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Postura de Michelle sobre religiões africanas é criticada por bolsonaristas

Postura de Michelle sobre religiões africanas é criticada por bolsonaristas

Apoiadores do presidente também consideram atitudes da primeira-dama como intolerância religiosa

Publicado em 27 de agosto de 2022 às 11:54

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  • PAULA SOPRANA E RENATA GALF

SÃO PAULO - A postura da primeira-dama Michelle Bolsonaro sobre religiões de matriz africana gerou críticas até entre bolsonaristas nas últimas semanas. Várias mensagens que evocam respeito a todas as religiões e julgam que ela erra ao ligar rivais do marido ao demônio circularam em grupos favoráveis a Jair Bolsonaro (PL).

Análise do Observador Folha/Quaest, que monitora mais de 1.200 grupos de WhatsApp durante o período eleitoral, mostra que a tendência é de apoio a Michelle entre bolsonaristas, mas sem consenso.

Jair e Michelle Bolsonaro
Michelle Bolsonaro tem 63% de menções positivas em grupos pró-Bolsonaro . (Isac Nobrega / PR)

A Quaest verificou, de 18 de julho a 22 de agosto, 360 mil menções relacionadas à primeira-dama e à socióloga Rosângela Silva, a Janja, mulher de Luiz Inácio Lula da Silva Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em 721 grupos políticos, tanto da direita como da esquerda. Depois, fez uma "análise de sentimento", que consiste em identificar se o conteúdo é relacionado a críticas e/ou ataques (negativo) ou a elogios e/ou apoio (positivo).

Em grupos pró-Bolsonaro, 63% das menções a Michelle são positivas, enquanto 37% (cerca de 63 mil) são negativas. Nessa fatia, estão as críticas à intolerância religiosa.

"Não sou de querer polemizar em um grupo, muitas vezes deixo de emitir um posicionamento para não parecer que estou lacrando. Mas não entendi por que a primeira-dama precisa postar uma coisa dessas. Esse tipo de conduta só reforça mais ainda a intolerância às religiões de matriz africana", afirma uma mensagem.

Outras mensagens destacam comentários como "nossa primeira-dama está aí servindo à intolerância religiosa", "o que a primeira-dama fez foi inadmissível", "falar que o Palácio [do Planalto] já foi dos demônios é um exagero" e "o que Bolsonaro e Michelle fazem com esse negócio de religião é uma completa intolerância e desrespeito com a opinião e religião alheia, é muita covardia".

Há também mensagens de tom crítico que parecem vir de possíveis infiltrados nos grupos. Um exemplo foi a divulgação de uma nota de repúdio da Frente Inter-religiosa Dom Paulo Evaristo Arns, segundo a qual as declarações da primeira-dama feriam o Estado de Direito e promoviam a cultura de ódio.

Em grupos lulistas, Michelle também teve menções negativas (97%), o que já era esperado. Da mesma maneira, Janja tem 88% de menções negativas em grupos bolsonaristas - cerca de 72 mil mensagens.

Janja foi relacionada a termos como "pomba-gira", "macumba" e "macumbeira". Em fevereiro, ela publicou uma fotografia na qual está com uma roupa branca e ao lado de imagens como a de Xangô, um dos orixás da umbanda e do candomblé. Na legenda, diz ter saudade de vestir branco e "girar, girar, girar...".

"Essa mulher do Lula e a gente do PT são tudo frango de macumba. Deus me livre...", afirma uma mensagem.

Janja mulher de Lula
Janja tem 96% de menções positivas em grupos de apoio a Lula. (JanjaLula / Twitter / Reprodução)

Outros comentários, como "sei que o desespero é tão grande que, agora que perdeu o apoio dos evangélicos e dos católicos, Janja apelou para a macumba kkk" e "pior é a macumba e a aliança da mulher de Lula com o diabo", também aparecem nos grupos bolsonaristas.

Em grupos lulistas, 96% das menções a Janja eram positivas. Considerando todas as citações, Michelle foi a mais lembrada, com 171 mil conteúdos, enquanto a mulher de Lula teve 116 mil. O volume de mensagens que mencionam ambas as esposas dos candidatos foi de quase 73 mil.

A luta pelo voto evangélico e o protagonismo de Michelle no início oficial da campanha do marido, uma tentativa de diminuir a rejeição de Bolsonaro entre as mulheres, são o pano de fundo dos ataques envolvendo religião, que se acentuaram nas últimas semanas.

As duas candidaturas têm investido na temática religiosa. Uma das fake news que mais atingiram a campanha de Lula foi a de que ele fecharia igrejas caso eleito. O petista, por sua vez, já afirmou que o adversário estava "possuído pelo demônio".

Na convenção do PL que oficializou a candidatura de Bolsonaro, em julho, Michelle discursou em tom evangelizador e endossou a ideia de guerra santa, em que Bolsonaro representa o bem, um "escolhido de Deus", e seus rivais, o mal.

"A reeleição é por um propósito de libertação, um propósito de cura para o nosso Brasil", disse ela, pedindo aos presentes: "Não negociem com o mal".

Poucos dias depois, em um evento em Minas Gerais, polemizou ao dizer que, por muitos anos, "o Planalto era consagrado a demônios".

Diante das críticas, Michelle compartilhou uma postagem com um vídeo antigo em que o petista participava de uma celebração da umbanda. "Isso pode, né! Eu falar de Deus, não". O vídeo foi publicado pela vereadora Sonaira Fernandes (Republicanos), que associou a religião às trevas.

"Não lutamos contra a carne nem contra o sangue, mas contra os principados e as potestades [poderes] das trevas", escreveu a parlamentar endossada pela primeira-dama.

O caso foi considerado intolerância religiosa, e Janja, sem citar nomes, escreveu em uma rede social que "Deus é sinônimo de amor, compaixão e, sobretudo, paz e respeito". "Não importa qual a religião e qual o credo. A minha vida e a do meu marido sempre foram e sempre serão pautadas por esses princípios."

Publicação do blog "pensandodireita" sobre o episódio foi o conteúdo mais viral do tema. Com 12 versões, o link foi compartilhado mais de 53 mil vezes em 201 grupos, com alcance estimado de 38 mil pessoas.

Entre o eleitorado evangélico, Bolsonaro tem 49% das intenções, contra 32% de Lula, de acordo com a mais recente pesquisa Datafolha, realizada de 16 a 18 de agosto. A distância aumentou entre os dois candidatos --de dez pontos percentuais em julho, foi para 17 no último levantamento.

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