Conteúdo investigado: Tuíte dizendo que os Amish “rejeitaram vacinas, bloqueios e máscaras da covid” e que teriam sofrido “30 vezes menos mortes” pela doença acompanha link para site desinformativo com o mesmo conteúdo.
Onde foi publicado: Twitter e site.
Conclusão do Comprova: Não há indícios de que comunidades Amish tenham tido “30 vezes menos” mortes por covid-19 do que o restante da população por não seguir as recomendações das autoridades sanitárias, como o distanciamento social, o uso de máscara e a vacinação contra a doença.
As comunidades Amish são avessas à vacinação e também à tecnologia de forma geral, o que significa que foram menos testadas para a doença. Por conta disso, não há dados conclusivos a respeito da pandemia entre integrantes desse grupo. Contudo, estudo do Center for Disease Control and Prevention (CDC) dos Estados Unidos confirmou que o vírus chegou e se espalhou nessa população, deixando pessoas doentes.
Como não existem dados de mortalidade por covid-19 agregados por grupo religioso, não há como saber exatamente quantos Amish morreram nos Estados Unidos. Um estudo feito com base em obituários publicados na imprensa, no entanto, indica que a mortalidade em algumas comunidades desse tipo seguiu a mesma tendência que o resto do país.
Embora não tenham procurado a vacina, reportagens publicadas na imprensa tradicional mostram que, no período mais crítico da pandemia, os Amish seguiram outras medidas de prevenção, como o distanciamento social.
Além disso, o post, aqui analisado, fala que os Amish teriam registrado 30 vezes menos mortes por covid-19 do que o resto dos Estados Unidos. No entanto, há um problema matemático nesta construção, uma vez que um objeto uma vez menor do que ele próprio já significa zero.
Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.
Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 5 de junho, o tuíte analisado já tinha mais de 112 mil visualizações, 6 mil curtidas e 1,8 mil compartilhamentos.
Como verificamos: O primeiro passo foi pesquisar por notícias relacionadas aos Amish e à pandemia de covid-19. O site do CDC também foi consultado para saber se existiam dados específicos sobre os Amish e o coronavírus. Por fim, a autora do tuíte e o site Tribuna Nacional foram procurados.
Os Amish são um grupo cristão que busca viver isolado da sociedade moderna. A ideia é recriar o modo de vida do século 17, quando a Igreja Menonita foi criada pelo suíço Jakob Amman. Dessa forma, eles evitam o uso de tecnologias, inclusive de smartphones, televisões e carros. Os Amish vivem, principalmente, em comunidades isoladas nos Estados Unidos e no Canadá.
Estima-se que haja cerca de 360 mil pessoas vivendo em comunidades Amish nos Estados Unidos, a maior parte está nos estados da Pensilvânia, Ohio e Indiana.
Não há dados estatísticos oficiais sobre casos e mortes por covid-19 em comunidades religiosas. Da mesma forma, não há dados oficiais sobre a vacinação desses grupos.
Mas, de acordo com um estudo feito pelo Departamento de Sociologia e Antropologia da Universidade de West Virgínia, revisado por pares e publicado na revista Journal of Religion and Health, mortes nas comunidades Amish por covid-19 seguiram as mesmas tendências que o resto dos Estados Unidos. Os pesquisadores apontam que, como os grupos Amish são avessos à tecnologia, a tendência é que eles tenham sido menos testados para a covid-19. No entanto, usando obituários publicados em jornais, o estudo foi capaz de detectar um aumento de 125% no número médio de mortes entre os Amish durante a pandemia. A tendência é similar à do resto dos Estados Unidos.
Em maio de 2022, a Al-Jazeera fez uma matéria sobre uma comunidade Amish que fica em Ohio. De acordo com a reportagem, as autoridades do distrito de saúde do condado de Holmes se recusaram a falar com a publicação, porém, o número total de mortes relatadas em 2020 e 2021 no condado aumentou quase um terço em comparação com 2019. Segundo a matéria, como em outras comunidades, esse aumento provavelmente é atribuído ao covid-19.
Já de acordo com matéria de junho de 2021 da Associated Press, durante os primeiros meses da pandemia, os Amish seguiram as diretrizes de distanciamento social e pararam de se reunir em igrejas e funerais.
Ainda segundo o mesmo texto, em 2021, os casos caíram. “Contar com a possível imunidade coletiva quando poucos testes foram realizados entre os Amish é arriscado”, disse Esther Chernak, diretora do Centro de Prontidão e Comunicação em Saúde Pública da Universidade Drexel, na Filadélfia.
No entanto, a comunidade enfrenta resistência para se vacinar contra a doença. A maioria diz que já teve o vírus e não vê necessidade de ser vacinado, disse Mark Raber, que é Amish e membro de um assentamento no condado de Daviess, Indiana, que tem uma das taxas de vacinação mais baixas do estado.
Em abril de 2020, uma pesquisa foi feita avaliando padrões e crenças de vacinação em famílias Amish. O questionário foi enviado a 1 mil famílias Amish.
A taxa de resposta foi de 39%. Entre 391 entrevistados, 59% não vacinaram seus filhos. Os amish ultraconservadores rejeitaram as vacinas com mais frequência. Pesquisa feita uma década antes na mesma comunidade havia revelado que 14% recusavam todas as vacinas.
A pesquisa feita em 2020 também constatou que crianças Amish com alguma deficiência eram mais propensas a receber vacinas do que crianças Amish sem deficiência. Entre os entrevistados, 75% responderam que rejeitariam uma vacina covid-19. O medo de efeitos adversos foi o motivo mais comum para a rejeição.
Famílias que aceitavam vacinas eram mais propensas a citar um profissional de saúde como a principal influência para se vacinar. As esposas eram mais propensas a citar o cônjuge como a principal razão para se imunizar.
De acordo com dados atuais do CDC, 65% da população de Ohio, onde essa comunidade Amish está, recebeu pelo menos uma dose da vacina contra a covid-19 e 60% se vacinou com duas doses.
De acordo com a OMS, é preferível se vacinar contra a covid-19 do que se infectar com a doença. Isso porque “as vacinas constroem imunidade sem os efeitos prejudiciais que a doença pode ter, incluindo os efeitos a longo prazo e a morte. Permitir que a doença se propague poderia causar milhões de mortes e ainda mais pessoas vivendo com os efeitos a longo prazo do vírus”.
Segundo a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), nas quatro semanas após a infecção, entre 90% e 99% dos indivíduos infectados pelo vírus SARS-CoV-2 desenvolvem anticorpos neutralizantes detectáveis. No entanto, a duração desta resposta imune pode variar de três meses a cinco anos, ou seja, há possibilidade de reinfecção ou de o paciente contrair outra cepa do vírus contra a qual ainda não desenvolveu imunidade.
O que diz o responsável pela publicação: A autora do tuíte foi procurada por mensagem privada e o site Tribuna Nacional por e-mail. Nenhum dos dois respondeu até a publicação dessa verificação.
O que podemos aprender com esta verificação: Conteúdos como este visam descredibilizar governos, organizações de saúde pública e pesquisadores insinuando que os esforços de prevenção contra a covid-19 e de imunização teriam sido em vão, o que não é verdade.
Neste caso, busca-se utilizar um dado inventado (“30 vezes menos mortes”) de uma população isolada e sobre a qual não se tem muita informação (os Amish) para dar ar de legitimidade ao argumento de que teria havido um “pânico fabricado” a respeito da pandemia. Como em muitas outras teorias conspiracionistas, essa suposta trama enganosa seria promovida por empresas farmacêuticas e governantes para controlar a população.
Ao se deparar com conteúdos suspeitos sobre a pandemia ou sobre vacinação de modo geral, é importante conferir a veracidade das afirmações junto aos órgãos sanitários e de Saúde, como a OMS, a Opas e o Ministério da Saúde.
Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.
Outras checagens sobre o tema: O Comprova já checou diversas informações falsas ou enganosas a respeito da covid-19 e das vacinas utilizadas para combater o vírus. Já foi comprovado que a pandemia não foi inventada, que expor a população ao risco de contrair o vírus não é melhor do que promover a vacinação, que o FBI não confirmou a origem do coronavírus e que o Parlamento Europeu não classificou os imunizantes contra a covid-19 como armas biológicas.
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