O terceiro ministro da Educação do governo Jair Bolsonaro chegará à pasta em cenário crítico. O coronavírus levou ao fechamento de escolas, exige esforços para manter o ensino e acarretará em queda de recursos.
A pasta não cumpriu até agora papel de protagonista na articulação para enfrentamento da crise.
O MEC tem sido praticamente ausente na manutenção de aulas remotas e na definição de protocolos de retorno às aulas, e - fato considerado mais grave - não criou qualquer linha de financiamento para mitigar os efeitos da pandemia.
Considerado como principal desafio imediato do novo ministro, a emergência imposta pela Covid-19 para a educação pública sintetiza o estágio atual do MEC.
A desarticulação com as redes de ensino e a pouca atenção para o financiamento, porém, já são marcas do MEC desde o início do governo.
Até quinta-feira (18), o ministério era comandado por Abraham Weintraub. Ele foi demitido por Bolsonaro após a crise gerada por ataques ao Supremo Tribunal Federal (STF).
A exoneração oficial saiu no sábado (20), horas após Weintraub ter desembarcado em Miami, nos Estados Unidos. Ele foi indicado para ocupar uma diretoria-executiva do Banco Mundial, em Washington.
Weintraub assumiu em abril de 2019, após a demissão de Ricardo Vélez Rodríguez. A saída de Vélez também foi precedida de crise. Ainda não há substituto definido para Weintraub.
O MEC chega ao segundo ano da gestão Bolsonaro com execução orçamentária deficiente e articulação precária com Congresso e universidades, além de alto teor ideológico na condução de políticas públicas.
Andressa Pellanda, da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, ressalta o entrave estrutural relacionado ao orçamento para a área.
A entidade projeta perdas de até R$ 52,4 bilhões dos recursos destinados à educação de estados e municípios como reflexo da frustração de arrecadação.
"Para reabertura das escolas e das universidades e para a volta às aulas presenciais, será necessário investimento a mais, de forma a readequar as infraestruturas para um cenário de cuidados sanitários redobrados e investir em processos de mitigação de danos tanto da perspectiva psicossocial quanto da própria educação, para estudantes e profissionais da educação", diz ela.
O jornal Folha de S.Paulo mostrou na semana passada que a maior parte dos gastos feitos pelo MEC neste ano são de empenhos de 2019.
Outro desafio é que o MEC segue distante daquilo que se espera da pasta em relação aos grandes temas da educação brasileira, sobretudo na educação básica.
Até agora não ganharam prioridade a continuidade de implementações da Base Nacional Comum Curricular, que prevê o que os alunos precisam aprender na educação básica, da reforma do ensino médio e de expansão do acesso à educação infantil.
Em 2019, Weintraub perdeu, por exemplo, R$ 1 bilhão recuperados pela Lava Jato. A pasta não tinha um projeto para a educação infantil, conforme revelado pelo jornal Folha de S.Paulo. Com a pandemia, o dinheiro foi definitivamente para a Saúde.
Pauta legislativa mais importante para área, a renovação do Fundeb não contou com participação a contento do MEC. O tema ainda não foi votado no Congresso.
O Fundeb é o principal mecanismo de financiamento da educação básica e sua vigência vence neste ano. A cada R$ 10 investidos na etapa, R$ 4 são por meio do fundo.
"A discussão do Fundeb será certamente ponto fundamental agora, além de continuar olhando para as agendas já estabelecidas, porque o Brasil não pode deixar de avançar", diz o secretário de Educação de São Paulo, Rossieli Soares.
Ex-ministro da Educação do governo Michel Temer (MDB), Soares vê, porém, a falta de liderança do MEC no processo pós-pandemia na educação básica como o maior obstáculo a ser vencido.
"Tem um desafio importante econômico, o Brasil vai enfrentar pós-pandemia com a economia com muitas dificuldades, então logicamente o MEC vai ter de se adaptar, vai precisar de criatividade por causa da situação das universidades, do apoio à educação básica", diz ele.
De urgente, o próximo ministro também terá de superar a complexidade para realização do Enem, alvo de preocupações permanentes.
A edição 2019, primeira sob a gestão Bolsonaro, ficou marcada pela divulgação de milhares de notas com erros, o que colocou em dúvida a confiabilidade dos resultados mesmo entre funcionários da pasta.
Em detrimento dos desafios reais, o maior foco da pasta até aqui foi as questões ideológicas, tanto sob Vélez quanto sob Weintraub.
Ambos os gestores não mostraram comprometimento com o Plano Nacional de Educação (PNE), lei que estipulou metas de acesso e melhoria da educação para ser alcançadas até 2024.
A ala ideológica do governo pressiona pela indicação de um ministro alinhado, até como forma de compensar a saída de Weintraub, admirado pela militância mais fiel ao governo.
"Em termos de cenário político e ideológico, não espero que seja alguém que não esteja completamente imerso nos princípios que regem o governo Bolsonaro, já que não há sinalização de que o governo deverá recuar em termos ideológicos ou políticos", diz Pellanda, da Campanha Nacional pelo Direito à Educação.
O secretário-executivo do MEC, Antonio Paulo Vogel, deverá ser mantido como interino até a escolha do substituto definitivo.
O nome do aluno do escritor Olavo de Carvalho e secretário de Alfabetização, Carlos Nadalim, para assumir o MEC encontra resistência exatamente pela sua forte ligação com os olavistas.
Militares considerados mais moderados defendem perfil técnico, cenário visto com ressalvas por interlocutores do governo.
O nome do secretário de Educação do Paraná, Renato Feder, tem sido considerado pelo governo. Ele já mostrou disposição para aceitar, se de fato convidado. O governador Ratinho Junior (PSD) se entusiasmou com a ideia.
Grupos evangélicos têm trabalhado por Benedito Aguiar, presidente da Capes, órgão do MEC responsável pela pós-graduação.
Com longa carreira acadêmica, Aguiar agregaria um lado técnico e manteria o aceno aos religiosos, que engrossam coro nas pautas de costumes do governo.
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