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Real Digital, o Drex, não mudaria sigilo bancário que existe atualmente

Real Digital, o Drex, não mudaria sigilo bancário que existe atualmente

Rastreio bancário da moeda digital poderá ser feito em casos de atividades ilícitas, assim como já acontece com os meios de pagamentos atuais, como cartões de crédito e transferências bancárias

Publicado em 10 de outubro de 2024 às 09:09

Ícone - Tempo de Leitura 6min de leitura
Real Digital, o Drex, não mudaria sigilo bancário que existe atualmente. (Reprodução Instagram | Arte A Gazeta)

Conteúdo investigado: Vídeo publicado nas redes sociais afirma que o Drex, projeto de moeda digital criado e operado pelo Banco Central, representa controle social, fim da privacidade e permitirá bloqueio de salários. “Ele pode, por exemplo, garantir que você só consiga usar seu dinheiro em uma determinada área circunscrita e não use mais para doar dízimo ou comprar em empresas que não são alinhadas com o governo. O governo tem agora a sua localização bem clara e definida e o seu dinheiro pode ser bloqueado instantaneamente pela Justiça. O dinheiro virou concessão do governo”, diz o homem que aparece no conteúdo enganoso.

Onde foi publicado: Telegram, Facebook e Instagram.

Conclusão do Comprova: O vídeo engana ao afirmar que o real digital vai permitir que o governo bloqueie o uso de dinheiro em determinadas áreas geográficas ou o pagamento para certas empresas. O Drex, regulado pelo Banco Central (BC), é apenas uma versão digital do real, que funcionará sob as mesmas regras já vigentes no sistema financeiro atual.

Segundo BC, órgão criador e regulador da nova moeda, o Drex “é o real, a moeda brasileira oficial, em formato digital”. Embora tenha outro nome, o projeto prevê que ela tenha o mesmo valor, aceitação, garantias e segurança do real tradicional – utilizado em movimentações com dinheiro em espécie ou cartões de crédito e débito.

Ainda de acordo com o banco, também criador do Pix, o intuito é modernizar o sistema financeiro brasileiro e facilitar as transações digitais. Enquanto o Pix é um meio pelo qual é possível transferir dinheiro, o Drex é o próprio dinheiro a ser transferido. A nova moeda digital poderá ser utilizada tanto para “fazer um Pix” quanto para realização de pagamentos ou transferências por meio de outras modalidades já existentes.

Conforme o especialista Eduardo Ibrahim, professor convidado da Escola de Economia de São Paulo e expert da Singularity Brazil, a moeda digital ainda não está em funcionamento, pois ainda precisa ser adequada à legislação atual, que garante o sigilo fiscal.

“Inclusive, o projeto, hoje, tem desafios técnicos para justamente garantir que a legislação atual seja cumprida em uma tecnologia que foi projetada para ter transparência”, explicou Eduardo. O professor ainda comenta que há um desafio para manter o sigilo bancário ao passo em que também prioriza a transparência de informações.

Na legislação atual, a Instrução Normativa nº 2.219 estabelece prerrogativas para a prestação de informações relativas às operações financeiras de interesse da Secretaria Especial da Receita Federal. Com isso, as instituições financeiras devem prestar contas quando o montante global movimentado ou o saldo mensal por tipo de operação ultrapassar R$ 5 mil para pessoas físicas e R$ 15 mil para pessoas jurídicas.

No vídeo publicado nas redes sociais, o autor alega que o governo terá acesso à localização do usuário e poderia, por exemplo, restringir a área onde o cidadão utilizaria o dinheiro. Além disso, conseguiria verificar se os impostos estão sendo pagos em dia.

Segundo Ibrahim, essas afirmações são superficiais, porque o sistema financeiro atual já é totalmente eletrônico e não há nada que não possa ser rastreado nas carteiras digitais dos bancos. A inspeção das operações ocorre apenas em casos de movimentações suspeitas ou de acordo com a Instrução Normativa citada. O economista, portanto, entende que a principal discussão é estudar como o Drex acompanhará a legislação atual.

Alexandre Tamura, diretor de Data Regulation (regulamento de dados) da Protiviti, empresa especializada em soluções para gestão de riscos, argumenta que não há evidências que sustentem a afirmação de que o Drex se tornará um sistema de controle social e pontua que o cenário atual contraria as afirmações enganosas.

“Não há também fundamento para a ideia de que o governo limitaria o uso do dinheiro a áreas geográficas ou estabelecimentos. O Drex visa transações mais eficientes e acessíveis”, informou Tamura..

“O Drex terá medidas de segurança e controle para prevenir atividades ilícitas, como lavagem de dinheiro, iguais a controles já existentes, mas isso não significa ter um controle invasivo sobre as transações pessoais. A moeda digital será regida por leis e regulamentos que protegem os direitos e a privacidade dos cidadãos, impedindo seu uso como ferramenta de controle social, e não elimina o sigilo fiscal”, acrescentou.

A reportagem questionou ao Banco Central do Brasil quando a moeda estará disponível, mas a instituição não deu uma previsão. A publicação mais recente no site oficial sobre o andamento para o desenvolvimento da moeda informa que a fase de testes com o Piloto Drex, iniciada em março de 2023, trabalha “para que se possa garantir o atendimento de todos os requisitos jurídicos relacionados à preservação da privacidade e à proteção de dados pessoais”.

“Esses são os fatores que têm o maior impacto no cronograma. O risco associado a eles já estava claro no início do projeto e faz parte da evolução de um ambiente de pesquisa e desenvolvimento que busca uma solução ainda globalmente inédita. Para esse desafio, o Banco Central tem contado com a colaboração do Sistema Financeiro Nacional (SFN) e de equipes globais de pesquisa e desenvolvimento voltadas à busca dessa solução”, disse Fabio Araujo, consultor do Departamento de Operações Bancárias e de Sistemas de Pagamentos do Banco Central (Deban).

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. O alcance no Telegram foi de 2,7 mil visualizações e, no Instagram, 89 mil.

Fontes que consultamos: Especialista em economia Eduardo Ibrahim, da Singularity Brazil; Alexandre Tamura, diretor de Data Regulation; e Banco Central do Brasil.

Por que o Comprova investigou essa publicação: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas e eleições e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: A seção Comprova Explica trouxe detalhes do funcionamento do Drex. O projeto também checou a informação enganosa de que o recurso seria utilizado para arrecadar impostos diretamente de transações digitais.

Investigação e verificação

Investigado por: UOL, Agência Tatu e O DIA
Texto verificado por: Metrópoles, A Gazeta, imirante.com, Correio Braziliense, Folha e CNN Brasil


O Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa e sem fins lucrativos liderada e mantida pela Abraji – Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo e que reúne jornalistas de 42 veículos de comunicação brasileiros para descobrir, investigar e desmascarar conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições, saúde e mudanças climáticas que foram compartilhadas nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens. A Gazeta faz parte dessa aliança. 

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