A destruição nos prédios dos Três Poderes em Brasília (DF) no domingo (8) está vastamente documentada em vídeos, fotos e relatos, muitos deles feitos e divulgados pelos próprios vândalos. Passada a onda de violência, além de presos e processados, muitos poderão acabar também demitidos por justa causa, dizem advogados especializados na área.
Nesse tipo de dispensa por falta grave, o empregado é desligado sem direito à multa de 40% sobre o FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço), saldo de férias e 13º proporcionais ou aviso prévio. Também não acessa o seguro-desemprego.
Para o advogado Jorge Matsumoto, sócio do escritório Bichara, a demissão por justa causa é "plenamente cabível" por se tratar de ofensa ao patrimônio e à ordem públicos.
"Embora o comportamento desse indivíduo não tenha sido no estabelecimento da empresa, ele pressupõe medida drástica a ser tomada", afirma. "Valeria o mesmo para alguém que publicasse elementos nazistas ou pedofilia em uma rede social. É um comportamento que viola a fidúcia [confiança]."
A advogada Marta Alves, sócia do Galdino & Coelho, Pimenta, Takemi, Ayoub Advogados, recomenda cautela na adoção desse tipo de demissão.
Segundo ela, o empregador fica protegido se optar pela dispensa sem justa - aquela em que o trabalhador recebe a multa do Fundo de Garantia e os saldos de 13º e férias. A demissão comum de um funcionário que tenha participado dos atos golpistas não poderia, portanto, ser caracterizado como um dispensa discriminatória.
"O empregador não é obrigado a explicar, mas, ainda que houvesse a necessidade, a participação justifica a demissão, quando ele [patrão] entende que não compactua com aquilo e que não existe mais confiança naquela pessoa."
A demissão sem justa causa evita maiores dores de cabeça, diz o advogado Rodrigo Giostri, sócio do Sfera Law. Porém, o fato de muitas empresas estarem sendo expostas devido ao envolvimento de seus funcionários nos atos golpistas pode ser usado como motivo para a dispensa por justa causa.
"Pelo menos duas questões podem eventualmente dar justa causa pelos danos à reputação da empresa, que são o mau procedimento e o ato lesivo à honra", afirma. Esses dois motivos estão na lista da CLT (Consolidação de Leis do Trabalho) para as justificativas para uma rescisão de contato por justa causa.
Já para Marta Alves, o rol da CLT é taxativo, ou seja, não admite exceções ou interpretações. "A Justiça do Trabalho entende que atos praticados foram do âmbito da empresa não são afetados", diz.
Segundo a interpretação da advogada, mesmo que a empresa esteja sendo exposta a constrangimento, o funcionário não estava em horário de trabalho e não mencionou a companhia.
Mesmo o envolvimento em atividades reconhecidamente criminosas, como invasão, depredação e incitação ao crime não seria, na avaliação de Marta Alves, motivo para a dispensa por falta grave, pois a CLT prevê que isso só pode ser feito depois de uma condenação e quando o empregado não pode mais recorrer.
Giostri, do Sfera Law, diz que as empresas poderiam ter garantias extras na adoção da demissão por justa causa se o veto à participação em atos radicais estiver prevista em um código de conduta. "Nesse caso, nem precisaria, mas é sempre uma segurança a mais", afirma. "As manifestações de domingo foram muito além. Tem invasão, violência e não há muita dúvida de que foram práticas criminosas."
Para José Carlos Wahle, sócio trabalhista do Veirano Advogados, antes de decidir pela justa causa, o empregador deve avaliar a proporcionalidade da participação daquele funcionário nos atos de vandalismo.
A advogada Marta Alves, do Galdino & Coelho, Pimenta, Takemi, Ayoub, considera mais grave a situação de servidores públicos flagrados entre os manifestantes de extema-direita que deixaram rastro de destruição em Brasília no domingo.
Entre as hipóteses para demissão desses funcionários do Estado estão a lesão aos cofres públicos ou a dilapidação do patrimônio público. "Nesse caso, comprovado que ele participou desses atos, pode ser demitido após processo administrativo."
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