A tentativa de trégua ofertada pelo governo Jair Bolsonaro ao Supremo Tribunal Federal (STF) foi recebida com frieza e ceticismo pela corte.
Na sexta-feira (19), três ministros da área jurídica foram ao encontro de Alexandre de Moraes, relator de dois inquéritos que tiram o sono do Planalto e alvo constante da militância radical bolsonarista.
Um deles é o das fake news, que alimenta apuração sobre o mesmo tema que poderá resultar no julgamento de cassação da chapa presidencial. Outro, o dos atos antidemocráticos que apoiam o presidente.
Houve dois erros por parte da comitiva enviada a São Paulo, formada pelos ministros André Mendonça (Justiça), Jorge de Oliveira (Secretaria-Geral) e José Levi do Amaral (Advocacia-Geral da União).
Primeiro, na avaliação de ministros da corte, eles deveriam ter procurado o presidente do Supremo, Dias Toffoli, se a intenção era a de uma trégua institucional.
Ao falar com Moraes, eles se comportaram como advogados de defesa do presidente, o que causou contrariedade no presidente do Supremo.
O segundo equívoco era de origem: a troika não tinha como garantir que os ataques por parte do presidente e, principalmente, por seus aliados, teria como de fato acabar.
Com tudo isso, o encontro seguiu com cordialidade e promessas de tentativa de tranquilização de ânimos, sempre em termos genéricos, mas só.
Segundo a reportagem ouviu de membros do governo, os ministros tiveram a impressão de que Moraes ouviu com indiferença a proposta de apaziguamento do trio.
A questão central já não é mais os ataques, físicos até, contra o Supremo. Isso, para membros do tribunal, já está contemplado pelas investigações e prisões recentes.
O limite do conflito institucional já havia sido ultrapassado, e, para observadores, não há acomodação possível.
Pode haver descobertas de ligação de membros do Executivo com a estrutura dos atos antidemocráticos e a propagação de fake news.
O celular apreendido com um dos autores do ataque com fogos de artifício ao Supremo pode revelar ligações comprometedoras.
A prisão de Fabrício Queiroz, o ex-faz-tudo do clã Bolsonaro, consolida esse cenário.
Embora o Supremo nada tenha a ver com a apuração do Ministério Público do Rio, o caso aperta o torniquete judicial sobre o presidente.
Segundo pesquisas qualitativas nas mãos de adversários de Bolsonaro, cerca de metade dos 30% que apoiam o presidente mudariam de ideia se houver corrupção envolvendo sua família.
Se o cálculo estiver certo, isso derrubaria o apoio a Bolsonaro para o nível considerado perigoso para a abertura de processos de impeachment.
Na lógica desses opositores, isso poderá acontecer, alimentando a tempestade perfeita em que o governo está enredado: os mais de 50 mil mortos da Covid-19, a crise econômica à espreita e a balbúrdia política.
Com isso, Bolsonaro teria até agosto ou setembro, quando atores políticos estimam que o pior da pandemia terá passado, para reagir.
Poderá então haver um incremento de pressão nas ruas, que ainda registram protestos tímidos de lado a lado, como neste domingo (21), e Brasília passará a funcionar.
Até aqui, Bolsonaro agiu de forma convencional, atraindo apoio de votos do centrão e outros com cargos.
Segundo líderes do grupo, não parece algo que resista a revelações graves contra a família presidencial.
O tempo corre contra o presidente, que tem se mostrado abatido segundo aliados.
Não só ele: a apatia de Paulo Guedes, o outrora superpoderoso ministro da Economia, tem chamado a atenção na Esplanada.
A atuação errática dos últimos dias se refletiu na operação para tirar Abraham Weintraub do Brasil com um passaporte diplomático. Mesmo que o ex-ministro da Educação não estivesse sob ameaça de prisão, a impressão foi a de uma fuga orquestrada.
Restam enfim os militares do governo, incomodados com a associação a um presidente questionado eticamente. Seus passos estão sendo escrutinados por todo o mundo político neste momento.
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