O STF (Supremo Tribunal Federal) realiza nesta quarta-feira (20) o julgamento do deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ), com expectativa de condenação, mas também com risco de adiamento. O caso é desdobramento dos chamados atos democráticos, inquérito que colocou sob a mira do tribunal alguns dos principais aliados do presidente Jair Bolsonaro (PL).
Silveira foi denunciado pela PGR (Procuradoria-Geral da República) sob a acusação de ameaçar integrantes da corte em redes sociais. Ele elegeu como alvo preferencial o ministro Alexandre de Moraes, relator de apurações que desagradam ao bolsonarismo. O resultado do julgamento pode tirar Silveira da corrida eleitoral. Filiado ao PTB de Roberto Jefferson, ele articula candidatura ao Senado. Jefferson também é alvo de investigações sob a responsabilidade do ministro Moraes.
Em abril de 2021, quando recebeu a denúncia da PGR e abriu o processo penal, o tribunal foi unânime contra o parlamentar. A tendência na corte se mantém, mas um pedido de vista (mais tempo para estudar o caso) pode deixar o caso em suspenso, como mostrou a coluna Painel, da Folha.
Ministros avaliam antecipar seus votos no julgamento caso André Mendonça, um dos integrantes da corte indicados por Bolsonaro, peça vista da ação penal, adiando o veredito. Qualquer magistrado pode pedir mais tempo para analisar os autos, incluindo Kassio Nunes Marques, o outro integrante indicado por Bolsonaro. Porém Kassio cumpre a função de revisor, a quem compete sugerir medidas para sanar omissões ou inconsistências. Isso reduz margem para alegar desconhecimento.
A análise da ação penal começará pela leitura do relatório com informações do andamento processual. Na sequência, serão ouvidas as sustentações da PGR e da defesa. Cada parte tem uma hora. Em seguida, Moraes e Kassio votam. Depois será a vez de Mendonça, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e do presidente do STF, Luiz Fux. Em caso de condenação, o tempo de pena será analisado ao final.
De acordo com a acusação da Procuradoria, Silveira defendeu, em duas ocasiões, o emprego de violência e grave ameaça para tentar impedir o livre exercício do Legislativo e Judiciário e, ao menos uma vez, instigou a animosidade entre as Forças Armadas e o STF. Entre outras manifestações, segundo a PGR, defendeu o retorno do AI-5, instrumento da ditadura militar, para promover a cassação de ministros da corte. E incitou a população a invadir o tribunal.
As atitudes de Silveira foram enquadradas pela Procuradoria em duas legislações distintas. Parte foi classificada como crime de coação no curso do processo, conduta previsto no artigo 344 do Código Penal. A pena pode chegar a quatro anos, mais pagamento de multa. Outras duas imputações (incitação de animosidade entre as Forças Armadas e instituições civis e incitação de violência para impedir o livre exercício dos poderes da União) são condutas previstas nos artigos 18 e 23 da LSN (Lei de Segurança Nacional).
Criada durante o regime militar, a LSN acabou sendo revogada em setembro do ano passado. Com isso, Silveira não poderá ser punido por essas acusações.
O próprio presidente Jair Bolsonaro já admitiu a gravidade das falas do deputado, embora faça ataques ao STF devido à prisão de seu aliado. "Se eu achar que você está fazendo alguma coisa de errado, vou para a Justiça. Agora, outra coisa: a pena nunca é cadeia, nunca é a privação de liberdade. Nunca."
"Você assistiu ao deputado federal preso pelo ministro Alexandre de Moraes. No meu entender o que ele falou é grave, não gostaria que ele falasse aquilo de mim, mas não é prendendo o deputado federal ou um cidadão qualquer que você vai melhorar as informações do nosso Brasil", afirmou Bolsonaro à CNN Brasil no último sábado (16), quando esteve no litoral paulista.
Nesta terça (19), após uma série de recursos apresentados nas últimas semanas, a defesa de Silveira buscava meios de ainda tentar adiar a sessão que definirá o futuro político do aliado de Bolsonaro. Em um novo pedido à corte, o deputado argumentou que o caso não está pronto para ser julgado em razão de uma série de pendências nos autos, incluindo recursos não analisados contra a decisão da corte que deu início ao processo.
Representante do deputado, o advogado Paulo César Rodrigues de Faria afirmou que há "razões para duvidar da lisura e imparcialidade de quaisquer atos praticados pelos nove ministros". Ele alega que os ministro do Supremo cometeram "graves ofensas" às prerrogativas da defesa, ao devido processo legal e ao contraditório. "Há violações ao devido processo legal e ampla defesa, com imposição de medidas cautelares alheias ao ordenamento jurídico, e de encontro a ele, violando a dignidade da pessoa humana e prerrogativa parlamentar", disse.
Entre outros pontos destacados, o criminalista frisou a "necessidade premente de notificar a Câmara dos Deputados para deliberar sobre as medidas cautelares impostas" pelo Supremo a seus integrantes, em violação a um entendimento do próprio tribunal.
Na véspera do julgamento, Alexandre de Moraes rejeitou recursos da defesa e impôs multa ao advogado do parlamentar. Segundo o ministro, a defesa do deputado agiu de má-fé ao protocolar diversos recursos a fim de adiar o julgamento e configurou "abuso do direito de recorrer", o que permite aplicação de multa — essa foi fixada em R$ 2.000.
No final de março, a situação de Silveira se agravou. Ele passou a figurar como investigado em um inquérito por desobediência a decisão judicial. O parlamentar se recusou a cumprir uma ordem de Moraes, classificada pelo deputado de ilegal, de usar tornozeleira eletrônica. O ministro também o proibiu de sair do Rio de Janeiro e de participar de eventos públicos, com exceção de viagens a Brasília, para exercício do mandato.
A medida foi imposta a ele após o parlamentar descumprir restrições anteriores definidas por Moraes. Silveira participou de um ato de ativistas conservadores em São Paulo, onde manteve contato com outros investigados do inquérito do STF sobre milícias digitais.
Ao negar o uso da tornozeleira, Silveira adotou o plenário da Câmara como moradia enquanto aguardava a mesa diretora da Casa pautar a votação sobre a manutenção ou derrubada da ordem. O superintendente da PF no Distrito Federal, Victor Cesar Carvalho dos Santos, e agentes da Polícia Penal foram ao Congresso Nacional para tentar colocar tornozeleira no parlamentar, mas acabaram deixando o local sem cumprir a ordem do ministro.
No dia 31, o parlamentar cedeu, após Moraes estabelecer multa diária de R$ 15 mil caso continuasse a se negasse a receber o equipamento de monitoramento. Horas antes, Silveira foi ao Planalto para participar da cerimônia da troca de ministro.
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