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Veja o que liga Bolsonaro ao caso da venda de joias e presentes do governo

Veja o que liga Bolsonaro ao caso da venda de joias e presentes do governo

Conversas com auxiliar, diálogo com chefe da Receita e ausência de movimentação financeira estão entre evidências reunidas pela PF

Publicado em 9 de julho de 2024 às 11:58

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JOSÉ MARQUES E CONSTANÇA REZENDE

BRASÍLIA - Uma mensagem a Mauro Cid após acesso a um link, ausência de movimentação financeira nos Estados Unidos e menções feitas por auxiliares são as principais evidências reunidas pela Polícia Federal para ligar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ao caso das negociações de joias e presentes recebidos pelo governo brasileiro.

Após a revelação de detalhes do relatório da investigação policial na segunda-feira (8), a defesa de Bolsonaro não respondeu aos detalhes mencionados no inquérito.

Seus advogados disseram apenas que, assim que instado pelo TCU (Tribunal de Contas da União), ele entregou de forma espontânea os presentes à corte.

O ex-presidente da República Jair Bolsonaro
O ex-presidente da República Jair Bolsonaro. (Tãnia Rêgo/Agência Brasil)

A PF protocolou na sexta-feira (5), no STF (Supremo Tribunal Federal), os documentos do indiciamento do ex-presidente e de mais 11 pessoas na investigação sobre a venda de joias recebidas de presente pelo governo brasileiro.

O ex-presidente é suspeito dos crimes de associação criminosa (com previsão de pena de reclusão de 1 a 3 anos), lavagem de dinheiro (3 a 10 anos) e peculato/apropriação de bem público (2 a 12 anos).

A PGR analisa agora se denuncia o ex-presidente. Se isso ocorrer, caberá depois à Justiça decidir se ele vira réu. Sua defesa foi procurada, mas não se manifestou sobre o relatório.

Segundo relatório enviado pela PF ao STF, um dos indícios de que Bolsonaro sabia da negociação de joias foi o acesso dele, em 4 fevereiro do ano passado, a um link de um leilão a um chamado "kit rosé".

Nesse kit, havia um relógio, um anel, abotoaduras e um terço confeccionados em ouro. O presente havia sido recebido pelo ex-ministro de Minas e Energia Bento Albuquerque em viagem oficial à Arábia Saudita. Após receber o link do leilão, Bolsonaro respondeu "selva" a Mauro Cid.

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) devolve estojo de joias sauditas
O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) devolve estojo de joias sauditas. (Divulgação)

"Selva" é uma forma de saudação comum no Exército, com um "ok" ou um "tudo certo", por exemplo, e que surgiu inicialmente em batalhões na Amazônia.

"Esta sequência apresentada: primeiro, o envio de link do leilão por Mauro Cid, segundo, o registro de acesso à página por meio de histórico e cookies por Jair Bolsonaro, em seu aparelho telefônico, e terceiro, a utilização da expressão 'Selva' reforçam a utilização deste jargão para confirmar a ciência, do ex-presidente, de que o kit ouro rosé fora exposto a leilão", disse a polícia.

A polícia ainda acrescentou que, no dia do leilão do kit rosé, Cid enviou ao contato do ex-presidente um link da rede social Facebook que provavelmente seria de uma transmissão ao vivo dos leilões da empresa Fortuna Auction e escreveu "daqui a pouco é o kit".

Há outra menção a mensagens trocadas entre Mauro Cid e Bolsonaro que tratam de presentes.

Pouco antes de o então presidente viajar com sua comitiva para os EUA, às vésperas da posse de Lula (PT) na Presidência, Cid pergunta sobre duas esculturas recebidas como presente: "O senhor vai trazer árvore e o barco?", diz Cid.

Bolsonaro envia duas mensagens, e as apaga na sequência. Cid responde: "Sim senhor". O material seguiu para os EUA, onde Cid tentou negociar a venda de ambos.

O documento da PF também cita o depoimento do general da reserva Mauro Lourena Cid, pai do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, em que este afirma que entregou US$ 68 mil ao ex-presidente, de forma fracionada, pela venda de relógios recebidos pela Presidência.

O general disse que seu filho solicitou que ele recebesse, em sua conta bancária nos Estados Unidos, os valores decorrentes de uma venda de bens de propriedade do então presidente. Em razão disso, ele teria disponibilizado sua conta bancária.

"O declarante disse que Mauro Cid relatou posteriormente que se tratava da venda de relógios de propriedade do então presidente Jair Bolsonaro. Ao ser questionado como se deu os repasses dos valores, Lourena Cid afirmou que os valores foram repassados de forma fracionada conforme a disponibilidade de encontros com o ex-presidente", disse.

Mauro Cid também afirmou, em depoimento do dia 28 de agosto de 2023, ter combinado com seu pai que o saque dos US$ 68 mil, decorrente da venda dos relógios, ocorreria de forma fracionada e que a quantia seria entregue à medida que alguém conhecido viajasse dos Estados Unidos ao Brasil.

"O colaborador enfatizou que o dinheiro seria entregue sempre em espécie de forma a evitar que circulasse no sistema bancário normal", disse a PF.

Outro trecho do relatório da PF menciona uma mensagem do ex-secretário da Receita Federal Julio Cesar Vieira Gomes a Mauro Cid em 31 de dezembro de 2022, quando Bolsonaro já estava nos Estados Unidos.

Ele pergunta se Cid avisou ao então presidente que eles iriam recuperar os bens. Mauro Cid responde: "Avisei".

A PF identificou, na análise das movimentações financeiras de Bolsonaro no Brasil e no exterior, que o ex-presidente não utilizou recursos depositados em suas contas bancárias para custear seus gastos nos EUA entre 30 de dezembro de 2022 e 30 de março de 2023.

"A utilização de dinheiro em espécie para pagamento de despesas cotidianas é uma das formas mais usuais para reintegrar o 'dinheiro sujo' à economia formal, com aparência lícita", disse a PF.

Joias avaliadas em R$ 16,5 milhões que seriam para a primeira-dama Michelle Bolsonaro
Joias avaliadas em R$ 16,5 milhões que seriam para a primeira-dama Michelle Bolsonaro. (Reprodução)

Há, ainda, presentes que o ex-presidente recebeu como chefe de Estado e entendeu como pessoais, sem registrar no Gabinete Adjunto de Documentação Histórica da Presidência. Um dos exemplos é um relógio que ele ganhou do rei do Bahrein.

"As joias foram levadas ao exterior em 08 de junho de 2022, por meio do avião presidencial, e vendidas em lojas especializadas nos Estados Unidos", diz a polícia.

Segundo a polícia, os valores das vendas foram convertidos em dinheiro em espécie e ingressaram no patrimônio pessoal do ex-presidente, sem utilização do sistema bancário formal, "com o objetivo de ocultar a origem, localização e propriedade dos valores".

Declarado inelegível pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) até 2030 por ataques e mentiras sobre o sistema eleitoral, o ex-presidente já havia sido indiciado em março pela PF em outro inquérito, envolvendo a falsificação de certificados de vacinas contra a Covid-19.

Além do caso da venda das joias e da carteira de vacinação, Bolsonaro é alvo de outras linhas de investigações, que apuram os crimes de tentativa de golpe de Estado e de abolição violenta do Estado democrático de Direito, incluindo os ataques de 8 de janeiro de 2023.

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