lhe tratar "até carinhosamente", não rende notícias quando entrevistada, diferentemente de Lula e Fernando Henrique Cardoso. "Cinquenta e um anos correndo atrás da notícia te cobram um preço, que é julgar as pessoas públicas pelo que elas te oferecem de reportagem."

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Um membro do público quis saber sobre como é possível descobrir se uma reportagem é confiável. "A reportagem é a melhor versão possível da verdade que se pode ter. Os jornalistas nem sempre são testemunhas oculares. Planos econômicos não são discutidos em praça pública, por exemplo. A reportagem é um trabalho de reconstrução da verdade."

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