O governo de São Paulo pretende iniciar a vacinação com a Coronavac na segunda-feira (18). Ao mesmo tempo, quer encerrar a atual disputa com o Ministério da Saúde acerca da propriedade da vacina contra a Covid-19.
No plano da Secretaria da Saúde, com a aprovação por uso emergencial pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), a imunização deve começar por profissionais da saúde em hospitais da capital.
A distribuição de doses para outras cidades, que já receberam em muitos casos seringas, envolve uma logística com 30 caminhões.
Estimada em R$ 5,8 milhões, ela teve o custo reduzido para R$ 3,6 milhões porque duas empresas de transportes rápido, a líder de mercado Braspress e a West Cargo, aceitaram fazer o serviço de graça.
Ainda falta a divulgação de diversos detalhes, o que deverá ser feito pelo governo.
Já segunda meta da gestão João Doria (PSDB-SP), neutralizar o conflito com o governo federal sobre as doses da Coronavac e evitar acusações de provincianismo, foi mais acidentada.
Desde que ficou evidente o fracasso do plano da Saúde de trazer da Índia 2 milhões de doses de outro imunizante sob análise emergencial da Anvisa, da AstraZeneca/Universidade de Oxford, o governo federal mirou as vacinas que o presidente Jair Bolsonaro desdenhava como as "chinesas do Doria".
Bolsonaro e Doria são rivais políticos e prováveis adversários na disputa presidencial de 2022, e antagonistas no manejo da pandemia desde o começo: o tucano focando esforços contra a crise e o presidente, a minimizando.
O valor político da primeira foto da vacinação, contudo, era óbvio. A Saúde requisitou, na sexta e no sábado, que o Butantan entregasse as 6 milhões de doses em sua posse -há mais quase 5 milhões em preparação para envase.
Dessas 6 milhões, que foram o objeto da análise da Anvisa neste domingo, cerca de 4,5 milhões já estão rotuladas e prontas para uso. O restante está sendo embalado.
A alegação é que ambas as partes assinaram contrato para a entrega das doses, após a inclusão da Coroanvac no plano nacional de vacinação. O instituto paulista, que promoveu uma das fases finais de testes do imunizante e irá produzi-lo localmente, refutou.
Disse que primeiro a Coronavac deveria estar aprovada, uma obviedade, mas cobrou um plano de distribuição nacional da vacina, separando as doses por estado. Nas campanhas usuais de imunização, isso é feito com base em divisão demográfica.
São Paulo tem 44 milhões de habitantes, pouco mais de 20% da população nacional. Em número de casos de Covid-19, tem 19% do total brasileiro, e quase 24% das mortes pela doença no país.
Só que a Saúde, para contrariedade de secretários estaduais reunidos na sexta, não passou tais números. Com isso, o Butantan respondeu que precisaria saber quantas doses ficarão em São Paulo para repassá-las diretamente ao Centro de Distribuição e Logística da Secretaria da Saúde.
O centro fica próximo ao aeroporto de Guarulhos, assim como a unidade semelhante do ministério, famosa por ter um estoque de milhões de testes de Covid-19 ameaçados de vencimento.
Assim, São Paulo reteria para si cerca de 20% das doses disponíveis, segundo contrato 6 milhões até 31 de janeiro e 46 milhões no primeiro trimestre. Há ainda opção por outras 54 milhões de vacinas.
O tucano publicou no Twitter, no começo da tarde deste domingo, que havia decidido enviar as doses para os outros estados e Distrito Federal, por meio do Ministério da Saúde, assim que fosse notificado da autorização do uso da Coronavac.
Mas não citou a separação da cota. Isso foi aclarado na entrevista coletiva do governo paulista, mais tarde, quando o diretor do Butantan, Dimas Covas, afirmou que recebera na hora do almoço a divisão por estado e que disse ao ministério que não iria entregar o reparte paulista.
Em sua própria entrevista, o ministro Eduardo Pazuello (Saúde) afirmou que começaria a distribuição nesta segunda cedo, com um critério de divisão por estado que levaria em conta a gravidade da pandemia na região.
Naturalmente, aqui o temor era o expresso por autoridades paulistas: de que o governo Bolsonaro retirasse a autonomia paulista sobre a vacinação com o imunizante no qual Doria apostou todas suas fichas.
Tudo se deve à acirrada disputa entre Bolsonaro e Doria, que teve lances na "guerra da vacina" como a suspensão dos testes da Coronavac pela Anvisa, sem aviso ao Butantan. Usualmente, São Paulo sempre começa campanhas nacionais de vacinação, por ser um dos principais centros produtores, quando não as antecipa.
Há também a questão do dinheiro: São Paulo comprometeu US$ 90 milhões (quase R$ 500 milhões) para comprar 46 milhões de doses chinesas e adquirir a tecnologia para produção no Butantan.
Em Brasília, Pazuello repetiu várias vezes que, a partir do contrato assinado na primeira semana do ano, as vacinas são suas. Ocorre que a União ainda não pagou por elas.
Assim, a ideia em São Paulo é dar uma mostra de boa vontade e evitar acusações de que está agindo só para si mesmo, mas garantindo sua parte no bolo das vacinas.
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