O Supremo Tribunal Federal (STF) prevê iniciar nesta quarta-feira (7) a análise de quatro ações que questionam a constitucionalidade das chamadas emendas de relator, o Orçamento secreto, sob dúvidas de que o julgamento será concluído ainda neste ano.
Há também o receio de petistas de que eventual decisão do Supremo contra as emendas prejudique a relação dos aliados do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).
O uso dessas emendas, um instrumento usado como moeda de troca nas negociações políticas entre Planalto e Congresso, foi questionado ao Supremo por Cidadania, PSB, PSOL e PV.
Em tese, o Supremo só tem mais três sessões de julgamento ainda neste ano - na quarta e, depois, apenas nos dias 14 e 15. O recesso do Judiciário se inicia no próximo dia 20.
A ministra Rosa Weber, que além de presidente da corte é relatora das ações, pautou os casos para avaliação do Supremo apenas na última semana. Ainda assim, há outras questões a serem discutidas antes do início da análise das emendas de relator.
Internamente, ministros do STF e seus interlocutores consultados pela Folha acham que as sessões restantes são suficientes para que os processos sejam julgados.
Uma das tendências possíveis é que o STF entenda que o instrumento é legal, mas que imponha limitações a ele por exemplo, que determine que haja mais transparência e menos direcionamento político aos recursos.
Atualmente, as emendas de relator são conhecidas pela pouca ou nenhuma publicidade de qual o parlamentar que as indicou e por ser usada para irrigar obras e projetos de interesses de deputados e senadores em véspera de votações que interessam ao Executivo.
Não será surpresa, porém, que um dos ministros peça vista (mais tempo para análise) e suspenda o julgamento por tempo indeterminado.
Isso porque parte dos integrantes do Supremo e advogados que atuam em causas na corte têm manifestado incômodo com a pouca antecedência com que Rosa Weber tem divulgado a pauta dos julgamentos.
Nos últimos anos, os presidentes do STF vinham pautando a maioria das ações com meses de antecipação.
Esse pouco tempo para análise dos processos e elaboração dos votos pode ser usado como justificativa para um eventual pedido de vista.
No PT, aliados de Lula se dividem sobre qual seria o melhor cenário para o futuro dessas emendas.
Uma ala tem receio de que eventual decisão do Supremo contra as emendas possa implodir a aproximação do governo eleito com Arthur Lira.
A cúpula do Congresso controla a divisão da verba das emendas, que são usadas por deputados e senadores para o envio de dinheiro para obras e projetos em suas bases eleitorais.
Se o STF declarar o fim das emendas de relator, o petista pode ser já cobrado por uma solução que mantenha o poder do centrão sobre o Orçamento.
Outro grupo de aliados de Lula sustenta que o melhor cenário para o novo governo seria o Supremo enterrar as emendas de relator, devolvendo ao Executivo o poder sobre essa fatia do Orçamento. Ou seja, fortalecendo os ministérios de Lula.
Apesar das diferentes avaliações, auxiliares do petista e interlocutores dele com o STF afirmam que não há planos de o governo eleito tentar influenciar no julgamento. Isso poderia azedar a relação com o Congresso num momento em que Lula ainda tenta construir uma base governista.
Parlamentares próximos ao presidente eleito já sinalizaram à cúpula da Câmara e do Senado que há brecha para o diálogo sobre esse tema, já que programas de interesse do PT na área de habitação e saúde, por exemplo, realizam obras que podem atender a demandas das bases eleitorais dos parlamentares.
Integrantes do Judiciário têm conversado com a cúpula do Congresso para tentar pacificar o assunto. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD), defende nos bastidores que as emendas de relator sejam distribuídas após comum acordo entre o Executivo e o Congresso. Assim, as emendas podem ser usadas como instrumento de "Estado".
Durante a campanha, Lula já falou que a emenda de relator era a "maior bandidagem já feita em 200 anos" e que o Parlamento nunca "esteve tão deformado como está agora" chamou inclusive de pior Congresso da história do Brasil.
O petista também disse que há um excesso de poder nas mãos de Lira. No entanto, o tom do partido e do presidente eleito mudou após o resultado das urnas.
A principal crítica do partido agora tem sido a questão da transparência. Por esse motivo, Rosa Weber chegou a suspender a liberação dessas emendas no ano passado.
Como resposta, o Congresso criou um sistema para divulgar informações sobre o destino e beneficiários das emendas.
No entanto, parlamentares próximos à cúpula do Legislativo têm usado uma brecha nas regras para destinar emendas às suas bases eleitorais sem revelar o padrinho político do recurso. Para isso, elas são registradas por um usuário externo, que pode ser qualquer pessoa.
Quase 1/3 da verba já negociada em emendas de relator e divulgada até hoje atende a solicitações que não foram apresentadas por deputados e senadores. Mas a divisão desses recursos continuou privilegiando aliados políticos do Palácio do Planalto.
Dos R$ 16,5 bilhões disponíveis para essas emendas neste ano, o Congresso divulgou o destino de R$ 12 bilhões.
Contudo, pessoas envolvidas nas negociações dizem que mais emendas já foram prometidas a parlamentares e, com isso, o ministério responsável pela obra já foi informado mas a divulgação do beneficiário será feita apenas no fim do ano.
As três primeiras ações contra as emendas de relator foram apresentadas em 2021 por PSB, PSOL e Cidadania, e questionavam o uso dos recursos em tratativas do governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) com o Congresso.
A quarta ação, do PV, foi apresentada em setembro de 2022, e reforçava os argumentos anteriores.
A ação do PSOL é a mais ampla. O partido afirma que as emendas de relator em si são inconstitucionais porque permitiram "o uso da execução orçamentária como instrumento de barganha e troca de apoio político".
A possibilidade de pedido de vista é apontada como benéfica por integrantes da equipe de Lula, pois evitaria um eventual impacto nas articulações para aprovar a PEC da Transição.
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