O TSE (Tribunal Superior Eleitoral) decidiu nesta quinta-feira (22), por unanimidade, rejeitar um pedido de Jair Bolsonaro (PL) para barrar uma propaganda da campanha do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) que replica reportagem do UOL sobre a negociação de ao menos 51 imóveis pelo atual presidente e familiares dele. As transações foram total ou parcialmente feitas com dinheiro em espécie.
No dia 8 de setembro, o ministro Paulo de Tarso Sanseverino rejeitou um pedido de Bolsonaro para suspender a exibição da peça, decisão agora referendada pelos colegas. Para os magistrados, a reportagem, replicada por Lula, não transmite "informação gravemente descontextualizada" nem é "suportada por fatos sabidamente inverídicos".
"A publicidade questionada se baseia, conforme reconhece a própria representante, em matéria jornalística divulgada na imprensa pelo portal UOL, na data de 30.8.2022, de modo que a veiculação impugnada não transmite, como alegado, informação gravemente descontextualizada ou suportada por fatos sabidamente inverídicos", afirmou o ministro.
Durante a sessão, Sanseverino reafirmou seus argumentos da decisão e foi acompanhado de forma unânime pelos demais ministros, que não proferiram votos próprios.
O advogado Tarcísio Vieira de Carvalho, que representa a campanha de Bolsonaro, porém, afirmou que o PT cometeu um erro na propaganda que cita a matéria publicada pelo UOL.
Ele disse que, diferentemente do que dá a entender a peça, a família Bolsonaro não pagou R$ 25,6 milhões em dinheiro vivo — em valores atualizados — para a compra de imóveis. Na verdade, esse número corresponde ao valor do total das transações de imóveis com uso total ou em parte de dinheiro vivo, com correção monetária.
"Seria só esse fato. Um fato que entendemos de bom tom submeter ao descortino da Corte", afirmou Tarcísio. Os ministros, porém, mantiveram o entendimento para manter a propaganda.
O UOL apurou que, desde os anos 1990 até os dias atuais, o presidente, irmãos e filhos negociaram 107 imóveis, dos quais pelo menos 51 foram adquiridos total ou parcialmente com uso de dinheiro vivo, segundo declaração dos próprios integrantes do clã.
A reportagem confirmou com oficiais de cartórios a padronização da "compra em moeda corrente" para se referir a vendas realizadas em espécie, mencionadas de forma distinta às vendas realizadas por meio de cheque ou transferência bancária que aparecem especificadas em várias outras compras.
Nas transações de maior valor, confirmou com os próprios vendedores o uso de dinheiro em espécie na compra de imóveis.
As compras registradas nos cartórios com o modo de pagamento "em moeda corrente nacional", expressão padronizada para repasses em espécie, totalizaram R$ 13,5 milhões. Em valores corrigidos pelo IPCA, este montante equivale, nos dias atuais, a R$ 25,6 milhões.
Não é possível saber a forma de pagamento de 26 imóveis, que somaram pagamentos de R$ 986 mil (ou R$ 1,99 milhão em valores corrigidos) porque esta informação não consta nos documentos de compra e venda. Transações por meio de cheque ou transferência bancária envolveram 30 imóveis, totalizando R$ 13,4 milhões (ou R$ 17,9 milhões corrigidos pelo IPCA).
Qual o problema de pagar em dinheiro vivo? O uso de dinheiro em espécie para transações imobiliárias pode indicar operações de lavagem de dinheiro ou ocultação de patrimônio. O Senado discute um projeto de lei que sugere a proibição desse tipo de operação, mas o texto está travado há quase um ano, aguardando a designação de relator para que tramite na CCJ (Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania).
25 negócios levaram a investigações. Ao menos 25 deles foram comprados em situações que suscitaram investigações do Ministério Público do Rio e do Distrito Federal. Neste grupo, estão aquisições e vendas feitas pelo núcleo do presidente, seus filhos e suas ex-mulheres não necessariamente com o uso de dinheiro vivo, mas que se tornaram objeto de apurações como, por exemplo, no caso das "rachadinhas" (apropriação ilegal de salários de funcionários de gabinetes).
Antes da publicação da reportagem, o UOL perguntou ao presidente Jair Bolsonaro, por meio de sua assessoria, qual a razão da preferência da família pelas transações em dinheiro, mas ele não se manifestou.
1.105 páginas de 270 documentos. O levantamento considera o patrimônio construído no Rio de Janeiro, em São Paulo e em Brasília pelo presidente, seus três filhos mais velhos, mãe, cinco irmãos e duas ex-mulheres.
Nos últimos sete meses, a reportagem do UOL consultou 1.105 páginas de 270 documentos requeridos a cartórios de imóveis e registros de escritura em 16 municípios, 14 deles no estado de São Paulo. Percorreu pessoalmente 12 cidades para checar endereços e a destinação dada aos imóveis, além de consultar processos judiciais.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta