O STJ (Superior Tribunal de Justiça) formou nesta quarta-feira (2) a maioria necessária para manter o afastamento de Wilson Witzel do Governo do Rio de Janeiro por seis meses. Apenas um ministro votou contra. Outros 14 foram favoráveis ao afastamento.
Ele foi denunciado por corrupção pela PGR (Procuradoria-Geral da República) e é acusado de participar de um esquema de desvio de recursos públicos que seriam destinados ao combate à pandemia do novo coronavírus.
Na sexta-feira (28), Benedito Gonçalves retirou o chefe do Executivo fluminense do cargo.
A corte especial do STJ é composta pelos 15 magistrados mais antigos do tribunal. O afastamento de Witzel dependia de maioria qualificada (dois terços). Apenas o ministro Napoleão Nunes Maia divergiu e votou para manter Witzel à frente do governo.
Com a decisão, o vice-governador Cláudio Castro (PSC), que também é investigado e tem se aproximado da família do presidente Jair Bolsonaro, inimiga de Witzel, seguirá no comando do Rio de Janeiro.
O despacho da sexta atendeu a pedido da PGR, que denunciou Witzel e outras oito pessoas, incluindo a primeira-dama Helena Witzel. A Procuradoria também havia pedido a prisão do governador, mas Gonçalves negou.
O recebimento da denúncia e a abertura de ação penal ainda não têm data para serem discutidas.
A PGR acusa Witzel de ter recebido R$ 554,2 mil em propina por intermédio do escritório de sua mulher.
Do montante, R$ 274,2 mil teriam sido repassados pelo empresário Mário Peixoto, que tem contratos com o Executivo do Rio de Janeiro.
Os outros R$ 280 mil, segundo a Procuradoria, foram pagos pelo Hospital Jardim Amália, que pertence à família de Gothardo Lopes Netto, médico e ex-prefeito de Volta Redonda.
Relator do caso, Gonçalves afirma que a quebra do sigilo telemático de Witzel permitiu identificar dois emails enviados à mulher, Helena, com o contrato de prestação de serviços do escritório de advocacia com o hospital.
O ministro afirmou que há um grupo criminoso instalado no Governo do Rio de Janeiro que "continua agindo, desviando e lavando recursos em plena pandemia, sacrificando a saúde e mesmo a vida de milhares de pessoas".
Napoleão Nunes Maia divergiu. "Vai dizer agora depois de afastado, vilipendiado, depois de jogado na sarjeta da desgraça política?", ponderou.
Maia defendeu que "os políticos é que devem cuidar das coisas da política" e que os magistrados devem "cuidar das coisas da Justiça".
Nancy, por sua vez, destacou que os elementos presentes nos autos demonstraram que está em curso uma "organização criminosa" e evidenciaram a "existência de relações espúrias entre o empresariado e o governo estadual, sobretudo na área de saúde".
"A situação da pandemia tem sido aproveitada para dar continuidade a atos criminosos", afirmou.
Laurita, por sua vez, destacou que "há fortes evidências do cometimento de crimes gravíssimos" e que em todo o esquema há indícios da "ocorrência de corrupção ativa e passiva, organização criminosa e lavagem de capitais, com veementes indícios de autoria".
Já Falcão ressaltou o momento delicado vivido pelo país por causa da pandemia do novo coronavírus.
"No momento em que vivemos, numa pandemia, onde já tivemos mais de 120 mil vítimas, é impossível que alguém que esteja sendo acusado e investigado possa continuar exercer um cargo tão importante", disse.
Maria Thereza acompanhou a maioria, mas que o afastamento deveria ser tratado pelo colegiado e que "a decisão não deveria ter sido monocrática".
"Trata-se de governador eleito com mais de 4 milhões e 600 mil votos. Embora haja possibilidade, como fez o relator, acredito que, em se tratando de afastamento de autoridade com foro, a submissão da matéria à corte especial constitui a medida de prudência", disse.
Na denúncia, a PGR disse que o desvio de verbas públicas também teria ocorrido de outras formas e beneficiados outras pessoas.
A Procuradoria afirma que o escritório não tinha nenhum outro funcionário e que, do montante, R$ 74 mil foram repassados diretamente para o governador.
Além do afastamento, na última sexta Gonçalves também determinou mandados de buscas e apreensões contra o vice-governador e o presidente da Assembleia Legislativa do Rio, André Ceciliano (PT).
Os policiais ainda prenderam o presidente nacional do PSC, Pastor Everaldo, e Lucas Tristão, ex-secretário estadual de Desenvolvimento Econômico e braço direito do governador. Everaldo teve a prisão prorrogada na última terça-feira (1) por Benedito Gonçalves e Tristão segue detido.
A operação autorizada por Gonçalves cumpriu 17 mandados de prisão, sendo 6 preventivas e 11 temporárias, além de 83 mandados de busca e apreensão.
A operação foi batizada Tris in Idem, em referência ao fato de se tratar do terceiro governador que usa esquemas ilícitos semelhantes no desvio de verbas públicas. Os outros dois seriam Luiz Fernando Pezão e Sérgio Cabral.
Essa foi a terceira ação da PF em busca de elementos sobre os crimes supostamente cometidos. O caso iniciou em primeira instância, no âmbito da Lava Jato do Rio de Janeiro, e a primeira operação ocorreu em maio.
Na ocasião, um dos principais alvos foi o empresário Mário Peixoto, dono de empresas com vários contratos de fornecimento de mão de obra com o governo estadual desde o governo de Cabral.
Naquela oportunidade, também foi detido o ex-deputado Paulo Melo, também acusado de integrar o grupo criminoso.
Depois da primeira fase, a Lava Jato do RJ enviou um ofício à PGR, responsável por investigar governadores, para informar das menções a Witzel que haviam sido encontradas.
Representantes da PGR, então, passaram a investigar o chefe do Executivo fluminense. Pouco mais de dez dias depois, em 26 de maio, a pedido da PGR, o ministro Gonçalves determinou a deflagração de mais uma operação para aprofundar as apurações sobre os desvios em contratos da saúde no RJ.
Foram cumpridos 12 mandados de busca e apreensão, entre eles um no Palácio das Laranjeiras, residência oficial do governador.
A casa onde Witzel morava antes de ser eleito, no Grajaú, e o escritório de advocacia do governador, que é ex-juiz federal, também foram alvos das buscas.
Na ocasião, gerou polêmica o fato de a deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP), uma das principais aliadas de Bolsonaro, ter dado declarado um dia antes que a PF estava prestes a deflagrar operações contra desvios na área da saúde nos estados.
"A gente deve ter nos próximos meses o que a gente vai chamar talvez de Covidão, ou de, não sei qual é o nome que eles vão dar, mas já tem alguns governadores sendo investigados pela Polícia Federal", afirmou a deputada, que depois negou ter tido acesso a qualquer informação privilegiada.
Eleito com apoio do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), Witzel se afastou da família do presidente já no primeiro ano de mandato. Um dos motivos do desentendimento foi o desejo de Witzel de disputar a Presidência da República em 2022, o que irritou Bolsonaro.
Na última sexta, além de Everaldo, também foram presos Lucas Tristão, ex-secretário de Desenvolvimento Econômico; Gothardo Netto, médico e ex-prefeito de Volta Redonda; os filhos de Everaldo, Filipe Pereira e Laercio Pereira; e os empresários Alessandro Duartee Cassiano Luiz.
Além disso, também foram alvos de busca e apreensão o vice-governador, Cláudio Castro, o desembargador do Trabalho Marcos Pinto da Cruz, o presidente da Alerj André Ceciliano (PT) e o secretário da Casa Civil, André Moura.
Os investigadores afirmam que a organização social Iabas foi contratada de forma emergencial pelo Executivo do RJ para construir sete hospitais de campanha e que o contrato estaria cercado de irregularidades.
Os contratos investigados tratariam da contratação dos hospitais de campanha e da compra de respiradores e de medicamentos para o enfrentamento da pandemia.
A PGR afirma que os investigados formaram um esquema de propina nas contratações emergenciais e na liberação de pagamentos a organizações sociais que prestam serviço ao governo.
Os procuradores classificam a relação profissional da primeira-dama como advogada com empresários com contratos com o Executivo como um "vínculo bastante estreito e suspeito".
Na denúncia, a PGR cobra de Witzel uma reparação de R$ 1,1 milhão aos cofres públicos. Esse ponto, porém, será discutido apenas no momento da decisão sobre condenação ou não do chefe do Executivo.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta