O pastor Paulo Marcelo Schallenberger, convocado pelo PT para dialogar com o segmento evangélico, apresentou nesta semana ao ex-presidente Lula um "projeto de inclusão" do partido nas igrejas.
O documento cita estratégias para tanto, como "trazer para entrevistas pastores que foram beneficiados no governo do PT" e incentivar menções de "atos dos governos anteriores que beneficiaram a igreja evangélica".
Paulo Marcelo também fala em usar grupos de WhatsApp. Destaca, contudo, que isso não deve ser feito para "divulgar conteúdo de ataque, para não gerar pauta de vitimismo, já que essa é a estratégia do atual governo".
Em entrevista à Folha de S.Paulo no começo deste mês, o pastor reforçou que evangélicos abriram templos como nunca durante administrações petistas, e eles iam muito bem, obrigado.
"A pergunta é muito simples: o que na sua vida melhorou? Quanto na sua igreja tinha de receita, na época de Lula e Dilma, e quanto tem de receita hoje?"
Segundo ele, que por anos pregou no congresso Gideões Missionários da Última Hora -uma vitrine gospel para líderes pentecostais do Brasil-, o esboço do projeto foi entregue a Lula por Moisés Selerges Júnior, presidente do sindicato dos metalúrgicos do ABC.
Foi Moisés quem fez a ponte entre o provável candidato do PT à Presidência e o pastor que tem como amigo um aliado de Jair Bolsonaro (PL), o deputado Marco Feliciano (Republicanos-SP).
Paulo Marcelo aponta a necessidade de reverter rótulos que, em sua visão, são impingidos por má-fé ou ignorância à sigla.
Exemplo: muitos evangélicos acreditam que petistas têm uma agenda anticristã e que vão obrigar pastores a praticar atos contrários à sua doutrina - como não poder falar mal de casamento homoafetivo.
A visão a ser construída, de acordo com o pastor, é a de que isso não é verdade. Mas ele faz a ressalva de que líderes religiosos não poderão "interferir nas escolhas individuais". Ou seja, não devem fazer lobby para que o Estado impeça essas uniões de acontecerem, no exemplo em questão.
"A igreja pode pregar no seu Evangelho que não aceita [o tema], mas não posso exigir que o restante da sociedade seja como nós. Tenho que respeitar para ser respeitado", ele diz à reportagem.
Paulo Marcelo começa a gravar em março um podcast voltado a evangélicos. O programa deve desviar de polêmicas que "gerem conflitos e sejam usados pelos adversários como contraprova de que o PT é contra a doutrina cristã", diz no texto que apresentou ao partido.
A chave para uma reaproximação com o segundo maior bloco religioso do país, que só perde em número para católicos, seria relembrar benefícios concedidos durante gestões petistas e que contemplaram muitos fiéis.
Para Paulo Marcelo, evangélicos eram mais felizes naqueles tempos, e o PT precisa lembrá- los disso.
Como mostrou a Folha, grandes igrejas que estiveram com Bolsonaro em 2018 vão emitindo sinais de que tamanho entusiasmo pode não se repetir neste ano. O recuo é associado ao bom desempenho eleitoral de Lula, mas não só.
Quem atua nos bastidores do segmento avalia: claro que a perspectiva de uma vitória petista, talvez até mesmo no primeiro turno, assusta líderes evangélicos que têm por hábito manter boas relações com o governante da vez.
Mas há também um sentimento dúbio sobre Bolsonaro, um católico não praticante que melhor do que ninguém soube sintonizar com as demandas morais do grupo e cumpriu a promessa de emplacar um ministro evangélico no Supremo Tribunal Federal, André Mendonça.
Já havia certa insatisfação com a conduta presidencial na mais grave crise sanitária do século, como a recusa em se vacinar contra a Covid.
Ninguém quer falar às claras sobre a possibilidade de desembarcar do bolsonarismo, até para não virar alvo de colegas hábeis em incitar turbas evangélicas contra desertores - o mais citado é Silas Malafaia, ex-apoiador de Lula que virou um dos mais vocais escudeiros do atual presidente.
No próximo dia 8, Bolsonaro deve abrir o Palácio da Alvorada para líderes evangélicos, numa tentativa de demonstrar força no bloco religioso que já foi alheio ao debate eleitoral, mas que hoje é o que mais se articula politicamente no Brasil.
Malafaia, uma das presenças confirmadas, diz não acreditar que muitos de seus colegas vão pular fora do bolsonarismo até outubro.
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