BRASÍLIA - Decisão do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes relata que a Polícia Federal está de posse de um vídeo de uma reunião ministerial de Jair Bolsonaro (PL) realizada em 5 de julho de 2022, a três meses das eleições, ocasião em que ele e auxiliares discutem claramente cenários golpistas.
"Eu vou entrar em campo usando o meu exército, meus 23 ministros (...) Nós não podemos esperar chegar 23, olhar para trás e falar: o que que nós não fizemos para o Brasil chegar à situação de hoje em dia?", afirmou Bolsonaro nessa reunião, segundo a transcrição feita pela PF.
O vídeo, segundo o inquérito, estava armazenado em um computador apreendido com Mauro Cid, então chefe da ajudância de ordens de Bolsonaro e hoje colaborador das investigações.
A PF deflagrou nesta quinta (8) a Operação Tempus Veritatis para apurar organização criminosa que teria atuado na tentativa de golpe de Estado e abolição do Estado democrático de Direito.
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Ocorrida em um contexto de forte ofensiva de Bolsonaro contra a lisura das urnas eletrônicas, a reunião da cúpula do governo contou com a presença, entre outros, do então chefe do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), Augusto Heleno, do então ministro da Justiça, Anderson Torres, e do então ministro da Defesa, Paulo Sergio Nogueira.
"A descrição da reunião de 5 de julho de 2022, nitidamente, revela o arranjo de dinâmica golpista, no âmbito da alta cúpula do governo, manifestando-se todos os investigados que dela tomaram parte no sentido de validar e amplificar a massiva desinformação e as narrativas fraudulentas sobre as eleições e a Justiça eleitoral", escreveu Alexandre de Moraes em sua decisão.
De acordo com a transcrição do vídeo, Bolsonaro manifesta a seus ministros que estaria havendo uma armação para que Lula fosse eleito por meio de fraude eleitoral.
Apesar do tom claramente golpista, em determinado momento Bolsonaro fala em não haver "providência de força". "Não é dar tiro. Ô Paulo Sergio [ministro da Defesa], vou botar a tropa na rua, tocar fogo aí, metralhar? Não é isso, [palavrão]!"
Moraes relata em sua decisão que, em seguida, Bolsonaro deixa claro que seus ministros "deveriam promover e replicar, em cada uma de suas respectivas áreas, todas as desinformações e notícias fraudulentas quanto à lisura do sistema de votação, com uso da estrutura do Estado brasileiro para fins ilícitos e dissociados do interesse público".
A seguir, a palavra é dada a Anderson Torres, que, de acordo com o relato, corrobora todo o discurso, alertando os presentes para a eventualidade de uma derrota eleitoral dali a três meses.
"E o exemplo da Bolívia é o grande exemplo pra todos nós. Senhores, todos vão se f...! Eu quero deixar bem claro isso."
A referência é a prisão de Jeanine Añez sob acusação de ter promovido um golpe de Estado contra Evo Morales.
Próximo a falar, o ministro da Defesa, Paulo Sergio Nogueira faz críticas ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), diz que a comissão de transparência eleitoral montada com participação das Forças Armadas é apenas "para inglês ver", e completa:
"Pra encerrar... senhor Presidente, eu estou realizando reuniões com os Comandantes de Força quase que semanalmente. (...) Nós temos reuniões pela frente, decisivas para gente ver o que pode ser feito, que ações poderão ser tomadas para que a gente possa ter transparência, segurança, condições de auditoria e que as eleições se transcorram da forma como a gente sonha", diz Paulo Sergio, de acordo com a transcrição, encerrando com os votos de que Bolsonaro seja reeleito. "Esse é o desejo de todos nós."
Após Bolsonaro levantar a suspeita de que ministros do STF e TSE estivessem ganhando propina para fraudar as eleições, a palavra é dada a Augusto Heleno.
"A existência do ilícito Núcleo de inteligência paralela também fica demonstrada nessa reunião, na fala do investigado Augusto Heleno", prossegue Moraes em sua decisão.
Ele então relata que o então chefe do GSI falou ter tido conversa para a infiltração de agentes da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) nas campanhas eleitorais, tendo sido interrompido por Bolsonaro no sentido de que o assunto fosse tratado posteriormente, à sós.
Heleno, segundo a transcrição, prossegue, agora com uma fala claramente golpista: "Não vai ter revisão do VAR. Então, o que tiver que ser feito tem que ser feito antes das eleições. Se tiver que dar soco na mesa é antes das eleições. Se tiver que virar a mesa é antes das eleições."
O então chefe do GSI conclui: "E vai chegar a um ponto que nós não vamos poder mais falar. Nós vamos ter que agir. Agir contra determinadas instituições e contra determinadas pessoas. Isso para mim é muito claro".
A reportagem procurou a defesa de Bolsonaro, Anderson Torres e Heleno e aguarda uma manifestação. A reportagem não conseguiu falar com Paulo Sérgio ou sua defesa.
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