A principal comissão da Câmara dos Deputados concluiu nesta terça-feira (29) a votação do projeto que muda as regras e dificulta a demarcação de terras indígenas, contestado pela oposição e por líderes indígenas.
O texto principal do projeto foi aprovado na última quarta-feira (23) por 40 votos a 21 em uma sessão que durou mais de sete horas e que foi marcada por protestos de indígenas.
Nesta terça, os membros da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) apreciaram e rejeitaram sugestões de mudanças ao parecer do deputado Arthur Maia (DEM-BA).
Para ser apreciado pelo plenário da Câmara, o texto precisa ter a urgência aprovada pelos deputados. Caso passe pela Câmara, ainda deve ser submetido ao aval do Senado. Se houver mudanças, volta para a Câmara, antes de seguir à sanção do presidente Jair Bolsonaro.
Segundo a oposição, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), teria se comprometido a criar um grupo de trabalho para analisar a proposta.
Assim como na semana passada, a votação desta terça também teve tentativa de obstrução da oposição, que buscava retardar a conclusão do processo, e protestos de indígenas contra o texto. O anexo 2, onde os índios protestavam, teve o acesso ao público fechado.
O projeto relatado por Maia muda as regras para demarcação de terras indígenas no país, ao estabelecer um marco temporal para isso. O texto considera terras indígenas as tradicionalmente ocupadas pelos índios na data da promulgação da Constituição Federal de 1988, em 5 de outubro de 1988.
Essas áreas deveriam ser também simultaneamente por eles habitadas em caráter permanente, usadas para suas atividades produtivas, imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e necessárias à sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.
Segundo o texto, a ausência da comunidade indígena na área na data de promulgação da Constituição descaracteriza o enquadramento na reivindicação da terra indígena, exceto no caso de conflito por posse persistindo até 5 de outubro de 1988.
A tese é controversa e vista como uma retirada dos direitos de indígenas.
O relator também contemplou no texto condicionantes estabelecidas pelo STF (Supremo Tribunal Federal) na demarcação da terra indígena Raposa Serra do Sol, entre elas a possibilidade de manifestação de interessados em todas as fases do processo administrativo de demarcação de terras.
Hoje, estados, municípios, fazendeiros e demais interessados têm até 90 dias após o início do processo demarcatório para se manifestarem.
O texto proíbe a ampliação de terras indígenas já demarcadas e diz que processos administrativos de demarcação de terras indígenas ainda não concluídos serão adequados à nova lei.
Outro ponto contestado diz respeito às reservas indígenas, estabelecidas pela União para posse e ocupação por comunidades indígenas.
O projeto determina que, em caso de "alteração dos traços culturais da comunidade ou por outros fatores ocasionados pelo decurso do tempo", a União possa retomar a área, dando-lhe outra destinação, ou possa destiná-la ao Programa Nacional de Reforma Agrária, "destinando-se os lotes preferencialmente a indígenas que tenham, caso tenham aptidão agrícola e assim desejem."
O projeto indica que o usufruto dos índios das terras não abrange o aproveitamento de recursos hídricos e potenciais energéticos, que dependerá sempre de autorização do Congresso.
Também não abrange a pesquisa e lavra das riquezas minerais, que dependerão de autorização do Congresso, assim como garimpagem nem a faiscação e outras áreas cuja ocupação atenda a relevante interesse público da União.
O texto assegura a atuação das Forças Armadas e da Polícia Federal em área indígena, independentemente de consulta às comunidades indígenas ou ao órgão indigenista federal competente.
Proíbe ainda a cobrança de tarifas ou valores ou troca pela utilização das estradas, equipamentos públicos, linhas de transmissão de energia ou de quaisquer outros equipamentos e instalações colocados a serviço do público em terras indígenas.
O projeto dispõe ainda sobre o caso de indígenas isolados e diz que cabe ao Estado e à sociedade civil o absoluto respeito a suas liberdades e meios tradicionais de vida, devendo ser ao máximo evitado o contato, salvo para prestar auxílio médico ou para intermediar ação estatal de utilidade pública.
Antes da CCJ, o projeto passou, em 2008, pela comissão de agricultura, pecuária, abastecimento e desenvolvimento rural, onde o parecer foi aprovado, e, no ano seguinte, pela comissão de direitos humanos e minorias, onde a decisão foi pela rejeição do projeto principal e de outros anexados a ele.
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