SÃO PAULO – O PT oficializou neste sábado (5) seu respaldo à candidatura do deputado Guilherme Boulos (PSOL-SP) a prefeito de São Paulo, em evento com duas figuras do primeiro escalão do partido.
Ao que parece, as dissidências internas em torno do apoio são residuais. O ministro Fernando Haddad (Fazenda) e a presidente da sigla, a deputada Gleisi Hoffmann, estavam entre os nomes que reforçaram a mensagem do presidente Lula: Boulos será o candidato do partido, que pela primeira vez em sua história não disputará o comando da capital paulista.
Uma das metas do encontro era diluir dúvidas de que a base petista lutará por Boulos em 2024, já que houve ruído sobre a parceria.
O psolista destacou em sua fala o protagonismo da legenda aliada na política brasileira. Disse ser "gratificante ver que o mundo gira, e aqueles que achavam que esquerda estava morta, o PT estava morto, o Lula já era", quebraram a cara com a vitória presidencial no ano passado.
Na sua vez ao microfone, Gleisi afirmou que compreende divergências e fez um mea-culpa: no "calor do momento", não deu tempo de tocar uma "consulta ampla" com o partido. Daí a cúpula fechar o trato com o PSOL na campanha passada — havia pressa para derrotar Jair Bolsonaro (PL) e seus correligionários.
Mas essa página foi virada e é hora de mostrar união, disse a deputada.
Haddad reforçou que a prioridade era garantir um "amplo palanque" naquele momento, quando qualquer passo em falso poderia significar a derrota para o bolsonarismo. "Aliança não é traição quando é feita à luz do dia, sem abrir mão de princípios."
O PT fechou acordo em 2022 para endossar o psolista. Como moeda de troca, Boulos abriu mão de concorrer a governador de São Paulo em prol de Haddad — que acabou derrotado por Tarcísio de Freitas (Republicanos) no segundo turno.
Nem todos na legenda, contudo, gostam da ideia de honrar o compromisso. Uma ala minoritária, liderada pelo deputado Jilmar Tatto e seu grupo político, argumenta que o PT deveria lançar candidatura própria.
Tatto, que é também secretário nacional de comunicação da sigla, disse em evento com militantes petistas que o PT vai cumprir a palavra, mas questionou: "Por que é difícil de aceitar?".
Sua tese: um nome do PSOL seria difícil de engolir para o centro, fatia do eleitorado indispensável para vencer a eleição na cidade. E não ajuda que o indicado seja Boulos, com longa trajetória no MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto), no qual começou a militar no mesmo ano em que Lula foi eleito pela primeira vez presidente. Ele já não está mais na coordenação nacional do movimento.
Seu engajamento no MTST é tido como espantalho eleitoral fora da bolha progressista e foi usado contra ele nos três pleitos que disputou: pelo Palácio do Planalto em 2018, para a Prefeitura de São Paulo dois anos depois e, por fim, na campanha à Câmara, seu primeiro êxito nas urnas — com 1 milhão de votos, foi o segundo deputado mais bem votado do país, perdendo apenas para o bolsonarista Nikolas Ferreira (PL-MG).
Boulos reagiu a essa impressão em seu discurso: "Às vezes ouço gente falando: 'Viu, Boulos, vai ser difícil ganhar porque você é do movimento de moradia'". Mas ter duas décadas de MTST no currículo é seu "maior orgulho", afirmou.
"A grande dúvida é se uma candidatura do PSOL consegue dialogar com o centro. A gente corre o risco de perder na cidade de São Paulo a oportunidade de ganhar a eleição num momento que o país está começando a ficar bom, num momento em que a gente ganhou a Presidência", afirmou Tatto na sexta (28).
Questionada pela Folha, Gleisi disse não ver sentido no argumento. A presidente do PT lembrou que em 2022 tanto Haddad quanto Lula ganharam dos respectivos adversários, Tarcísio e Bolsonaro, na cidade.
Ela vê, portanto, uma "tendência [local] de votar nesse campo político". Desde a redemocratização, São Paulo elegeu três chefes do Executivo à esquerda até aqui, todos pelo PT: Luiza Erundina, Marta Suplicy e Haddad.
"Bolsonarismo aqui não se cria", concordou Boulos.
A jornalistas, na saída do ato, o pré-candidato do PSOL afirmou que sua expectativa é a de "fazer uma campanha sem agressões e xingamentos", superando a "polarização rasteira", ao seu ver, imposta pela trupe bolsonarista.
O atual prefeito, Ricardo Nunes (MDB), que pleiteia a reeleição, dá sinais de que pretende usar o elo de Boulos com o movimento de moradia. Por ora, os dois são vistos como os maiores rivais no pleito de 2024.
Presidente do PSOL, Juliano Medeiros diz que o oponente do MDB "vai tentar reeditar o BolsoNunes", à moda BolsoDoria, dobradinha entre os hoje rivais João Doria e Bolsonaro na eleição de 2018.
O prefeito tem tentado atrair bolsonaristas para sua órbita. O deputado Ricardo Salles (PL), que evocava para si o título de representante legítimo do bolsonarismo, desistir de concorrer em 2024 foi lido como ótimo sinal nesse sentido.
Colar sua imagem à de Bolsonaro será uma estratégia na campanha e deu as caras no discurso de Laércio Ribeiro, presidente municipal do PT. "O bolsonarismo segue vivo na cidade de São Paulo e de mãos dadas com o prefeito, o incompetente Ricardo Nunes", discursou antes de dizer que Boulos é a aposta de Lula.
Nunes era vice de Bruno Covas (PSDB) e entrou no cargo após a morte dele. Já Boulos chegou ao segundo turno contra Covas em 2020.
Jilmar Tatto, que hoje questiona se o psolista tem cacife eleitoral, também estava no páreo, pelo PT, que amargava uma má fase em meio à onda bolsonarista. Terminou em sexto lugar. Ele não foi ao evento no sindicato neste sábado.
O deputado Kiko Celeguim, à frente do diretório estadual da sigla, definiu como histórico o passo de abdicar da cabeça de chapa. O PT está mostrando "humildade" e "reciprocidade" no processo, segundo ele.
"Mais importante do que eleger um companheiro filiado ao partido é ter alguém que defenda a democracia", afirmou no palco do Sindicato da Saúde, onde a militância petista cantou minutos antes "Vermelho", hit imortalizado na voz de Fafá de Belém e hino informal dos petistas.
Também subiu ao tablado um combo de parlamentares simbólicos do PT, como o deputado federal Rui Falcão, ex-presidente da sigla, e o deputado estadual Eduardo Suplicy, querido pela base.
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