As promotoras Simone Sibilio e Letícia Emile decidiram deixar a investigação sobre o mandante do homicídio da vereadora Marielle Franco (PSOL) e seu motorista Anderson Gomes.
As duas atuavam no caso desde outubro de 2018, quando foi adotada a linha de investigação que culminou na prisão dos dois acusados pelos assassinatos. A dupla formava a força-tarefa instituída pelo Ministério Público do Rio de Janeiro para esclarecer a existência de mandantes do crime.
De acordo com o jornal O Globo, que revelou o caso neste sábado (10), a saída se deve a divergências causadas pelo acordo de colaboração premiada fechado pelo MP-RJ com Júlia Lotuffo, viúva do ex-capitão da Polícia Militar Adriano da Nóbrega, miliciano também envolvido no suposto esquema de "rachadinha" no antigo gabinete do senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ).
Júlia afirmou ao MP-RJ que tinha pistas para indicar sobre os mandates do crime. As promotoras, porém, se sentiram alijadas na negociação com a viúva do miliciano. Simone e Letícia apontaram, segundo o jornal, "risco de interferência externa" na condução do caso.
A dupla foi uma das responsáveis pela linha de investigação que levou à prisão do policial militar aposentado Ronnie Lessa e o ex-PM Élcio Queiroz, acusados pelo crime. Elas atuavam no Gaeco (Grupo de Atuação Especializada no Combate ao Crime Organizado) e passaram a integrar a força-tarefa montada para atuar na continuação do caso depois que deixaram o grupo especializado.
A saída das duas da força-tarefa foi confimada pela Promotoria, que não descreveu a razão da decisão.
"O Ministério Público confirma que as promotoras de Justiça Simone Sibílio e Letícia Emile optaram voluntariamente por não mais atuar na força-tarefa que investiga o caso Marielle Franco e Anderson Gomes. A Procuradoria-Geral de Justiça do MP-RJ reconhece o empenho e a dedicação das promotoras ao longo das investigações, que não serão prejudicadas. O MP-RJ anunciará em breve os nomes dos substitutos das promotoras na força-tarefa", afirma a nota.
Essa é a primeira mudança relevante na condução do caso dentro do MP-RJ. A Polícia Civil, por sua vez, trocou pela quarta vez o titular da Delegacia de Homicídios, também responsável pela apuração.
O deputado federal Marcelo Freixo (PSOL-RJ), de quem Marielle foi assessora antes de se tornar vereadora, cobrou explicação sobre a saída das promotoras do caso.
"Uma delação premiada é importante. Mas ela pode estar querendo proteger alguém, desviar alguma coisa. As promotoras estavam há três anos no caso, com muita dedicação. Elas saíram por alguma razão. É preciso saber qual", disse o deputado.
Pivô da demissão, a delação de Júlia Lotuffo ainda não foi homologada pela Justiça. A viúva do miliciano está atualmente em prisão domiciliar por decisão do ministro Reynaldo da Fonseca, do STJ (Superior Tribunal de Justiça).
Ela ficou um mês foragida após a deflagração da Operação Gárgula, na qual é acusada de comandar a lavagem de dinheiro dos bens do miliciano, morto há um ano numa operação policial na Bahia.
Júlia também é mencionada na investigação do caso das "rachadinhas". Ela teria intermediado o contato entre Adriano, na ocasião foragido, e a família de Fabrício Queiroz, apontado como operador do esquema de Flávio.
Como a Folha mostrou, a Operação Gárgula confirmou o método de contato apontado pelo MP-RJ entre pessoas ligadas ao senador Flávio Bolsonaro e o miliciano, quando Adriano já estava foragido, em dezembro de 2019.
A apuração do caso das "rachadinhas" mostrou que Márcia Aguiar, mulher de Fabrício Queiroz e ex-assessora de Flávio, e Luiz Botto Maia, advogado do senador, foram até o interior de Minas Gerais se encontrar com Raimunda Veras Magalhães, mãe de Adriano e também ex-funcionária do filho do presidente Jair Bolsonaro.
Trocas de mensagens no celular de Márcia indicam que o objetivo do encontro era estabelecer contato com Adriano, em fuga sob acusação de comandar a milícia de Rio das Pedras.
As mensagens também sugerem que Júlia Lotuffo também participou do encontro. Esse foi um dos argumentos para prisão de Queiroz em junho do ano passado, atualmente revogada.
Adriano era amigo e foi companheiro de batalhão de Fabrício Queiroz, amigo do presidente Jair Bolsonaro e apontado como operador financeiro da "rachadinha" no gabinete de Flávio Bolsonaro (Repiblicanos-RJ) na Assembleia do Rio.
O miliciano teve a ex-mulher e a mãe lotadas no gabinete de Flávio, ambas denunciadas junto com o senador sob acusação de envolvimento no esquema de desvio de dinheiro público.
O ex-capitão foi morto num sítio em Esplanada (170 km de Salvador) em 9 de fevereiro de 2020 numa operação da Polícia Militar da Bahia com a participação de agentes fluminenses.
A polícia da Bahia afirma que ele disparou contra os agentes quando foi localizado. Ele estava foragido havia um ano sob acusação de comandar a milícia da favela Rio das Pedras.
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