Quase três meses depois do início do fechamento de escolas por causa do coronavírus, o Ministério da Educação (MEC) não realizou ações específicas para ajudar as redes a garantir o aprendizado no período.
Ao mesmo tempo, o foco do ministro Abraham Weintraub (Educação) passa longe da educação. Nesta semana, por exemplo, o governo tenta evitar depoimento de Weintraub após ataques ao Supremo Tribunal Federal (STF), quando o ministro defendeu cadeia para "esses vagabundos".
O Supremo ainda tem inquérito aberto para analisar suposto crime de racismo em comentário sobre a China, relacionando o país asiático à propagação da Covid-19.
Enquanto isso, redes públicas têm buscado medidas para ofertar ensino a distância - por internet, TV ou mesmo com materiais impressos enviados para os alunos. Há ainda o desafio de se distribuir alimentação escolar para os estudantes mais pobres.
Cálculo do Consed - órgão que representa secretários estaduais de Educação dos estados - estima um custo acumulado até agora de R$ 1,9 bilhão com medidas durante a pandemia. Entram na conta recursos digitais para aulas online, formação de professores para ensino remoto e alimentação.
As ações das redes são feitas sem participação efetiva do MEC na educação básica. Essa etapa havia sido classificada como prioritária para o governo Jair Bolsonaro (sem partido). O MEC, no entanto, abriu mão do papel de articulação ativa com os entes federativos.
A pasta não tem estudos sobre os impactos da pandemia na educação, não oferece ferramentas que possam assegurar a continuidade das aulas nem tem diálogo considerado satisfatório com gestores.
A reportagem questionou o MEC sobre ações da pasta para apoiar as redes, estudos sobre impactos na aprendizagem e balanço do acompanhamento das ações das redes.
O ministério não respondeu. A pasta argumentou que mantém diálogo com as redes e ressaltou a criação do Comitê Operativo de Emergência (COE), que reúne secretarias e universidades.
Weintraub não participa do órgão, que não tem poder deliberativo. O COE se reúne uma vez por semana - os encontros foram reduzidos, já que antes aconteciam duas vezes por semana.
As poucas ações do MEC de apoio às escolas e redes são de continuidade do que já estava previsto. A pasta as anuncia como novidades, no entanto.
A transferência de recursos do Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) foi mantida, mas com nova finalidade. O dinheiro é voltado para apoio pedagógico. No entanto, Weintraub divulga que os repasses são, agora, para a compra de materiais de higiene, como álcool em gel.
O MEC também manteve as transferências de recursos federais para merenda escolar - mas há problemas na iniciativa. Além de o dinheiro cobrir apenas uma pequena parte do gasto das redes, as regras do MEC para seu uso deixaram o dinheiro parado em ao menos dez estados, como a Folha de S.Paulo mostrou no fim de abril.
Consta da divulgação do MEC a oferta de cursos remotos de formação de professores, a exemplo dos de alfabetização, que são medidas também desconectadas da emergência atual.
Segundo especialistas e dirigentes, o MEC poderia, entre outros pontos, oferecer plataformas de ensino remoto e negociar pacotes de dados com operadoras de internet.
"Nada foi feito", disse Priscila Cruz, presidente do Movimento Todos pela Educação. "A atuação dele [Weintraub] foi justamente na contramão, foi de lavar as mãos", disse Cruz. Nem o diálogo com as redes foi estabelecido.
"O principal, que seria a mãe de todas as ações, é justamente criar um ambiente interinstitucional para acordos e articulações necessárias para uma coordenação da política nacional", afirmou Cruz.
Secretário de Educação de Sergipe, Josué Modesto afirma que existe uma "não relação" das secretarias com o ministério. "Com o MEC, poderíamos ganhar escala em várias ações, como a negociação com operadoras e com relação às atividades educacionais suplementares", afirmou.
Além dos gastos em curso, o Consed já calcula que as redes terão, como reflexo da frustração de arrecadação, uma redução de R$ 20 bilhões do dinheiro recebido via Fundeb (principal mecanismo de financiamento da educação básica). "Como existe uma demanda óbvia e urgente na área da saúde, tememos que não sobre recursos para a educação", diz Modesto.
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