Os ativistas ligados ao meio ambiente perderam a queda de braço travada contra proprietários rurais na definição das últimas regras do Código Florestal. O Supremo Tribunal Federal (STF) manteve ontem a anistia a punições, como multas, por desmatamentos ilegais cometidos antes de 2008, desde que os infratores se cadastrem em programas de regularização ambiental.
De acordo com a maioria dos ministros da Corte, o artigo do Código Florestal não trata de anistia, mas apenas da substituição da punição pela recuperação do bioma atingido. No entanto, os ambientalistas consideram que a decisão foi injusta para os produtores rurais que cumpriram à risca as regras contra o desmatamento estabelecidas antes da nova lei.
O setor agropecuário também foi vitorioso em outros pontos controversos do código. Foi aprovada a redução das reservas legais de 80% para 50% em municípios onde existem terras indígenas ou unidades de conservação, o que permitirá o avanço do desmatamento. A Corte também liberou as atividades agrícolas em encostas com mais de 45 graus e topos de morros, áreas suscetíveis a enxurradas e deslizamentos.
O ministro Celso de Mello, o único a votar na sessão de ontem, considerou que o direito ao meio ambiente é coletivo e deve ser assegurado à sociedade. Para ele, a anistia estimula quem praticou delitos ambientais a resolver a situação.
O direito à integridade do meio ambiente constitui prerrogativa jurídica de titularidade coletiva afirmou.
O decano da Corte e os ministros Rosa Weber, Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Alexandre de Moraes e Cármen Lúcia entenderam que a lei não concede anistia ampla, mas prevê maneiras de compensar o meio ambiente pelo desmatamento. Votaram contra a anistia os ministros Luiz Fux, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Marco Aurélio Mello e Ricardo Lewandowski.
MENSAGEM DE IMPUNIDADE
Coordenador do Sistema de Estimativa de Emissões de Gases de Efeito do Observatório do Clima, Tasso Azevedo considera que a decisão do STF simbolizou uma perda de oportunidade para pôr a legislação ambiental nos trilhos.
Consolidou-se a imagem de que o Brasil é o país da impunidade: quem segue a regra é frouxo lamenta. O que estava em jogo é o interesse coletivo, já que a produção agrícola nunca foi ameaçada pelo Código Florestal. Na verdade, seu rendimento depende da manutenção da área verde, que garante o ciclo da chuva e as condições climáticas ideais.
Nurit Bensusan, assessora do Programa de Políticas e Direitos Socioambientais do Instituto Socioambiental, avalia que os ruralistas obtiveram uma vitória a curtíssimo prazo:
Não se deve comemorar o resultado da votação. Foi um tiro pela culatra. A agricultura depende de uma série de serviços ambientais, e que agora precisarão ser substituídos por tecnologias caras: modos para combater pragas e doenças, conter a erosão do solo e manter a disponibilidade de água.
Segundo Nurit, se a anistia não fosse aprovada, o território que estaria sujeito à recomposição teria uma área equivalente à Alemanha.
Rodrigo Justus, assessor técnico sênior da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), assegura que proprietários rurais que adotam técnicas sustentáveis não precisam se preocupar.
Não existe base científica para dizer que vai acabar a água. Nós somos referência na utilização do solo assinala. A decisão do STF acabou com o período de insegurança jurídica que acompanhou a criação do Código Florestal. Hoje, com o Cadastro Ambiental Rural, o produtor que promover irregularidades será multado imediatamente, não poderá comercializar, e o controle do desmatamento pode ser feito em tempo real, inclusive pelo governo e pelas ONGs.
No ano passado, quando votou, Fux afirmou que até 2012, quando o Código Florestal foi editado, o desmatamento no Brasil vinha caindo. A partir daquele ano, porém, os índices aumentaram:
Certamente a anistia das infrações cometidas até 22 de julho de 2008 pode ser apontada como uma das possíveis causas para esse aumento. Ao perdoar infrações administrativas e crimes ambientais pretéritos, o Código Florestal sinalizou uma despreocupação do Estado para com o direito ambiental.
Roberta del Giudice, secretária-executiva do Observatório Florestal, conta que as normas ambientais do país são mudadas desde a capitania hereditária. Embora lamente o resultado da votação do STF, destaca que a missão, agora, é lutar pela aplicação do código, mesmo diante de suas imperfeições:
Não se alcançou a proteção ideal, mas essa foi a possível, considerando o atual momento político do Brasil. Agora precisamos torcer para que tudo dê certo, e essa será a primeira lei florestal da História do país.
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