A cúpula do Senado e líderes na Casa consideram que o pedido de abertura de processo contra ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) anunciado pelo presidente Jair Bolsonaro é uma ação com chances mínimas de prosperar e se trata mais de uma forma de ataque retórico contra as instituições.
Por outro lado, esses mesmos senadores buscam agir nos bastidores para evitar o constrangimento de ver Bolsonaro criar um "circo" na Casa, como escolher um dia movimentado de sessão plenária para entregar pessoalmente o pedido nas mãos do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG).
Aliados políticos de Pacheco afirmam que o presidente do Senado não se recusaria a receber o pedido pessoalmente de Bolsonaro. Não seria seu estilo criar um mal-estar.
Mas apontam que ele vai buscar transmitir a mensagem ao chefe do Executivo de que o senador mineiro prefere não se envolver na polêmica e dar um tratamento apenas técnico ao pedido.
Um líder do governo, sob reserva, afirma que o pedido de Bolsonaro é legítimo e representa os anseios de uma parte da população e da classe política.
Por outro lado, reconhece que um ato de entrega poderia causar desgastes, em particular na relação com Pacheco, que tem carreira jurídica e não gostaria de aparecer em foto recebendo pedido de impeachment de ministros do STF. Por isso, esse líder diz que vai agir para achar um "denominador comum".
Bolsonaro anunciou neste sábado (14) que vai ingressar com pedido de abertura de processo no Senado contra os ministros Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso, do STF. Barroso também preside o TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
O anúncio aconteceu um dia após a prisão, por determinação de Moraes, do aliado político Roberto Jefferson, ex-deputado e presidente nacional do PTB.
"Todos sabem das consequências, internas e externas, de uma ruptura, a qual não provocamos e desejamos", escreveu o presidente em sua rede social."
"De há muito, os ministros Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, extrapolam com atos os limites constitucionais. Na próxima semana, levarei ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, um pedido para que instaure um processo sobre ambos, de acordo com o art. 52 da Constituição Federal", completou.
O artigo mencionado prevê que cabe ao Senado a competência de processar e de julgar os ministros do Supremo nos crimes de responsabilidade.
A crise entre Bolsonaro e os dois ministros está ligada aos ataques do presidente contra as urnas eletrônicas, o sistema eleitoral brasileiro e as instituições.
Barroso assinou uma queixa-crime contra o chefe do Executivo e recebeu o aval do plenário da corte eleitoral para enviá-la ao STF. Moraes, por sua vez, incluiu Bolsonaro como investigado no inquérito das fake news, além de ter determinado a prisão de bolsonaristas.
Os senadores são praticamente unânimes ao considerar que o pedido de abertura de processo contra Barroso e Moraes serve apenas como uma resposta retórica para os eventos recentes, em particular a prisão de Jefferson e a abertura de inquéritos contra o próprio presidente pelo Supremo.
Um aliado de Pacheco lembra que o pedido vai entrar em uma fila atrás de outras 17 iniciativas de abertura de investigação contra os ministros do Supremo. Já há 10 pedidos contra Moraes e 5 contra Barroso -alguns pedidos, no entanto, solicitam a abertura de processos contra mais de um ministro.
Essa fila de pedidos se refere a apenas os ingressados neste ano, após a posse de Pacheco como presidente do Senado, em fevereiro. Antes de deixar o cargo, Davi Alcolumbre (DEM-AP) arquivou todos os existentes até então.
Além disso, lembra o difícil caminho desses pedidos dentro do Senado. A primeira barreira está no próprio Pacheco, que esse senador lembra ser um "garantista" que não se deixaria pressionar por "reações no calor do momento".
Caso decida ler a denúncia em um expediente de sessão plenária, o que parece ser improvável, a questão passaria ainda por uma comissão especial, que analisaria o parecer de um relator. Além da comissão, esse parecer precisaria ser aprovado em plenário, para apenas então o Senado que a denúncia é passível de deliberação.
"Bolsonaro prometeu ao presidente do STF que ia se conter e ajudar a reduzir a crise entre os Poderes. Promessas inúteis porque isso faz parte do DNA dele. Quando um incêndio começa a se apagar ele aparece pra jogar mais álcool no fogo", afirma o líder da minoria, Jean Paul Prates (PT-RN).
"O pedido de impeachment, que ainda é apenas um balão de ensaio dos muitos que ele solta por aí, não vai ter tramitação fácil no Senado. Bolsonaro sabe que isso nunca vai ser aprovado lá no Senado, mas quer a temperatura alta pra jogar com a simpatia da minoria que ainda o apoia."
Senadores lembram que, ao contrário da Câmara, as pautas e interesses bolsonaristas vêm enfrentando resistência no Senado. Apenas as matérias ligadas a questões econômicas avançam.
Por outro lado, os parlamentares consideram difícil que o presidente da República não faça "barulho" com o seu pedido de abertura de processo nos próximos dias.
Pacheco estaria em uma situação difícil, pois não conseguiria e não desejaria criar um mal-estar recusando a visita do presidente para entregar em mãos o documentos.
"Não parece razoável que o presidente do Senado se recuse a receber um documento das mãos do presidente da República. Certamente ele [Pacheco] fará a análise técnica dessa documentação e o resultado provável será o arquivamento", afirma o líder do Cidadania, Alessandro Vieira (Cidadania-SE).
Aliados de Pacheco afirmam que o pior cenário seria um deslocamento sem prévio arranjo de Bolsonaro ao Senado, em um dia de grande movimentação na Casa.
Além das sessões plenárias, a CPI deve chamar grande atenção na quarta-feira, quando haverá uma acareação entre o atual ministro do Trabalho, Onyx Lorenzoni, e o deputado federal Luis Miranda (DEM-DF).
No entanto, consideram mais provável que haja uma interlocução, por parte dos líderes do governo ou do atual ministro chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira.
Esses devem atuar para mostrar que poderia haver uma insatisfação no Senado com a visita para entregar o pedido, além de desagradar Pacheco, que mantém atuação mais apaziguadora, apenas se manifestando em momentos mais extremos. A avaliação, por outro lado, é que pedidos de moderação costumam ser ignorados pelo Planalto.
A reação à iniciativa de Bolsonaro chama a atenção, considerando que o Senado se tornou no início da atual legislatura um dos focos de oposição ao Supremo.
Uma das bandeira do movimento Muda Senado – que ganhou proeminência nos primeiros anos, embora tenha perdido força – era a investigação das ações do Judiciário, através do pedido de CPI da Lava Toga, que nunca foi instalada, além do pedido de impeachment de ministros do STF.
Mesmo parlamentares que apresentaram pedidos de abertura de processo contra os ministros, porém, agora afirmam que o contexto atual é outro e que o presidente busca apenas desviar o foco dos problemas enfrentados, notadamente a atuação da CPI da Covid e os números ainda altos de afetados pela pandemia, além do desemprego e inflação.
Em caso de crime de responsabilidade
Quais são os crimes de responsabilidade de um ministro do STF?
Como nunca houve um caso do gênero, a legislação não é clara sobre os detalhes de como um processo por crime comum deveria ser iniciado. Mas tanto o STF, a PGR (Procuradoria-Geral da República) e especialistas entendem que a investigação e eventual denúncia deveria ficar a cargo da PGR, encarregada de pedir diligências e coletar provas na fase de inquérito
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