Conteúdo investigado: Postagem no Twitter reúne três conteúdos sobre o ex-presidente Lula. No primeiro momento, aparece o político perguntando sobre o que teria “roubado”. Depois, há um vídeo da delação premiada do ex-ministro Antonio Palocci Filho citando um suposto envolvimento de Lula em crimes de corrupção. Por último, o vídeo inclui uma gravação que atribui a Lula, com o que pode ser interpretado como uma sugestão ao assassinato de Palocci.
Onde foi publicado: Twitter.
Conclusão do Comprova: É falsa uma montagem de vídeos e áudios que circula no Twitter em que o ex-presidente Lula supostamente ameaça o ex-ministro Antonio Palocci. O áudio aparece na montagem após vídeos que mostram uma entrevista com Lula e um depoimento de Palocci no qual ele acusa o ex-presidente de receber dinheiro e imóveis para sua “aposentadoria”.
O vídeo, além de utilizar um áudio falso, retira de contexto outros conteúdos para induzir a uma interpretação enganosa sobre acusações ao ex-presidente Lula sem mencionar o desfecho das denúncias realizadas, que já foram arquivadas pela Justiça ou tiveram a condenação anulada. Em um dos processos, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu excluir o depoimento de Palocci dos autos.
Para o Comprova, falso é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.
Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos de maior alcance nas redes sociais. Até a tarde do dia 3 de junho, a postagem no Twitter tinha 8,907 retweets e 13,4 mil curtidas.
O que diz o autor da publicação: O Comprova entrou em contato com o autor da publicação por meio do Instagram, mas não houve resposta até a publicação desta checagem.
Como verificamos: Usamos palavras-chaves ditas em cada uma das partes do vídeo para verificar a originalidade das imagens. Pesquisando a frase “Diga, diga o que que eu roubei?”, relatada por Lula no início, fomos direcionados à entrevista do ex-presidente ao podcast Podpah, em que ele pronuncia os termos no minuto 1:23:40.
A segunda parte do vídeo mostra o ex-ministro Antonio Palocci Filho durante a sua delação premiada à Polícia Federal, em 2018, quando era acusado por corrupção e lavagem de dinheiro na Operação Lava Jato. Utilizando a expressão “Recebeu seu sítio, que foi feito combinado para o seu uso“, dita pelo ex-ministro, encontramos um texto do jornal O Globo, que reproduz o vídeo original. Outras matérias jornalísticas com as imagens também foram achadas.
Por último, para verificar o áudio atribuído a Lula, procuramos as palavras-chaves “Lula”, “Palocci” e “Áudio” no Google. Outras checagens já foram feitas sobre o conteúdo (Fato ou Fake, Estadão Verifica, Aos Fatos) em 2017 e em 2019, quando o áudio voltou a circular. Além disso, fizemos uma pesquisa por gravações de Lula que foram divulgadas oficialmente pela Operação Lava Jato com autorização da Justiça.
Para esclarecer questões sobre a postagem, o Comprova entrou em contato com o Instituto Lula, Partido dos Trabalhadores (PT), Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e com a Polícia Federal.
A resposta do ex-presidente foi dada durante uma entrevista ao podcast Podpah, quando o ex-presidente se referia ao juiz Sergio Moro e às condenações na Lava Jato que foram anuladas. Ao ser perguntado (1:20:20) sobre a possibilidade de evitar sua prisão em 2018, Lula comenta que jamais imaginou que sofreria acusações de corrupção, mesmo “essa gente, esses bandidos sabendo que não tinha feito”.
Relatou que poderia ter saído do país, mas tomou a decisão que tinha que ir para a prisão da Polícia Federal para provar que “Moro era mentiroso, que a força-tarefa de Curitiba era uma quadrilha”.
“Tô até hoje perguntando para esse Moro: “Diga, diga o que que eu roubei?”. A sentença que ele deu para mim, sabe qual foi o crime que eu cometi? Fato indeterminado. Eu fui condenado por um fato indeterminado”, afirmou o político.
Antonio Palocci Filho foi ministro da Fazenda no primeiro mandato de Lula. Com a 35ª fase da Operação Lava Jato, em 2016, o ex-ministro foi preso e foi condenado a 12 anos de prisão, em junho de 2017, pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro.
Entretanto, a execução da pena foi suspensa em 2021 porque, segundo parecer do Superior Tribunal de Justiça (STJ), as condenações da operação realizadas em Curitiba deveriam ser anuladas e o processo ser enviado para a Justiça Eleitoral (G1; Veja; Poder360).
O vídeo de Palocci mostrado na postagem é do depoimento realizado através de sua delação premiada, que foi assinada com a Polícia Federal e homologada pelo ministro do STF Edson Fachin. As falas foram compartilhadas por veículos de imprensa, como o jornal O Globo e o canal televisivo da Record News, em outubro de 2019.
Nele, o ex-ministro apresenta detalhes do que seria um enriquecimento ilícito de Lula por meio do pagamento de propinas de empreiteiras, sobretudo da Odebrecht. Antonio Palocci menciona as denúncias relativas ao sítio de Atibaia, ao triplex do Guarujá e ao apartamento em São Bernardo do Campo. Além disso, Palocci cita que o ex-presidente teria recebido dinheiro em espécie por meio de propinas pagas por construtoras envolvidas na Operação Lava Jato.
Em nota, o Partido dos Trabalhadores classificou as falas como mentirosas e “que ficam ainda mais evidentes os crimes e armações dos procuradores e do ex-juiz Moro contra Lula e o PT”. O texto ainda afirmou que “a farsa foi denunciada nos autos, comprovada pelas mensagens dos procuradores e confessada em detalhes pelo ex-procurador-geral Rodrigo Janot”. O Comprova entrou em contato com a Polícia Federal para esclarecer questões sobre o vídeo da delação, mas o órgão informou que não presta informações acerca de eventuais envolvidos em suas atividades.
Em agosto de 2020, a 2ª turma do STF decidiu retirar o depoimento de Palocci da ação que investigava a doação de imóveis em São Bernardo do Campo, São Paulo, a Lula. As propriedades, segundo Palocci, seriam uma forma da Odebrecht compensar contratações irregulares da Petrobras.
Segundo Ricardo Lewandowski, a ordem do juiz Sergio Moro de suspender o sigilo da delação de Palocci às vésperas da eleição de 2018 teve quebra da imparcialidade. Gilmar Mendes afirmou que a demora em juntar o acordo de delação premiada aos autos da ação penal “parece ter sido cuidadosamente planejada” para gerar “verdadeiro fato político na semana que antecedia o primeiro turno das eleições presidenciais de 2018″.
Em relação ao sítio de Atibaia, em São Paulo, Lula foi acusado de receber R$ 1,26 milhão das empreiteiras OAS e Odebrecht. A origem do dinheiro teria sido disfarçada através de obras na residência. Em 2019, o Tribunal Regional Federal da Quarta Região (TRF-4) condenou o ex-presidente a 17 anos pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, mas a sentença foi anulada pelo STF por entender que o juiz Sergio Moro, responsável pelo caso, foi parcial na condução do processo.
O processo foi transferido para a Justiça do Distrito Federal. Em agosto de 2021, a 12ª Vara da Justiça Federal em Brasília rejeitou a denúncia contra Lula por considerar que as provas eram insuficientes e porque parte dos supostos crimes já estavam prescritos.
O Ministério Público Federal acusou, em 2016, o ex-presidente de ter recebido propina da OAS por meio de reformas em um triplex da cidade do Guarujá, São Paulo. A sentença inicial, realizada por Moro, condenou o político, mas também foi anulada pelo STF por conta da parcialidade do juiz. O processo da mesma forma foi movido para o Distrito Federal e, em janeiro deste ano, foi arquivado por prescrição do caso.
O áudio que supostamente mostraria a reação do ex-presidente Lula a um depoimento de Palocci não é novo. Ele circulou pela primeira vez em setembro de 2017. À época, veículos de imprensa como Veja, G1 e a agência de checagem Aos Fatos já apontavam a gravação como falsa. O Instituto Lula, à época, também disse que a gravação era falsa. O áudio não contém a voz de Lula, e sim uma imitação, o que fica claro na comparação com outras gravações do ex-presidente – inclusive as que foram autorizadas pela Justiça e divulgadas oficialmente pela força-tarefa da Operação Lava Jato em 2016.
Na primeira vez em que circulou, segundo as primeiras checagens do conteúdo, ele foi compartilhado no aplicativo WhatsApp e era acompanhado de uma mensagem de texto que afirmava tratar-se de um grampo e que Lula conversava, naquela ocasião, com o ex-presidente do PT Rui Falcão. No entanto, ao contrário das gravações reais divulgadas por autoridades, é possível ouvir apenas uma voz (nas gravações autorizadas pela Justiça, os dois lados da linha telefônica são gravados). Em 2017, o texto também afirmava que Lula estava reagindo à notícia da “delação” de Palocci, mas naquele ano o ex-ministro ainda não havia fechado delação premiada com autoridades. Isso só ocorreu em 2018.
Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizam nas redes sociais sobre a pandemia de covid-19, políticas públicas do governo federal e eleições presidenciais. O conteúdo cita informações sobre Luiz Inácio Lula da Silva, pré-candidato à Presidência da República pelo PT, e pode influenciar a decisão de indivíduos nas eleições federais deste ano, prejudicando o processo democrático como um todo. Além disso, as acusações ao ex-presidente são mencionadas sem o contexto devido e sem as atualizações dos processos legais, que não sentenciam o político como culpado.
Outras checagens sobre o tema: Em relação ao áudio atribuído a Lula, as agências de checagem Fato ou Fake, Estadão Verifica e Aos Fatos classificaram o conteúdo como falso.
Recentemente, o Projeto Comprova mostrou que vídeo mente ao afirmar que Lula tenha roubado 350 mil toneladas de ouro de Serra Pelada e dado dinheiro para Venezuela; que postagem mostra imagens de imóvel de luxo no Ceará como sendo residência alugada por Lula em São Paulo e que declarações “vazadas” de Lula sobre crise econômica são públicas e foram feitas em 2016.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta