Em meio à crise do coronavírus, a Secom (Secretaria Especial de Comunicação Social) da Presidência da República contratou, por R$ 4,8 milhões e sem licitação, uma nova agência de comunicação para tocar as mídias sociais do governo.
Uma das principais atribuições da IComunicação Integrada será produzir conteúdo digital na campanha do Palácio do Planalto, intitulada "O Brasil não pode parar", contra o confinamento de pessoas na pandemia.
A contratação foi publicada na quinta-feira (26) no DOU (Diário Oficial da União). A assinatura ocorreu com base no dispositivo legal que permite a dispensa de licitação nos casos de emergência ou calamidade pública.
O objetivo da prestação de serviços é, segundo o DOU, "disseminar informações de interesse público à sociedade, por meio de desenvolvimento de ações de comunicação".
A campanha "O Brasil não pode parar" foi lançada pela Secom para reforçar o discurso de Bolsonaro contra as medidas restritivas adotadas por governadores.
O presidente tem pregado que os brasileiros retornem ao trabalho, abandonem o isolamento social e que apenas o público de risco (idosos e pessoas com comorbidades) cumpra o período de quarentena.
Em seu pronunciamento em rede nacional de rádio e televisão na terça (24), o mandatário atacou governadores e disse que eles precisam "abandonar o conceito de terra arrasada", com a proibição de transporte, o fechamento de comércio e o que chamou de confinamento em massa.
"O que se passa no mundo mostra que o grupo de risco é de pessoas acima de 60 anos. Então, por que fechar escolas?", questionou o presidente na ocasião. "Raros são os casos fatais, de pessoas sãs, com menos de 40 anos de idade."
As primeiras peças publicitárias já começaram a ser produzidas.
Um vídeo experimental circulou nas redes sociais de apoiadores de Bolsonaro, pregando o fim de políticas de confinamento e disseminando o argumento de que as pessoas querem retornar à vida normal.
O próprio perfil da Secom no Instagram publicou o slogan #OBrasilNãoPodeParar, acompanhado da mensagem: "No mundo todo, são raros os casos de vítimas fatais do #coronavírus entre jovens e adultos. A quase-totalidade dos óbitos se deu com idosos. Portanto, é preciso proteger estas pessoas e todos os integrantes dos grupos de risco, com todo cuidado, carinho e respeito. Para estes, o isolamento. Para todos os demais, distanciamento, atenção redobrada e muita responsabilidade. Vamos, com cuidado e consciência, voltar à normalidade".
O mote também tem sido compartilhado nas redes pelo senador Flávio Bolsonaro, filho mais velho do presidente e um dos entusiastas da nova campanha publicitária.
Procurada, a IComunicação Integrada disse que o contrato tem caráter temporário, de seis meses, por conta do encerramento do vínculo da agência Isobar com o governo.
A empresa argumenta ainda que foi selecionada a partir do critério de menor preço e que só começará efetivamente a atuar no início de abril.
Por isso, agência afirma que não produziu o material da campanha "O Brasil não pode parar" que já foi veiculado nas redes.
"A Isobar anunciou no meio de janeiro a interrupção do contrato que será encerrado agora, no dia 31 de março. O governo não teria tempo hábil para uma licitação e a área de comunicação digital faz parte da comunicação essencial à sociedade, um direito do cidadão e, portanto, uma obrigação do governo", afirma Carolina Morales, sócia da IComunicação.
Em nota, a Secom disse que o vídeo que circulou nas redes sociais foi produzido "em caráter experimental, portanto, a custo zero e sem avaliação e aprovação" da secretaria.
"A peça seria proposta inicial para possível uso nas redes sociais, que teria que passar pelo crivo do governo. Não chegou a ser aprovada e tampouco veiculada em qualquer canal oficial do governo federal", diz.
"Também se deve registrar que a divulgação de valores de contratos firmados pela Secom e sua vinculação para a alegada campanha não encontra respaldo nos fatos", acrescenta a secretaria.
A realização de uma campanha publicitária contra o isolamento foi questionada pelo PSB junto ao TCU (Tribunal de Contas da União). O partido pediu a suspensão da campanha.
"Em tempos de calamidade em saúde pública, como o ora vivenciado, não é da discricionariedade do chefe do Poder Executivo orientar a população e propagar informações em sentido absolutamente contrário ao que manifestam todos os órgãos e entidades técnicas de saúde pública, sobretudo considerando-se o dispêndio de numerosos recursos públicos envolvidos na despesa", argumenta a sigla.
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