A pandemia do novo coronavírus paralisou indústrias, reduziu significativamente o uso automóveis e interrompeu a maior parte das rotas de aviação comercial no mundo. Com isso, as emissões globais de gases de efeito estufa entraram em queda vertiginosa e devem encerrar 2020 com a maior redução da série histórica.
Estimativas da OMM (Organização Meteorológica Mundial) apontam que a diminuição pode chegar a 6% em relação a 2019.
Um estudo publicado pela ONG Climate Action Tracker estima que as emissões de CO2 das atividades industriais e da queima de combustíveis fósseis fiquem entre 4% e 11% abaixo das de 2019. Possivelmente, as emissões continuarão diminuindo, embora em escala menor, também em 2021.
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O resultado, porém, não é visto com entusiasmo por especialistas, que temem uma espécie de "efeito rebote" nas emissões caso a retomada econômica mundial não seja pautada também pelo objetivo de redução global previsto pelo Acordo de Paris, assinado em 2015.
"Essa queda prevista de 6% nas emissões, infelizmente, é uma boa notícia apenas no curto prazo", afirmou o secretário-geral da Organização Meteorológica Mundial, Petteri Taalas.
Os últimos dados sobre as emissões mundiais, divulgados em abril, não foram animadores e mostraram uma tendência de alta. Em 2019, a quantidade de gases-estufa emitidos bateu um novo recorde. Entre 2015 e 2019, a quantidade de dióxido de carbono emitido foi 18% maior do que nos cinco anos anteriores.
A Covid-19 já provocou o adiamento para 2021 da próxima convenção internacional do clima da ONU. A COP-26, que reúne negociadores de alto nível de todo o mundo, estava prevista para acontecer em Glasgow, na Escócia, em novembro deste ano.
Em todo o planeta, dezenas de reuniões preparatórias e encontros de especialistas também foram afetados, o que coloca em xeque também a articulação da comunidade internacional.
Em mensagem divulgada nesta semana, o secretário-geral da ONU, o português António Guterres, cobrou comprometimento das nações para limitar o aquecimento global.
"A pandemia da Covid-19 expôs a fragilidade de todas as sociedades e economias a choques globais, como doenças e perturbações climáticas. Enquanto nos recuperamos, devemos fazer melhor pelas pessoas e pelo ambiente", afirmou Guterres.
"Governos se comprometeram a apresentar, daqui a um ano, contribuições nacionais determinadas e estratégias de longo prazo para zerarmos as emissões de carbono até 2050. Este compromisso deve ser mantido. E as maiores economias, os países do G-20, devem liderar pelo exemplo", completou o secretário-geral da ONU.
Os primeiros sinais enviados pelos países do G-20 e do resto do mundo, no entanto, não têm sido de grande preocupação com as emissões.
Na China, onde surgiu a Covid-19, as duras medidas de confinamento impostas pelo governo derrubaram as emissões em fevereiro, com uma redução de 25% em relação ao começo do ano.
Com a retomada das atividades industriais e econômicas, os indicadores se encaminham para o mesmo padrão de emissões visto anteriormente.
Na Europa, a volta gradual das atividades econômicas está só começando, mas analistas acompanham com atenção o padrão a ser adotado.
Existe ainda o temor de que verbas anteriormente destinadas a combater as mudanças climáticas sejam agora desviadas para projetos de recuperação pós-pandemia que nada têm a ver com preocupações ambientais.
O Brasil, porém, deve destoar desta tendência. Como a maior parte das emissões brasileiras vêm do desmatamento da Amazônia, que tem batido recordes mesmo durante a pandemia, o país deve acabar o ano como uma das poucas nações a aumentar a quantidade de carbono liberado na atmosfera.
Dados do sistema Deter do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), indicam que, de janeiro a março, houve um aumento de 51% nos alertas de desmatamento, em comparação com o mesmo período de 2019.
No primeiro trimestre, foram devastados 796 km² de floresta amazônica.
"Com a pandemia, a gente esperava que houvesse uma redução do trabalho dos desmatadores, mas foi o contrário. Só no fim de março, na últimas semanas, foi um aumento de 30%", avalia Paulo Moutinho, da diretoria do Ipam (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia).
"Janeiro, fevereiro e março são meses chuvosos. Não se esperava normalmente desmatamento, porque os tratores emperram, é mais complicado", completa o pesquisador, que destaca ainda uma mudança no perfil do desmatamento em relação aos anos anteriores, com a área devastada sendo cada vez maior e, consequentemente, com mais impacto nas emissões.
A política ambiental do governo de Jair Bolsonaro (sem partido) e a sinalização de uma possível anistia a desmatadores estariam entre as principais razões do aumento.
O desmatamento também indica um potencial de uma próxima grande onda de incêndios na Amazônia, uma vez que o passo seguinte à retirada das árvores é justamente a colocação de fogo para a "limpeza" do terreno.
Em 2019, o recorde de queimadas na Amazônia foi notícia em todo o mundo.
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