Com o baixo nível dos estoques mundiais e a defasagem de preços em relação ao mercado internacional, o risco de falta de diesel entrou no radar da cadeia do produto, que já tem registro de problemas pontuais.
Na terça-feira, 24, a Federação Única dos Petroleiros (FUP) emitiu nota alertando para o risco de desabastecimento no início do segundo semestre. Enquanto isso, o presidente da Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom), Sérgio Araújo, afirmou que o Brasil não vai passar imune à escassez global do produto, principalmente se a Petrobras não alinhar seus preços aos do exterior.
A defasagem ontem estava baixa (2%), mas é sensível à variação do dólar e oscila, tanto que em 8 de março, por exemplo, chegou a 28%.
Os caminhoneiros, que já reclamavam do preço, agora têm mais um fator de estresse. “Exigimos transparência com relação ao estoque de diesel para o mercado interno”, afirmou em nota nesta semana o presidente da Associação Brasileira de Condutores de Veículos Automotores (Abrava), Wallace Landim, conhecido como Chorão.
“Até o momento, não está faltando (em larga escala), mas estou preocupado”, disse ele ontem ao Estadão/Broadcast, sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado.
Recém-saído do cargo, o ex-presidente da Fecombustíveis Paulo Miranda disse que já houve problemas pontuais em postos com bandeira branca (sem marca das distribuidoras). “Não tenho relato de falta sistêmica, mas já tivemos problema de posto do interior do Ceará ficar até três dias sem combustível; é igual uma padaria ficar três dias sem pão para vender”, comparou.
Ele explicou que as grandes bandeiras – Ipiranga, Shell (Raízen) e Vibra – ficam com 70% do diesel vendido pela Petrobras e importam o restante, diluindo a diferença de preços entre os mercados interno e externo. Já os postos sem bandeira compram pouco da Petrobras e dependem de importadores regionais, ficando em desvantagem.
O risco de falta de diesel no segundo semestre pode ser agravado pelo consumo extra por questões sazonais (férias no Hemisfério Norte e safra) e circunstanciais.
Além de ter havido a retomada da economia com o fim do isolamento social, a guerra entre Rússia e Ucrânia deslocou o fluxo de venda de diesel para a Europa a fim de compensar os cortes de fornecimento de petróleo e gás russo. Com estoques baixos, os Estados Unidos também estão com demanda acima do normal, o que reduz ainda mais a oferta para outros países.
"Falta de previsibilidade"
“No Brasil, o que preocupa é a defasagem de preço e a falta de previsibilidade. Os grandes importadores (Petrobras, Ipiranga, Raízen e Vibra) têm feito importações elevadas, mas os outros 300 importadores do mercado não estão conseguindo”, disse o presidente da Abicom.
Na Raízen, o presidente Ricardo Mussa disse que, por enquanto, a situação ainda está “dentro do controlável”. A empresa continua a importar o produto e a pagar mais para honrar os contratos com seus clientes. “O problema ainda não passou, a tempestade continua, e estamos no meio dela. Mas temos conseguido navegar bem. Conseguimos passar por momentos difíceis até agora”, disse Mussa durante o Raízen Day, na quarta-feira, em São Paulo.
Conforme o presidente da Abicom, o Ministério de Minas e Energia (MME) e a Agência Nacional de Petróleo e Gás (ANP) estão monitorando os estoques. “Todos nós temos de informar o nível de estoques e a expectativa de importação para a ANP e o MME”, afirmou.
Questionada, a ANP se limitou a dizer que “monitora o abastecimento nacional de combustíveis líquidos de forma sistemática por meio do acompanhamento dos fluxos logísticos em todo o território brasileiro” e que, “na presente data, o abastecimento com diesel aos consumidores se mantém regular”.
Araújo confirmou faltas pontuais relatadas à Abicom. “A dificuldade mesmo será no segundo semestre em função da incerteza. Não podemos fazer contratos sem previsibilidade de preço. Pode até mesmo não haver o produto e, se houver, vai estar muito caro.
É difícil tomar uma decisão agora, ainda mais com a declarada intervenção do governo na Petrobras”, disse, referindo-se à indicação de um integrante do Ministério da Economia para presidir a estatal.
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